Por
Adherbal de Arecippo[i]
Dr. Adherbal de Arecippo |
Assistimos, naquela época, a prática
do “entrudo”, como habitualmente denominavam as pessoas de modesta educação,
sem o entusiasmo e alegria que, naturalmente, acontece nos dias de hoje. Pelas
12 horas de domingo e terça-feira o “aviso” percorria a cidade debaixo de um
sol causticante. Não havia música e ninguém cantava. O ritmo, para estimular o
“passo”, muito diferente do de hoje, era causado por um bombo e dois tambores.
Todos mascarados e muitos vestindo saias.
Pela manhã, na hora do banho, alguns rapazes eram jogados na água, completamente vestidos, e outros se divertiam jogando farinha do “reino’ no rosto e cabeça de quem passava pela Avenida Bráulio Cavalcante. As mocinhas e os rapazes mais jovens tinham prazer de atirar “cabacinhas” nos amigos. As cabacinhas tinham a forma de uma bola, feita de cera e, dentro, um líquido misturado com alguns pingos de perfume. No decorrer do dia, começando cedo, até pelas 3 horas da tarde, surgiam grupos de “figura séria”. Eram constituídos de moças com o rosto e pescoço envolvidos em fronhas, que andavam pelas ruas pelas ruas principais da cidade, sem pronunciarem uma só palavra e, ao mesmo tempo, irreconhecíveis.
Pela manhã, na hora do banho, alguns rapazes eram jogados na água, completamente vestidos, e outros se divertiam jogando farinha do “reino’ no rosto e cabeça de quem passava pela Avenida Bráulio Cavalcante. As mocinhas e os rapazes mais jovens tinham prazer de atirar “cabacinhas” nos amigos. As cabacinhas tinham a forma de uma bola, feita de cera e, dentro, um líquido misturado com alguns pingos de perfume. No decorrer do dia, começando cedo, até pelas 3 horas da tarde, surgiam grupos de “figura séria”. Eram constituídos de moças com o rosto e pescoço envolvidos em fronhas, que andavam pelas ruas pelas ruas principais da cidade, sem pronunciarem uma só palavra e, ao mesmo tempo, irreconhecíveis.
O uso da fantasia, quase não havia.
Minha mãe, porém, vestia-me de “palhaço”, em cores verticais, verde e amarela,
e eu saia a passear, de tarde, em companhia de um soldado, que meu saudoso pai[ii] “requisitava” para essa
missão, dada a sua qualidade de Juiz de Direito da Comarca. Já adolescente, a
fantasia era outra: aproveitava os fraques que papai deixava de usar,
vestindo-os debaixo de um calor abrasador.
Apesar da pouca vibração, e meio
social melhor, embora em caráter muito restrito, divertia-se graças ao grande
entusiasmo e iniciativa do saudoso Manoelzinho Pereira[iii], uma das figuras mais
simpáticas da sociedade pão-de-açucarense. Pouco interessado pela política
partidária, preferia a política da alegria, criando grupos carnavalescos
inteligentes, que percorriam as casas de família de mais representação social.
Também cooperava o inteligente poeta Soares Pinto (Zuza)[iv], muito entusiasta por um
Reisado, em época imprópria, no qual ele figurava como o “mateu”, a pilheriar
com um, a gracejar com outro.
Já nos meus últimos anos de
permanência naquela comuna sanfranciscana, os blocos percorriam a cidade
conduzidos por uma esplêndida orquestra, tirada da banda de música “União de
Perseverança”, sob a direção do musicista professor Manoel Victorino Filho[v], a quem chamavam “Nousinho
do Guarda”, por ser filho de um guarda de linha dos telégrafos. Nousinho tinha
como excelentes ajudantes os seus manos José de Castro Barbosa[vi] e meu companheiro de
infância Américo[vii].
Nessa época, começavam a chegar as
lança-perfumes, numa remessa nas quais o líquido cheirava somente a alho. Com
as lanças e a orquestra do Nousinho, o ambiente social começou a modificar-se.
Depois, naturalmente, tudo mudou,
tudo transformou-se para melhor. Hoje canta-se, dança-se e toma-se cerveja
gelada. Ouve-se pelo rádio as músicas do carnaval carioca e as marchas
movimentadas dos frevos pernambucanos.
E eu fico a observar, ao terminar
esta crônica, de quantos anos são passados. Que diferença dos tempos de agora
para aquela época que jamais voltará! Naquele tempo, “a escola me era risonha e
franca”. E hoje?
______________
Extraído
do Jornal de Alagoas, 12 de fevereiro de 1956. Pesquisa de David Bandeira, meu
prezado amigo, a quem agradeço.
[i] Nasceu em 15 de
abril de 1904, na cidade de São José da Laje. Chegou a Pão de Açúcar em 1910,
permanecendo até o ano de 1922, período em que seu pai, o íntegro Dr. Antonio
Arecippo de Barros Teixeira, pontificou, na qualidade de Juiz de Direito desta
Comarca. Fonte: Monografia de Pão de Açúcar, Aldemar de Mendonça.
[ii]
Dr. Antônio Arecippo de Barros Teixeira, Juiz de Direito da Comarca de Pão de
Açúcar. Nasceu em União dos Palmares
(AL) em 31.10.1868 e faleceu em Maceió (AL) em 01.12.1928. Fonte: Wilson Lucena.
[iii]
Manoel Francisco Pereira Filho. Nasceu em Pão de Açúcar no dia 13 de outubro de
1886 e lá faleceu a 29 de julho de 1935. Foi Prefeito de Pão de Açúcar de
07q01/1925 a 07q01/1926.
[iv]
José Soares Pinto Filho. Nasceu em Pão de Açúcar no dia 28 de abril de 1895.
Filho de José Soares Pinto e Isabel Soares Pinto. Faleceu em 30 de novembro de
1926.
[v]
Manoel Victorino Filho nasceu em Vila Nova (atual Neópolis), Estado de Sergipe.
Faleceu em Maceió, a 18 de abril de 1960.
[vi]
No dia 9 de outubro de 1901, nasceu
nesta cidade José de Castro Barbosa (Duda), tendo falecido no Rio de Janeiro,
em 1969. Foi músico extraordinário e como tal percorreu a Europa, regenciando
orquestras de navios transatlânticos. Formado em Direito, passou a exercer a
advocacia no Rio de Janeiro.
[vii] Américo de Castro Barbosa, nasceu
dia 3 de dezembro de 1903. Foi exímio violoncelista, tendo feito parte da
orquestra de Fon-Fon, excursionando para a Argentina em 1941 e para Montevidéu,
em 1953. Fez parte, também, da orquestra Carioca. Faleceu no Rio de Janeiro, no
ano de 1967.
Dr. Antônio Arecippo de Barros Teixeira, pai de Adherbal de Arecippo. Acervo de Wilson Lucena.
Manoel Francisco Pereira Filho, "Manoelzinho Pereira"
O poeta José Soares Pinto (Zuza)
Manoel Victorino Filho (Mestre Nousinho)
Orquestra do Mestre Nousinho em 15 de março de 1918 - Acervo Antônio Barbosa - "Tonho do Mestre"
Pão de Açúcar, na década de 1910.
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