Por
Etevaldo Amorim
Capitão Agerson Dantas Foto: Diário da Manhã_18.10.1931 |
Uma
rua do centro de Maceió, que liga a Praça da Independência à Rua do Livramento,
transpondo a Rua Barão de Penedo, exibe um nome praticamente desconhecido da
maioria das pessoas que por ali passam. RUA AGERSON DANTAS. Quem seria essa
personalidade ilustre que mereceu denomina-la?
Sabe-se
que foi dado em sua homenagem, quando chegaram do poder os vitoriosos da
chamada “Revolução de 1930”[i]
AGERSON
DE CARVALHO DANTAS nasceu em 1897, filho do Cap. Agapito Dantas, um comerciante
estabelecido na Rua do Livramento, nº 38, no ramo de molhados; e de d. Maria
dos Anjos de Carvalho Gama. Seu avô paterno era Manoel Antunes Vieira Dantas,
falecido em 1924, aos 80 anos.[ii]
Por
volta de 1909, estudava no Lyceu Alagoano,[iii] e, em 1917, fez Exames
de Admissão ao Colégio Militar, no Rio de Janeiro.[iv]
Em
1921, concluiu o Curso de Farmácia na Faculdade da Bahia. Formado, volta para
Maceió e instala uma Drogaria, cujos negócios fluem satisfatoriamente. Por esse
tempo, chegou até a vislumbrar um emprego público, quando, em 1923, foi
classificado em 7º lugar no Concurso para Fiscal de Consumo em Alagoas.
As
circunstâncias políticas locais não eram, por certo, do seu agrado. Tanto que,
quando estoura o primeiro movimento contra o Governo Artur Barnardes, Agerson
vende o estabelecimento e entra para as hostes revolucionárias. Não tardou,
porém, que as consequências se fizessem sentir, especialmente sobre a família
de seu pai, provedor de numerosa prole[v]. O Governador Costa Rego,
sob o pretexto de que Agapito Dantas bancava o “Jogo do Bicho”, mandou
prendê-lo “numa cela do Batalhão
Policial, proibindo-lhe cigarros, fósforos, roupas para mudar, alimentos e, ao
menos por misericórdia, uma esteira de peri-peri, para ele não repousar; como
repousou sobre o cimento sujo e nauseabundo da prisão à chinesa. ”[vi] Depois desse episódio, a
família Dantas mudou-se para o Espírito Santo.
Em 5
de julho de 1924, estando a Coluna Prestes/Miguel Costa combatendo em Aimorés,
Minas Gerais, Agerson Dantas a ela se incorporou, sob o comando do Capitão Manoel
Henrique Vilá. Já o conhecendo de outras batalhas, o Capitão lhe ofereceu o
comando da tropa. Agerson, entretanto, recusou dizendo:
-
Quero somente uma coisa: ir para a primeira coluna fazer fogo.
Fracassado
o movimento de 1924, Agerson Dantas retorna ao Espírito Santo “com a mesma coragem do vencido destemido,
sobrepondo ao coração a esperança de um dia vir a ser vencedor”, diz o jornalista
capixaba Edwaldo Calmon, no jornal Diário da Manhã, edição 17 de outubro de
1931.
Depois
de algum tempo, deslocou-se para Minas Gerais, procurando meios de
sobrevivência. Voltando ao antigo ofício, estabeleceu-se com uma botica em
Naque, então pertencente ao município de Peçanha.
Em
fevereiro de 1926[vii],
foi ferido gravemente num braço, no combate de Umburanas, localidade perto de
Custódia, em Pernambuco, deixando-o defeituoso. Mesmo assim, com o braço na
tipoia, lutou bravamente por longo tempo.
General Miguel Costa_arquivo CPDOC_FGV. |
Esse
ferimento, que o debilitava fisicamente, ensejou uma recomendação do General
Miguel Costa, em carta datada de 12 de julho de 1927, escrita em Paso de los
Libres, Argentina. Aconselhava-o a ir ao Rio de Janeiro procurar meios de
tratar-se e o orientava a procurar o Dr. Luiz Amaral, de O Jornal, com quem
arranjaria os recursos para fazer a operação. Disse-lhe ainda que, caso o
jornalista pusesse dúvida sobre o que lhe falasse, mostrasse a carta, que ele
por certo reconheceria sua assinatura. Um trecho da carta diz:
“Diga-lhe que seu
braço nos deu 22 mil tiros, vários automóveis, fuzis, etc. e uma boa vitória,
derrotando a coluna do Coronel João Nunes, Comandante da Política de
Pernambuco, na terça-feira de carnaval, em 1926, no combate do Carneiro”.
Após
esse combate referido por Miguel Costa, Agerson Dantas foi promovido, por ato
de bravura, ao posto de Capitão, por ter sido o elemento definidor do triunfo
do mesmo.
Em
outra carta que, como a anterior, foi cedida ao autor dessas notas, o
farmacêutico Abílio Schwab[viii], pelo irmão de Agerson,
o dentista Afonso Gama, diz o General Miguel Costa:
“No último combate
de Bom Jardim, em Mato Grosso, vi o Capitão Agerson Dantas, empunhando com o
braço que lhe resta, o revolver fumegante, com que fazia retroceder o
adversário mercenário. A marca que você leva no corpo é a condecoração que a
Pátria conferiu ao filho leal e desinteressado, ao herói que semeou com o seu
sangue a árvore do fruto que será colhido amanhã: Liberdade”.
Enquanto
a maioria dos revoltosos foram para o exílio, o Capitão Agerson resolveu voltar
para o Brasil, sendo encarregado de trazer o Arquivo da Revolução, prova da
confiança que nele depositavam os líderes revolucionários. Estando já em
Corumbá, Mato Grosso, escreve ao General Miguel Costa, no dia 30 de abril de
1927: “Volto para casa com a consciência
serena, tranquilo e satisfeito por ter cumprido o meu dever”. O General
responde em 21 de maio: “Como é feliz o
homem que assim pode falar”.
Aliás,
nessas notas de Abílio Schwab, há uma revelação de que Agerson, em todas as
suas batalhas no vasto território brasileiro, sempre cuidou para que seu nome e
fotografia não fossem revelados. Isso, talvez, explique a escassez de relatos e
imagens a seu respeito.
Em
1928, prestou exames finais de Inglês e de História Universal no Ginásio do
Espírito Santo.[ix]
Mineiros na Revolução de 1930_Revista da Semana. |
Faleceu
a 7 de outubro de 1930, no combate de Aymorés, no Estado do Espírito Santo.
Sobre as circunstâncias que levaram à sua morte, o seu colega de profissão
Abílio Schwab reproduz a informação obtida junto ao Dr. Nestor Lobo Leal, médico
capixaba residente em Aimorés, que combateu com ele ali combateu:
“Quando explodiu o
movimento revolucionário, o Capitão Agerson Dantas residia no município de
Itanhomi, em Minas Gerais. Sabendo do movimento, partiu incontinenti para esta
cidade, aqui chegando no dia 6 de outubro, à noitinha. Durante todo o dia 7,
passou em revista de reconhecimento na fronteira de Minas com o Espírito Santo.
No dia 8, foi completar o reconhecimento para, no dia 9, estando senhor das
possibilidades do inimigo, entrar com facilidade à noite, em Baixo Guandu,
conforme sua declaração de revolucionário histórico. Ao partir pela manhã do
dia 8, avisou aos seus comandados que estivessem sempre alerta, principalmente
aos que guardavam a passagem que liga os dois Estados e que serve de leito à
estrada de ferro Vitória a Minas. Pediu mesmo aos seus camaradas que se alguém recalcitrasse
em entrar para o território de Minas, que fizessem foto por sua ordem. Nesse dia
completou o Cap. Dantas o serviço de reconhecimento e no seu regresso para
Aimorés, disse aos seus quatro companheiros que no dia seguinte iria com uns
500 homens ocupar a povoação de Baixo Guandu, no Norte do Espírito Santo. Já eram
quase 7 horas da noite quando o Capitão Dantas se aproximou de Aimorés. Ele vinha
a cavalo e por picada feita a seu mando. Por infelicidade, porém, veio entrar
na cidade pelo caminho que ele ordenara ninguém passar. Conversava alegremente
com os quatro companheiros, quando mal o seu cavalo marchava na estrada
proibida, sem que ele ouvisse o acostumado brado de “quem vem lá?”, uma
saraivada de balas dos próprios companheiros de ideal convergiram para o seu
lado. Os seus companheiros, rastejando-se no solo escalvado e seco, puderam
atingir a restinga e, chegando à margem do Rio Doce, rumaram para a cidade que estava
bem perto. O Capitão Dantas, ao ouvir a fuzilaria, deu de rédeas ao animal; mas
não houve tempo; o bravo revolucionário foi atingido em pleno tórax pelo projetil
de um mosquetão, que o atravessou da direita para a esquerda, rasgando-lhe os
pulmões e o coração. O seu enterro realizou-se no dia 9, com grande acompanhamento
de revolucionários e das principais famílias de Aimorés.
Morreu
assim o Capitão Agerson Dantas. Esse era seu destino, não obstante os conselhos
da sua zelosa mãe, que implorava para que não se envolvesse mais em revoluções.
Mas ele, embora compreendendo os cuidados da mãe aflita, respondia com energia
que revolução não se fazia com palavras. Era necessário sangue, e que ele tinha
assumido o compromisso de pagar o seu tributo até o fim, por mais doloroso que
fosse.
[i] DIÁRIO CARIOCA, RJ, 8 de outubro
de 1931.
[ii]
JORNAL DO RECIFE, 8 de janeiro de 1924.
[iii]
GUTENBERG, Maceió, 29 de outubro de 1909.
[iv] O IMPARCIAL, RJ, 22 de março de
1917.
[v] Dentre seus filhos, o dentista
Afonso Gama, que chegou a atender em Pão de Açúcar, pelos idos de 1910, e o
médico Carvalho Gama.
[vi]
Relato do jornalista Costa Bivar, Diretor do Correio da Tarde, de Maceió, para
Jornal do Recife, 14 de agosto de 1924.
[vii] Nesse ano,
ainda constava como sócio da Sociedade Bloco Alagoano, entidade instrutiva e
beneficente, fundada em 28 de abril de 1907, do qual seu próprio pai, o Cel.
Agapito Dantas, foi Presidente Efetivo e Tesoureiro.
[viii]
DIÁRIO DA MANHÃ, Vitória-ES, 24 de outubro de 1931.
[ix]
DIÁRIO DA MANHÃ, Vitória-ES, 23 de março de 1928.
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