PÁGINAS

sábado, 30 de julho de 2016

PAIXÃO FURIOSA

Hormino Lyra[i]

Fazenda de Lagoa das Pedras, Sul de Alagoas, Município de Pão de Açúcar.
Manoel Lisboa, seu proprietário, tinha confiança ilimitada no vaqueiro.
João Lino, homem de trinta e quatro anos de idade, em verdade, era tipo sério; não mentia, nem contra si. Ganhou a confiança do fazendeiro e resolvia qualquer negócio em sua ausência.
Não se casou. Havia muito, acompanhava os passos da filha unigênita de Lisboa, e tinha a cisma de se casar com ela. Conhecia os negócios da fazenda de gado, e melhor partido não encontraria a moça.
Rosa, que inveja causaria a todas as rosas dos jardins, muito jovem, muito linda, de singeleza impressionante, não era namoradeira. Sisuda, gênio reconcentrado, vivia sempre ao lado da boa mãe, sem ter preocupação ainda com o problema social do casamento. Achava-se muito criança para resolver tão complicado caso.
Do mesmo modo não pensava Lino, tanto que uma vez, quando teve oportunidade, lhe falou jeitosamente acerca de seus desejos.
Assustou-se a moça com a conversa do vaqueiro, e não lhe deu resposta. Nunca tinha idealizado o homem que a devia possuir, mas, com certeza, não era aquele.
Molestou-se Lino com a falta de consideração da moça. O pai o considerava tanto, porque não haveria ela de imitar o bom exemplo do velho?! Não se conformou, e insistiu muitas vezes, até que lhe disse Rosa seria melhor mudar ele de assunto, e procurar outra. Ela, com certeza, não tinha pensado em casamento; mas, ainda quando pensasse, não entraria o vaqueiro em suas cogitações. Não perdesse tempo, porquanto era inabalável a sua resolução.
Voltou Lino, pouco tempo depois, a revolver o passado e, agora, mais impetuoso, tinha também sua resolução inabalável: casar-se com Rosa ou morrer. Ela, porém, sucumbiria com o vaqueiro, consoante lhe declarou formalmente.
Sorriu a moça e deu de ombros.
Nem os próprios pais sabiam do que se passava entre João Lino e a filha deles.
Uma tarde, estava ela à beira do “açude grande”, perto de casa, na hora em que costumava o vaqueiro estar na roça. Grande foi seu espanto quando o viu a dois metros de distância. Quis correr, mas ele lhe tolheu os passos. A moça jogou-se n’água irrefletidamente, e nadou. O mesmo fez o apaixonado, e abraçou-a. Submergidos, rodaram no leito viscoso do açude; e, quando da vida se lembrou o vaqueiro, a morte estava mais perto!
... ... ...
Durante a noite, passaram pensamentos fantásticos no cérebro dos infelizes pais da vítima: quem sabe se alguma onça tivera apanhado Rosa; e Limo fora em seu socorro, e sucumbira também nas garras da fera...Quem sabe algum marruá...Quem sabe? — Imaginara a pobre mãe...
Que plano conceberia o maldito vaqueiro para lhe raptar a filha idolatrada, sem que ninguém o percebesse, nem até desconfiasse... — conjecturara o cérebro vulcânico de Manoel Lisboa, a estalar de dor.
E algumas vezes cavalgaria ele o fogoso alazão, e andara à toa; e, no meio da estrada, bradara: — “Rosa!”. E o eco respondera: — “Rosa!”. E mais uma vez ressoara: — “Rosa!”. E mais longe e mais fraco: — “Osa!”. E ainda mais longe e quase imperceptível: — “Osa!”.
Noite de verão, noite sem luar, céu sem nuvens, e as boas estrelas, no firmamento, como se fossem amigas de novidades, pareciam querer descobrir o que de estranho aconteceu naquele triste recanto torrão alagoano.
Noite de aflições: lágrimas, gemidos, suspiros cá, dentro do santo lar; orquestras infernais de batráquios, assobios agudos das serpentes, mugidos rechinantes das vacas, berros plangentes dos bezerros, lá fora; e a “rasga mortalha”, com seus piares sinistros, a voar, sempre a voar, de espaço a espaço, cruzando a cumeeira da casa, a modo gargalhava escandalosamente para aumentar a aflição dos aflitos!
No dia seguinte, tranquilos, boiavam dois cadáveres no “açude grande”. Mistério!
*** *** ***
Dizem que o “açude grande” ficou mal-assombrado.
Quando a gente passa perto, dele, ouve, às vezes, suspiros prolongados e gemidos lastimosos, gemidos de dor que comovem o cristão.
É a cauta serpente com aspecto sorridente, boca semiaberta, olhos pregados na rã inerme, inabalável no propósito de a comer, e botar de vez em vez a língua fora, como que prelibando delicioso manjar; enquanto esta, apavorada com a presença e aproximação daquela, a pular de um lado para outro, a gemer, a contorcer-se, ali permanece carecida de ação, sem ânimo para se livrar do perigo, até que por fim a cobra a devora, com serôdio deleitamento. Espetáculo assombroso e repugnante; mas alguns supersticiosos moradores daquelas redondezas pensam que ali anda coisa; a alma penada da pobre Rosa perseguida pelo mau espírito do rude vaqueiro ainda atormentado pela paixão furiosa.
______________
Transcrito do Jornal Pequeno, Recife, 30 de novembro de 1931.



[i]
Poeta, romancista e ensaísta, HORMINO ALVES LYRA nasceu em Pão de Açúcar, Alagoas, em 3 de agosto de 1877. Fez seus estudos secundários no Ginásio São João em Penedo, onde exerceu as funções de censor e lecionou com substituto de várias cadeiras.
Em princípio, pensou dedicar-se à vida eclesiástica. Entretanto, não obstante a sua crença religiosa, percebeu que não tinha vocação para o sacerdócio. Prestou, então, concurso para a Fazenda e para os Correios e Telégrafos. Aprovado em ambos, preferiu o segundo, sendo admitido como Telegrafista.
Escreveu para vários jornais e revista como O Malho e Revista da Semana.
Suas principais obras são: Dona Ede (romance), em 1913; O 14 (contos), também em 1913; O Barão do Triunfo, 1941, separada da Imprensa Nacional (memória); Crisol (poesia), 1960. Troveiro, 1960 (poesia).
Foi casado com Marieta de Mello Carvalho (filha do Coronel Augusto Álvaro de Carvalho e de D. Maria Luiza de Mello Carvalho), falecida em 5 de janeiro de 1961.
Hormino Lyra faleceu no rio de janeiro em 13 de setembro de 1970.

CENTENÁRIO DE MEU PAI

Por Etevaldo Amorim

Agnelo Tavares Amorim. Foto Ideal. Santos-SP
Nascido a 31 de julho de 1916, na Vila Limoeiro, município de Pão de Açúcar, filho de João Tavares Amorim e Izabel da Rocha Amorim.
Criou-se ali, na pequenina Vila localizada à margem esquerda do rio São Francisco. Desde cedo, ajudava seu pai no trato da lavoura, especialmente o arroz, nas terras de vazante, nas lagoas e nas ilhas, onde também situaram frutíferas, como mangueiras, goiabeiras e coqueiros.
No início da década de 1940, foi para São Paulo em busca de oportunidades, retornando quatro anos depois para, em 1947, casar-se com d. Cecília e, de novo, partir para o Sul.
Morou em Santos e em Campinas, trabalhando na agricultura e também na indústria. Finalmente, retornou a Limoeiro em 1964. Faleceu em Pão de Açúcar, onde residia, em 20 de julho de 2002.
Homem simples, de pouca cultura e recursos, mas honesto e trabalhador. Amigo sincero, bom esposo e bom pai.
Eu que tenho falado, neste Blog, de tantas personalidades, não poderia deixar de tratar deste homem, que deu tanto de si em meu benefício. Por isso deixo aqui registrada a minha saudade e o meu orgulho de ser seu filho.

quinta-feira, 14 de julho de 2016

EMBAIXADOR ARAÚJO JORGE



Por Etevaldo Amorim
Arthur G. de Araújo Jorge. Fon-Fon, 22/06/1912.
Membro de tradicional família alagoana, Arthur Guimarães de Araújo Jorge nasceu em Mata Grande (então chamada Paulo Afonso) a 9 de setembro de 1884 (relatório do M. Re. Exteriores diz ser 29/09/1884). Assim se deu porque seu pai, o Dr. Rodrigo Adolpho de Araújo Jorge, exercia, desde 15 de novembro de 1882, o cargo de Promotor de Justiça daquela Comarca. Laços com família matagrandense talvez tenha por conta da mãe, Emília Guimarães de Araújo Jorge. Foram seus avós paternos: o Desembargador Silvério Jorge (Silvério Fernandes de Araújo Jorge) e Maria Victória Nascimento Pontes.
Em que pese esse nascimento circunstancial, é legítimo que o coloquemos entre as muitas e destacadas personalidades dessa cidade alagoana, tais como Dom Antônio Brandão (o primeiro bispo de Alagoas) e Augusto Malta (o famoso fotógrafo que revelou as mais belas e históricas imagens da cidade do Rio de Janeiro), entre tantas outras das famílias Malta, Brandão, Vieira, Damasceno, Ribeiro, Mendonça, Alencar, Barbosa, Gaia, Vilar...
Em 1896, já com a família em Maceió, prestou Exames de Preparatórios, seguindo depois para o Recife, onde ingressou na Faculdade de Direito. Na capital pernambucana, revelando desde cedo seus dotes literários, passa a colaborar com a Revista Jurídica, do Centro Acadêmico Teixeira de Freitas, da Faculdade de Direito. Aos dezenove anos, e sendo já um dos redatores d’A Cultura Acadêmica, obteve desta a edição, entre 1904 e 1905, de uma coletânea destes primeiros ensaios, sob o título de Problemas de Filosofia Biológica, trabalho com quatro títulos: A Biologia e a Físico-química, A Hereditariedade de Influência, Ensaio sobre a Biogênese, e O Gênio[i].
Formou-se em 1904 pela Faculdade de Direito do Recife e já no ano seguinte vai para o Rio de Janeiro. Por influência do Senador Bernardo de Mendonça[ii], que o indicou ao seu amigo Barão do Rio Branco (José Maria da Silva Paranhos Junior), ingressou na carreira diplomática, a 21 de junho de 1905, inicialmente como Secretário Auxiliar do Tribunal Arbitral Brasileiro-Boliviano, cujo árbitro brasileiro era o Dr. Carlos Augusto de Carvalho. No ano seguinte, era nomeado auxiliar do árbitro brasileiro no Tribunal Arbitral Brasileiro-Peruano. Deixou ambas as funções em agosto de 1907 para se tornar Auxiliar de Gabinete do Barão do Rio Branco, de quem seria um dos mais próximos e eficientes colaboradores. Inicialmente como Amanuense[iii], tornou-se Diretor na Seção de Negócios Políticos e Diplomáticos da Europa e, depois, cargo equivalente na Seção da América.
De pé, da esquerda para a direita: Euclides da Cunha, Arthur G. de Araújo Jorge, Graça Aranha, Eduardo Lorena, César Vergueiro,, Pecegueiro do Amaral, Gaspar Líbero, Paulo Quartin e César Tapajós. Sentados: Afonso Arinos, Barão Homem de Mello, Barão do Rio Branco e Gastão da Cunha. Fonte: O Malho, 26 de outubro de 1907.
Na foto acima, por ocasião de uma visita do Barão do Rio Branco a São Paulo, e sendo recepcionado por um grupo de estudantes paulistas (Eduardo Lorena, César Vergueiro, Garpar Líbero, Paulo Quartin e César Tapajós), nota-se Araújo Jorge ao lado de Euclides da Cunha, autor da esplêndida obra Os Sertões. É que, Euclides fora auxiliar do Barão do Rio Branco entre 1906 a 1909, quando chefiou expedições do Ministério das Relações Exteriores em questões de demarcação de fronteiras, razão da sua presença na foto. Mas há um fato curioso. Como se sabe, o famoso escritor e engenheiro foi assassinado pelo amante de sua esposa (Dilermando Cândido de Assis), a 15 de agosto de 1909. Inocentado, sob o argumento de que agiu em legítima defesa, Dilermando casou-se com a viúva Ana Emília Solon Ribeiro, com quem teve alguns filhos. Alguns anos depois, separaram-se, vindo Dilermando a se casar com Maria Antonieta de Araújo Jorge (conhecida por Marieta), precisamente uma irmã do nosso Araújo Jorge.

Em 1909, "por sugestão e patrocínio do Barão do Rio Branco", funda a Revista Americana, concebida como uma publicação internacional voltada ao intercâmbio de ideias e à aproximação entre os países americanos. Era uma publicação quinzenal de ciência e de arte. Os redatores eram Araújo Jorge, Joaquim Viana e Delgado de Carvalho. A partir de 1916, passou a ser dirigida também por Silvio Romero Filho.


Araújo Jorge (de branco) ao lado do colega Muniz de
Aragão. Fonte: Revista Fon-Fon, 10 de dezembro de 1910.

Com a morte do Barão, em 10 de fevereiro de 1912, continuou no Ministério das Relações Exteriores, passando a servir sob o comando do Dr. Lauro Muller, primeiro como 2º Oficial e, a partir de 1914, como 1º Oficial.
Naquele mesmo ano, jornais cariocas noticiam seu noivado com a Srtª Devanaguy Lakmy Silva, filha do médico do Exército Cincinato Henriques da Silva e de Ethelvina Baptista da Silva, ocorrido no dia 6 de maio de 1912, na Rua General Severiano, 164, em Botafogo, Rio de Janeiro, residência dos pais da noiva[iv]. Não se nota, entretanto, registro do casamento com essa jovem que se tornaria bailarina na Escola de Bailados do Teatro Municipal.[v] Casa-se, efetivamente, com a Srtª Helena dos Santos Caneco, filha do construtor naval Vicente dos Santos Caneco e de D. Catharina Teixeira dos Santos Caneco. A cerimônia se deu a 27 de outubro de 1917, às 10:00 h, na matriz de São Francisco Xavier, no Engenho Venho, Rio de Janeiro.
Araújo Jorge (ao centro) com colegas da Seção de Negócios do Ministério do Exterior. 
Fonte:  Fon-Fon 1919.
Sua carreira segue promissora. Em 1918, passa para a Seção de Negócios Econômicos e Comerciais, como Diretor, exatamente no período que se seguiu à Primeira Grande Guerra. Em 1925, passa a dirigir a Seção dos Limites e Atos Internacionais. Nesse ano, é designado “enviado extraordinário e Ministro Plenipotenciário em Missão Especial” para representar o Brasil nos festejos do 1º Centenário da Independência da Bolívia, comemorada no dia 6 de agosto.[vi]
E em 1927, foi designado Enviado Extraordinário e Ministro Plenipotenciário para Cuba e América Central, servindo de 9 de junho até 3 de setembro daquele ano. Em 19 de março de 1929, foi removido para a Legação Brasileira em Assunção, Paraguai, servindo de 30 de junho de 1929 a 22 de novembro de 1930.
Enquanto era Ministro Plenipotenciário do Brasil em Montevidéu, assistiu à vitória da Seleção Brasileira de Futebol na Copa Rio Branco, no Estádio do Centenário, diante de 50 mil pessoas. Esse era um confronto entre o nosso selecionado e o time uruguaio, a exemplo do que ocorria com a Copa Rocca, entre o Brasil e a Argentina. O Brasil venceu por 2 x 1 com dois gols de Leônidas da Silva. Ao final do jogo, Araújo Jorge foi ao Hotel Flórida, onde os brasileiros estavam hospedados, para cumprimenta-los[vii]


O Ministro Araújo Jorge (assinalado com X) oferece almoço ao Selecionado Brasileiro de Futebol, que venceu o Uruguai na disputa da Coma Rio Branco (dois anos após a realização da 1ª Copa do Mundo). Vê-se à esquerda o jogador Leônidas da Silva. O terceiro à direita é Domingos da Guia. Revista da Semana: 31 de dezembro de 1932.
A partir de 1933 foi Ministro em Berlim, chegando a 7 de outubro daquele ano. Assim que chegou à Alemanha, já na era Hitler, mas anterior à Guerra, instalou a Legação Brasileira e a própria residência num mesmo prédio, na Tiergartenstrasse, nº 25, inaugurando-a a 7 de setembro de 1933, próxima do antigo endereço, no número 4.

Nesse curto período, e a julgar pelas informações e comentários constantes de Cartas ao Ministro das Relações Exteriores (vide Cadernos do CHDD - Centro de História e Documentação Diplomática), da Fundação Alexandre de Gusmão, Ano 11, Número 21, segundo semestre de 2012), nota-se uma certa simpatia do nosso Ministro pelas restrições impostas pelo Governo Alemão à presença e atuação dos povos de origem judia naquele país, especialmente no aspecto econômico. O Brasil, àquela época, praticava o que se convencionou chamar de “diplomacia pendular”, definindo-se finalmente pelo apoio aos países liderados pelos Estados Unidos.
Araújo Jorge no momento em que deixava o Palácio Presidencial em Berlim,

após apresentar credenciais ao Presidente Hindemburg, a 18 de outubro de 

1911, REVISTA DA SEMANA_25/11/1933.

Deixando Berlim, em agosto de 1935, foi para o Chile promovido a Embaixador. Naquele mesmo ano, foi transferido para Portugal, cuja atuação se constituiu o ápice da sua carreira.

Antes de ir para Portugal, por Decreto de 29 de abril de 1935, foi nomeado Secretário da Presidência da República na vaga deixada pelo Ministro Ronald de Carvalho, período em que acompanhou o presidente Getúlio Vargas em sua viagem aos países do Prata.[viii]


Em 7 de dezembro de 1937, com seu apoio, a Sala do Brasil na Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, foi reinaugurada, sendo esta uma das muitas ações de intercâmbio entre os dois países. Em 1941, recebeu, na Academia de Ciências de Lisboa, a Palma de Ouro de Primeira Classe. Em 1938, foi condecorado com a Grande Cruz da Ordem Militar de Cristo.

Muitos foram os Atos praticados pelo nosso embaixador no sentido da aproximação entre o Brasil e Portugal, entre eles, em Setembro de 1942, assinatura do Acordo Postal. A Revista A ORDEM, que tinha como Diretor Responsável Alceu Amoroso Lima (o Tristão de Ataíde), em artigo publicado em sua edição de junho de 1938, intitulado Um Embaixador do Brasil, assim se manifestou:


A uma sólida formação de inteligência aquele embaixador junta, como ninguém, o senso de oportunidades, o atrativo das maneiras, uma afabilidade sem artifícios que elimina as distâncias entre ele e os que buscam a sua convivência e acentua a graça e suaviza a malícia do seu caráter jovial.

Atuou como representante do Brasil em diversos Congressos Internacionais, tais como: 2º Congresso Científico Panamericano, realizado em Washington em 1915, onde apresentou duas importantes monografias: História Diplomática do Brasil Francês e História Diplomática do Brasil Holandês.

Segundo o Embaixador Lafaiete de Carvalho e Silva, Araújo Jorge “aliava as qualidades do espírito às do profissional sério e metódico”.
Em 1935, quando chega a Santiago, um jornalista chileno, Abel Valdés, o descreve como "um homem jovem de palavra fácil, semblante um pouco moreno, que expressa suas opiniões e pensamentos com a máxima claridade e com uma franqueza considerada, até agora, como pouco diplomática".

Profundamente interessado em nossa história diplomática, publicou numerosos trabalhos, notadamente os Ensaios de História Diplomática do Brasil no Regimen Republicano, concluídos em 1908 e editados em 1912, Ensaios de História e Crítica (1916), que englobam estudos sobre a História diplomática do Brasil francês no século XVI, a História diplomática do Brasil holandês (1640-1661), ou ainda sobre temas tão variados como Alexandre de Gusmão, as ilhas Malvinas e o direito da Argentina, Euclides da Cunha ou Guglielmo Ferrero. Quando o Itamarati decide publicar, na década de 1940, a íntegra da obra do barão, o nome de Araújo Jorge pareceu a escolha natural para preparar a Introdução, que o Senado Federal ora reedita, tornando acessível aos estudiosos de nossa história uma das melhores sínteses sobre a atividade diplomática de Rio Branco.[ix]


Em 20 de abril de 1963, no Itamarati, em solenidade presidida Presidente João Goulart, Grão Mestre da Ordem, ocorreu a cerimônia de entrega das primeiras condecorações da Ordem de Rio Branco, entre elas o Embaixador Arthur G. de Araújo Jorge, junto aos que serviram na Gestão do Barão do Rio Branco. (Diário Carioca, 14 de abril de 1963.)


O Diplomata Arthur Guimarães Araújo Jorge faleceu a 27 de fevereiro de 1977, com 92 anos, deixando a viúva, Embaixatriz Helena Caneco de Araújo Jorge, que faleceu no rio de janeiro a 21 de dezembro de 1982 aos 85 anos, e o único filho Raul Caneco de Araújo Jorge, Promotor Público atuante no Rio de Janeiro.



Cerimônia de Troca de Ratificações do Tratado de Condomínio da Lagoa Mirim e do Rio Jaguarão, no Ministério das Relações Exteriores, vendo-se sentados, a partir da direita: O Barão do Rio Branco; Gal. Rufino Domingues, Ministro do Uruguai e Frederico de Carvalho, diretor-geral da Secretaria do Exterior.  De pé, a partir da esquerda: Muniz de Aragão, Elmano Vieira, Amaral França, Cruz Gomes, Nin Frias e Araújo Jorge. Fon-Fon, 14/05/1910.


Dr. Araújo Jorge e Devanaguy Lakmy Silva. Fon-Fon, 22 de junho de 1012.

Devanaguy, bailarina do Municipal. Foto: Diário Carioca, 25 de outubro de 1933.

Casamento de Arthur Guimarães de Araújo Jorge e Helena dos Santos Caneco. O casal ao centro, tendo a sua esquerda (direita de quem olha): D. Emília Guimarães Araújo Jorge e o Dr. Rodrigo Adolpho de Araújo Jorge; e, à direita os pais da noiva: D. Catharina Teixeira dos Santos Caneco e Vicente dos Santos Caneco. Fonte: Revista Careta, 3 de novembro de 1917.

Lauro Muller Filho, Araújo Jorge, 1º Tenente Gensérico de Valconcellos,
Antônio de S. Clemente em viagem aos países do Prata com o Ministro Lauro
Miller. O Pirralho_01.05.1915









[i] Jornal do Recife, 16 de outubro de 1904, p. 2
[ii] Gutenberg, 29 de junho de 1905, p. 2.
[iii] Almanak Larmmert, 1927.
[iv] O Puritano, RJ, 20 de junho de 1912, p. 7
[v] Dário Carioca, 25 de outubro de 1933.
[vi] Diário de Pernambuco, 6 de agosto de 1925.
[vii] Brasil venceu o Uruguai por 2 x 1 na Copa Rio Branco de 1932, no Estádio do Centenário diante de 50 mil pessoas. A Seleção Brasileira jogou com: Victor, Domingos da Guia, Itália (cujo nome verdadeiro era Luis Gervazoni), Agrícola (Canalli), Martim Silveira e Ivan Mariz; Walter, Paulinho, Gradim, Leônidas da Silva (Benedito) e Jarbas.
[viii] Correio de São Paulo, 23 de abril de 1935.
[ix] Rio Branco e as Fronteiras do Brasil, A. G. de Araújo Jorge.

sábado, 9 de julho de 2016

TORVELINHO

Élio Lemos França. (Revista Mocidade)

Élio Lemos França[i]

Águas caindo precipitadamente. É bonito ver como as coisas do mundo caem precipitadamente. E os homens gostam de ver o despencar das coisas.
É um cair estourado, o das águas, cachoeira abaixo. E, lá nas pedras, o despedaçar-se de cada gota em mil partículas. O vento passando molhado pelo rosto da gente.
Minutos bem compridos, enchendo-me o olhar de água, de pedras, de espumas inquietas que giram endoidecidas. Parece-me que a Natureza está bêbada, ou louca. Ou, então, epitética, a esbater-se em espasmos de fúria, ou de dor.
Distante, o Sol, agora quase frio, parece uma pincelada de sangue, que algum louco homicida deu no azul do céu. E o horizonte faz lembrar certas pessoas simbiose da placidez do azul e da púrpura violeta de um Sol despeitado com o cair da noite.
Minutos bem compridos, que passam por meus olhos misturados ao rumor e ao torvelinho das águas, por entre cores que lutam e se confundem, enroscados em pensamentos há muito lembrados, envelhecidos e gastos em suas idas e vindas, de ontem e hoje, de hoje e ontem...
Antítese e silogismo mal traçados, quase sofismas. Crenças insustentáveis.
Ora, como se crê que possa a Vida voltar os próprios passos?! — Tolices.
Mas estes pensamentos são assim meio loucos. Cheios de confusão. Parece que eles também giram, endoidecidos, dentro da espuma nervosa da cachoeira. Insensatos!
E os minutos a enroscar-se em pensamento, querendo enroscar-me em minha alma. Em meu corpo, também. Entorpecendo minhas pernas. Matando o brilho dos meus olhos. Molhando-os.
Anoitece. Quase preciso de sair. A Vida me espera, lá fora, longe destas águas que caem e deste rumor alucinante de gritos estrondosos — não sei se das águas que se desmoronam, se das pedras que elas açoitam em seu cair ininterrupto. Anoitece, quase, e eu não posso ir.
Noites felizes, que não voltam... Dias felizes, que não voltam... Horas felizes, que não voltam...
E quem disse que podem voltar os momentos felizes? Eles passaram. Será egoísmo querer a Felicidade por muito tempo; é ela uma só para todas as pessoas. Uma pessoa de cada vez, como nas filas das bilheterias. Uma de cada vez e por um só minuto. As que vêm atrás também têm direito a Ela. Também pagaram o tributo de nascer.
Em compensação, há as lembranças. E as utopias, não são tantas? Por que não viver delas? Somente por serem fugidias? —A Vida também o é.
A noite quase que caiu inteiramente e uma estrela abriu o olho azul para o lado de cá. Está tão sozinha e brilha com tanto interesse! Deve estar, como eu, olhando o despencar das coisas... Deve estar sonhando com noites já vividas, de um tempo em que ela não tinha de ficar sozinha no meio do céu.
Anoitece. Surgem outras estrelas e a estrela bonita já não está sozinha. Não posso continuar aqui. Faz frio até.
Mesmo, a vida me espera lá fora, longe deste rugir alucinante da Natureza endoidecida.

Cachoeira de Paulo Afonso. Fonte: site Lugares Fantásticos.







[i] Extraído da revista Mocidade, Ano X, Fevereiro e Março de 1956, número 29 e 30. Cedido pelo amigo Álvaro Antônio Melo Machado que, rebuscando o baú do seu avô, o Prof. Antônio de Freitas Machado, encontrou esta prosa poética de Élio Lemos França, impressionante premonição de se trágico fim.