sábado, 25 de setembro de 2021

HENRY FURNISS EM VIAGEM PELO BAIXO SÃO FRANCISCO

 

Por Etevaldo Amorim


De 1898 a 1905, o consulado dos Estados Unidos da América, em Salvador, teve à frente o Dr. Henry Furniss, extraordinária figura humana, por suas múltiplas competências e pelas diversas atividades pelas quais se interessava. Ele foi um diplomata, escritor e naturalista, com dedicação especial para a mineralogia.

Henry W. Furniss

Nasceu no Brooklyn, Nova York, em 14 de fevereiro de 1868. Seus pais eram negros livres, criados e educados no Norte. Seu pai, William H. Furniss, fazia o curso superior em New Hampshire, antes de partir para a guerra. De volta a Nova York, casou-se com a professora Mary Elizabeth Williams, em 1867.[i] A família mudou-se para Indianápolis, onde Hemry foi educado em escolas da cidade.

Ele foi o primeiro afro-americano a receber um diploma de mestrado da Harvard Medical School e, segundo consta, foi o primeiro afro-americano a receber um MD e um PhD.

Era cirurgião praticante no Freedman’s Hospital, Washington D.C, com diploma médico e de farmacêutico obtido na Howard University em 1895, quando foi recomendado para o serviço estrangeiro por um grupo de congressistas republicanos de Indiana.

H. Furniss, sentado à direita, com colegas médicos, no Freedman’s Hospital, 1895 ou 1896


Nomeado para o consulado na Bahia em janeiro de 1898, assumiu a 7 de março daquele ano, no qual permaneceu por sete anos, quando foi designado para a Embaixada no Haiti, a 23 novembro 1905,[ii] onde serviu como Enviado Extraordinário e Ministro Plenipotenciário até 1913.

O consulado era situado, inicialmente, na Rua das Princesas, passando depois para a Praça de Palácio (Praça da Constituição). O cônsul morava na Rua da Vitória, nº 21, na pensão das irmãs Kloppenburg. Ali conheceu Anna, sobrinha das proprietárias. Ela viera da Alemanha para ajudar as tias, em 1897.

Numa época em que casamento entre brancos e negros ainda era ilegal em Indiana e em muitos outros Estados americanos, e mesmo no Brasil não era bem visto, fizeram com que o casamento fosse, o quanto possível, ocultado.

Assim, em 1903, na volta ao Brasil, depois da sua visita aos Estados Unidos[iii], fez uma escala de algumas semanas em Londres. Nesta cidade, no dia 19 de outubro, casou-se com a alemã Anna Lüthge Wichmann, ele com 35 anos e ela com 34. O jornal Correio do Brasil, Bahia, de 23 de novembro de 1903, noticia a chegada o cônsul. Nada fala, porém, de sua esposa.

Anna e Henry em 1922.


Furniss participou de expedições junto com técnicos brasileiros. Em 4 de abril de 1905, por exemplo, partiu de Salvador para a Serra da Diamantina juntamente com o Professor Alpheu Diniz e o Engenheiro Joaquim Bahiana.[iv] Em dezembro do mesmo ano, ele e o Dr. Miguel Calmon du Pin e Almeida acompanharam o novo governador, José Marcelino de Souza, numa excursão oficial de um mês pelo Vale do Rio São Francisco. Ocasião em que plantaram juntos uma variedade de uva norte-americana no vinhedo modelo de Juazeiro. Talvez tenha sido nessa mesma vigem, em dezembro de 1904 ou, no mais tardar, início de 1905, Furniss empreendeu viagem à Cachoeira de Paulo Afonso.

Cinco anos depois, em janeiro de 1910, fez publicar no BOLETIM DO BUREAU INTERNACIONAL DA REPÚBLICA AMERICANA[v], um artigo intitulado “A Trip to Paulo Affonso Falls”, em que descreve a Região do Baixo São Francisco, desde Penedo até as cachoeiras, fazendo importantes registros geográficos e sociológicos.

O mesmo artigo foi também publicado no The Elbert County Tribune, em agosto do mesmo ano,[vi] na revista LEITURA PARA TODOS, Rio de Janeiro, Ano VII – nº 76 – Junho de 1912.

Nessa publicação, encontramos ainda belas fotografias de diversas localidades, como Penedo, São Brás, Traipu, Pão de Açúcar e Piranhas, Estado de Alagoas; e Propriá, em Sergipe. As imagens também mostram aspectos da flora, da fauna e das cachoeiras, que comprovam a fidelidade da descrição apresentada.

Passemos, então, a conhecer esse importante legado desse notável diplomata americano:

 

VIAGEM À CACHOEIRA DE PAULO AFONSO

 “A maioria dos touristes que vão ao Brasil não só veem uma pequena parte do país, porque viajam em vapores que somente tocam nos portos mais importantes, como também aceitam, com muita facilidade, os conselhos gratuitos dos seus compatriotas, que nunca se perderam pelo interior da grande República. Eles falam, como se o fizessem com conhecimento de causa, sobre os perigos e dificuldades de uma jornada ao interior.

Por mais que todas as cidades tenham seus característicos próprios, mais notadamente em umas que em outras, sempre há uma qualquer semelhança entre todas que, em geral, uma pessoa se cansa depressa de quase todas as cidades estrangeiras. Esta monotonia, porém, não se sente no interior de um país como o Brasil, que abunda em paisagens encantadoras, plantas, animais, e, sobretudo, esplêndidas maravilhas naturais, que dão ao viajante uma nova sensação a cada passo. Tal é o efeito que produz uma excursão à majestosa Cachoeira de Paulo Afonso.

Para chegar a essa estupenda queda d’água, é necessário tomar em Pernambuco ou Bahia um vapor costeiro dos que se destinam a Penedo, cidade situada a 30 milhas dentro do pitoresco Rio São Francisco, que é navegável em uma extensão de mais de mil milhas, com exceção de uma pequena distância entre ambos os lados da grande cachoeira.

Penedo é a segunda cidade do Estado de Alagoas, muito pitoresca, e é um centro comercial de grande importância. Quase fronteira a Penedo, está situada a antiga cidade de Vila Nova, no Estado de Sergipe, a qual agora só é representada por umas quantas casas.

De Penedo a Piranhas pode-se fazer a viagem em vapor ou em canoa. Difícil é aconselhar qual dos dois meios é o melhor. Isto é uma coisa que depende do caráter do viajante, de seus companheiros e das circunstâncias de momento.

O autor do artigo de que nos servimos fez uso do vapor e da canoa, segundo as necessidades e o humor em que se encontrava nas diferentes ocasiões em que fez a excursão. Pelo que diz respeito ao tempo, um método é tão rápido quanto o outro, pois em ambos se gastam dois dias para o percurso das 150 milhas e outras tantas para a volta.

O vapor permanece em Piranhas um dia somente, de modo que, a menos que se deseje passar uma semana nas cercanias da cachoeira, a canoa é o único meio de regressar a Penedo, prontamente. No vapor há a facilidade de alimentação, etc..., ao passo que na canoa o viajante é forçado a levar suas provisões.

A jornada em canoa é emocionante e sumamente pitoresca. Para a ida é utilizada a brisa durante o dia, e com as velas enfunadas a canoa marcha com relativa velocidade. Pela noite, atraca-se em qualquer ponto da margem, a fim de aguardar o romper do dia imediato. De volta, deixa-se que a poderosa correnteza do rio leve a canoa a seu destino, operação essa que é feita depois do pôr do sol. Assim, pois, ao contrário da ida, a viagem de volta efetua-se à noite.

Entre Penedo e Piranhas há vários povoados de importância, sendo os principais Propriá e Gararu, no Estado de Sergipe, e São Brás, Traipu e Pão de Açúcar, no Estado de Alagoas. Esses pontos todos são tão interessantes que vale à pena visita-los.

O cais do Penedo. Foto H. W. Furniss,1904/1905

                              

São Brás, AL. Foto H. W. Furniss, 1904/1905.




Propriá, SE. Foto H. W. Furniss, 1904/1905.





Traipu, AL. Foto H. W. Furniss, 1904/1905.



Pão de Açúcar, AL. Foto H. W. Furniss, 1904/1905.






No Monumento a D. Pedro II

O rio São Francisco abaixo das quedas. Foto H. W. Furniss, 1904/1905.

Depois de deixar o turbulento redemoinho inferior, o rio corre rapidamente por alguns quilômetros através de um desfiladeiro profundo e estreito.

Monumento comemorativo da visita de D. Pedro II às cachoeiras de Paulo Afonso-foto H. W. Furniss, 1904/1905.

Piranhas-AL. Foto H. W. Furniss, 1904/1905.

“Esta pitoresca cidade está situada até o qual chegam os vapores na parte baixa do Rio São Francisco. Uma estrada de ferro a põe em comunicação com Jatobá, um pouco acima das quedas, a uma distância de 71 milhas, onde se recomeça a navegação fluvial. ”

As corredeiras inspiradoras da alma. Foto H. W. Furniss, 1904/1905.

Antes de chegar às quedas principais, quatro braços do rio descem em uma série de cascatas, a água batendo nas pedras como se apressasse para dar o salto final na “Mãe das Cachoeiras”.

O início das corredeiras, acima das quedas principais-foto H. W. Furniss. 1904/1905.

"Um pouco distante acima, onde o rio unido faz seu último grande mergulho, ele se divide em cinco braços, quatro dos quais avançam por trenós rochosos e descem com um rugido poderoso que pode ser ouvido por muitos quilômetros.

                                          O morcego vampiro. Foto H. W Furniss, 1904/1905.

Um grande número desses animais ferozes habitam uma caverna na parte inferior do redemoinho das cataratas. Suas conhecidas propensões a sugar sangue os tornam um incômodo para os criadores de gado da vizinhança.


Canoas navegando a toda vela (pano de asa). Foto H. W. Furnis, 1904/1905

“Este barco indígena é muito usado para o transporte de passageiros, sendo o resto da embarcação destinado ao transporte da carga. Muitas vezes, para a viagem a Paulo Afonso, essas canoas andam mais depressa que os próprios vapores, devido ao vento que durante o dia só ajuda a sua carreira. De volta, a viagem é feita rio abaixo, de noite, com o auxílio extraordinário da corrente, que é sumamente rápida. ”


Caroá, uma planta de fibra valiosa do brasil-foto H. W. Furniss, 1904/1905.

“Esta planta é usada apenas pelos nativos para fazer uma espécie de cordão, mas sem dúvida terá importância comercial por causa de suas grandes qualidades de resistência à seca.”


Cactos e arbustos na Região de Paulo Afonso.
Foto H. W. Furniss, 1904/1905.

Cawboy do bairro Paulo Afonso-foto H. W. Furniss, 1904/1905

”Devido ao país nesta seção ser repleto de cactos e outras plantas cobertas de espinhos, esses criadores de gado usam trajes completos de couro, e até mesmo seus cavalos devem ser protegidos com couraças de couro, tornozeleiras e protetores faciais.”

O rio logo abaixo da última queda-foto H. W. Furniss

”Devido ao país nesta seção ser repleto de cactos e outras plantas cobertas de espinhos, esses criadores de gado usam trajes completos de couro, e até mesmo seus cavalos devem ser protegidos com couraças de couro, tornozeleiras e protetores faciais.”

Cachoeira do Angiquinho, formada por um dos braços preferidos do rio que se formam neste ponto. Foto H. Furniss.

“Cachoeira do Angiquinho, formada por um dos braços preferidos do rio que se formam neste ponto. Da pequena ilha do centro, a água dá um salto de 72 pés para se juntar ao corpo principal na "Mãe da Cachoeira", que então desce com um rugido poderoso a uma distância de 30 metros.”





Piranha ou "Peixe Tesoura". Foto H. W. Furniss, 1904/1905.

“Este peixe se encontra com muita abundância no Rio São Francisco. É carnívoro e com muita frequência ataca os animais que ao rio vão beber água. ”







Em Piranhas, toma-se a estrada de ferro para Jatobá, distante 17 milhas, e daí se recomeça a navegação no Alto Rio São Francisco.

Na metade do caminho está Pedra, onde se conseguem os guias, cavalos e provisões para o resto da excursão, que dura mais de três horas. Para evitar, porém, o intenso calor que faz durante o dia, é bom fazer este último trajeto pela madrugada. Depois de atravessar sendas bordadas de plantas e árvores de infinitas variedades e bosques e vegetação exuberantíssima, chega-se às cercanias da cascata, caracterizada pela completa nudez do terreno, em notável contraste com o que se acaba de vencer.


Como é natural, o aspecto da cachoeira de Paulo Afonso varia com as estações, isto é, de acordo com a quantidade de água que tenha o rio no momento. Quando o rio está na cheia, formam-se cataratas adicionais ao redor da cascata principal.

A melhor época para visitar o importante salto é quando o rio baixa o suficiente para que uma pessoa possa cruzar as inúmeras quebradas pelas quais a água se precipita na estação da cheia.

Em vista da Cachoeira de Paulo Afonso consistir de uma sucessão de fortes correntezas e saltos que terminam em uma grande cascata, a opinião acha-se dividida sobre qual o ponto que deve ser visitado primeiramente.

Para o autor do artigo em questão a parte mais formosa e imponente são os saltos. Ao contemplá-los, uma pessoa não pode deixar de reconhecer a verdade expressada no seguinte juízo de um estrangeiro: “Se o Niágara é a rainha das cataratas, Paulo Afonso é a dos saltos”.

O fato é que a Cachoeira de Paulo Afonso é a única no gênero, visto estar isenta das obras artificiais que tanto enfeitam o Niágara.

Perto da cascata moram alguns homens que conhecem o terreno palmo a palmo e que se prestam a guiar o touriste por uma módica compensação. O caminho que o guia toma conduz primeiro a várias quebradas e depois passa perto dos espumantes e impetuosos saltos pequenos que se vão precipitar a uns 100 pés mais adiante. Por último, chega-se à “Mãe das Cascatas”, roca assim denominada porque nela se reúnem as diferentes correntes dos rios para darem o grande salto final.

Desse ponto, o espetáculo que se contempla é verdadeiramente sublime. Em frente ao espectador fica a Cascata de Angiquinho, formada por um braço do rio principal. Desse mesmo ponto contempla-se uma imensidade de pequenos saltos admiráveis, mesmo tempo que se veem de uma altura de 72 pés as águas que se reúnem na “Mãe das Cascatas”, e mais abaixo o salto final de 190 pés, espetáculo esse sobremaneira imponente, que inspira mais espanto do que realmente prazer.

As cataratas têm, aproximadamente, a forma de uma meia-lua. O corpo da corrente precipita-se de uma vertente para a “Mãe das Cascatas”. A largura do rio nesse ponto é de uns 50 pés, e a profundidade da água na base das cascatas é calculada em 86 pés.

Depois de apreciado esse lugar, o guia conduz o viajante a uma parte do rio em que, rodeadas de bancos de roca negra, as águas descansam tranquilamente. Mais abaixo nota-se uma grande quantidade de ilhotas que brotam da superfície da água; é nesse ponto que a corrente volta a tomar a sua vertiginosa rapidez para, pouco mais adiante, precipitar-se com ensurdecedor estrondo. Pouco mais ou menos por essa parte está o sítio de onde o Sr. Dom Pedro II contemplou a cachoeira e no qual se encontra uma pedra comemorativa da visita imperial.

Dizem os guias que a excursão a Paulo Afonso não é completa sem uma visita à Cova dos Morcegos, para cuja chegada é necessário escalar penhascos e mais penhascos, perigosíssimos.

Salvador, Bahia, 1905. Coleção Derby.

Esse lugar, de resto, é uma caverna que não tem nada de interessante, além dos inúmeros vampiros que nela habitam”.

Salvador. Foto H. Furniss, 1904/1905

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Caro leitor,

 

Este Blog, que tem como tema “HISTÓRIA E LITERATURA”, contém postagens com informações históricas resultantes de pesquisas, em geral com farta documentação e dotadas da competente referência bibliográfica. Por esta razão, solicitamos que, caso algumas delas seja do seu interesse para utilização em qualquer trabalho, que faça uso tirando o maior proveito possível, mas fazendo também o necessário registro de autoria e a citação das referências. Isso é correto e justo.

 



[i] LOSCH, Paul S. HENRY W. FURNISS,CÔNSUL AFRO-NORTE-AMERICANO NA BAHIA,1898-1905.

[ii] Mozard LOMBARD (mars 2014). La signification des actions des missions diplomatiques américaines en Haïti à travers les discours de Kenneth H. MERTEN Mémoire pour l’obtention du grade de licencié en Communication Sociale, Faculté des sciences humaines, Université d’État d’Haïti.

 

[iii] O Cônsul já tinha feito uma viagem à sua Pátria, em 1903, segundo o jornal A Imprensa, do Rio de Janeiro. O Jornal, de Belém do Pará, registra a sua chegada à Capital paraense, em 27 de novembro de 1900, anotando que ele pretendia demorar-se alguns dias em casa do Sr. Luiz Soares, seguindo depois para Nova York.

[iv] GAZETA DE NOTÍCIAS, Bahia, 4 de abril de 1905.

[v] BULLETIN OF THE INTERNATIONAL BUREAU OF THE AMERICAN REPUBLICS, Vol. XXX, January – June, 1910. P. 66.

[vi] The Elbert County Tribune, Volume 26, Número 1, 5 de agosto de 1910, disponível em https://www.coloradohistoricnewspapers.org.

 



quarta-feira, 15 de setembro de 2021

THEODORO SAMPAIO NO BAIXO SÃO FRANCISCO

 

Por Etevaldo Amorim

Theodoro Sampaio

Dentre as várias expedições organizadas pelo Governo Imperial para analisar as possibilidades de melhoria na navegação no rio São Francisco, destaca-se a Comissão Hidráulica.[i] Constituída em 5 de janeiro de 1879, pelo Conselheiro Cansanção de Sinimbu[ii], à frente do 27º Gabinete Ministerial, e comandada pelo engenheiro americano William Milnor Roberts. Dela fazia parte o engenheiro Theodoro Sampaio.[iii]

Tinha, então, vinte e quatro anos, e há apenas dois se formara em Engenharia Civil pela Escola Politécnica do Rio de Janeiro, conhecida como “Escola Central”.

No dia 17 de agosto de 1879, por volta das seis horas da manhã, partia do Penedo, a bordo do vapor Sinimbu, com destino a Piranhas, último ponto do trecho navegável do Baixo São Francisco, “viagem que ordinariamente se faz em dois dias, pousando-se na cidade de Pão de Açúcar, que se alcança antes do pôr do sol.”

Naquele mesmo dia, Sampaio e os demais membros da comissão chegaram a Pão de Açúcar e logo saltaram para conhecer a cidade. Seu relato é breve, mas preciso:

“... atravessamos a pé o largo lençol d’areia que a precede e percorremos-lhe as ruas retilíneas, planas, marginadas de edificações humildes e sem elegância. Nenhum edifício notável se descobre, nem mesmo a igreja que, aliás, oferece melhor aspecto vista de longe.”

Pão de Açúcar-AL, vendo-se, à esquerda, o "largo lençol d'areia". Foto Marc Ferrez, 1875.


“Pão de Açúcar não oferece de notável senão a sua paisagem pitoresca, que a montanha cônica que lhe dá o nome aformoseia, e o perfil azulado da serra dos Meirus, duas léguas longe, torna quase encantador. ”

Retornando já tarde ao navio, neste pernoitaram para, no dia seguinte às 7 horas da manhã, “apesar da abundante chuva que caia”, continuar a viagem até chegar a Piranhas às 10 horas.

Três horas depois chegava a Piranhas, que então pertencia ao Município de Pão de Açúcar, sendo a Comissão recebida no porto pelos técnicos que iniciavam a construção da estrada de ferro, chefiados pelo engenheiro Reynaldo Kruger.[iv]

Encontraram ali uma população majoritariamente composta de mulheres e crianças, posto que os homens se achavam distribuídos ao longo da estrada que se construía. E assim se fazia a despeito das péssimas condições topográficas do lugar, deixadas de lago pela forte influência do Conselheiro Sinimbu, alagoano e Ministro do Império, que pleiteou a construção da estrada justamente para mitigar os danos causados pela seca de 1877, cujos efeitos se fazia mais sentir justamente naquele momento.

Estrada de Ferro Paulo Afonso_km 26, em construção. Foto Ignáco Mendo, 1880.


Esse fato não passou desapercebido a Theodoro Sampaio, que chegava “exatamente na ocasião em que se distribuíam os socorros pela população faminta no barracão próximo à estação da estrada de ferro. O aspecto dessa gente não negava os sofrimentos por que tinham passado. As mulheres e as crianças macilentas e com as roupas em farrapos, assentadas pelo chão, traiam um sofrimento que os primeiros socorros não lograram totalmente extinguir. ”

Theodoro Sampaio manuseando um teodolito.


Após a visita à Cachoeira de Paulo Afonso, Theodoro Sampaio publicou na revista ILUSTRAÇÃO DO BRASIL – Ano II – Nº 14 – 1880, um artigo intitulado:

A CACHOEIRA DE PAULO AFONSO – IMPRESSÕES DE VIAGEM

Não sei, meu amigo, como traduzir-lhe em nossa linguagem, tão pobre e mesquinha, as impressões variadíssimas, os sentimentos desencontrados, que experimentei em face desses abismos extraordinários onde se precipitam as águas volumosas do S. Francisco.

- A Cachoeira de Paulo Afonso! Quem, no Brasil, não a conhece, mas quão poucos a tem visitado!

É, pois, fácil de compreender com quanto afã, com quanto ardor seguíamos nós através daqueles tabuleiros estéreis, pedregosos, tostados pelo sol abrasador do estio em demanda da famosa catarata.

Esquecíamos tudo: a escassez d’água, a ruindade dos caminhos, a intensidade do calor, e mais que tudo, a “excelência” das cavalgaduras de nossa montada, as mais próprias para curar a monomanias de viagem.

Havíamos partido do porto de Piranhas, onde cessa completamente a navegação do Baixo São Francisco; ganhamos o planalto, e paralelamente a estrada de ferro, agora em construção, fomos pousar depois de dois dias de marcha na Estação da Pedra, quatro ou cinco léguas distante da cachoeira.

Como são tristes estas terras onde o céu não chove, e onde a vegetação, sem viço, jaz perdida e sem conforto!

Piranhas. Habitações precárias de retirantes e empregados na construção da Estrada de Ferro. Foto Ignácio Mendo, 1880.


Já lá vão três anos que a última gota de chuva se desprendeu das nuvens por sobre essas paragens, e até hoje o céu, conquanto nublado, coberto de cúmulos e nimbos prometedores, lá está ainda a negar uma gota de água, a essa terra sequiosa e infeliz. Só o cardo medra nestas paragens inóspitas, e, esguio, viçoso, espinhento e inalterável ergue os braços para um céu indiferente, desapiedado!

Diante de tanta aridez, o povo fugiu. Fugiu ou pereceu toda a criação dos campos, os pássaros, os próprios pássaros sumiram-se, desapareceram também; uma tristeza, uma monotonia esmagadora, imperam por toda parte.

Tal é o aspecto da região que atravessamos em caminho a Paulo Afonso.

Saímos da Pedra pela manhã, e só depois de quatro horas de péssimos caminhos, avistamos ao longe as planícies onde corre o S. Francisco, de que nos havíamos apartado desde Piranhas.

Que planícies niveladas, que tabuleiros extensos, onde a custo rompem a monotonia alguns serros azuis nos confins do horizonte, alguns outeiros isolados no imenso tapete verde-negro das “caatingas”! Depois o rio, como uma enorme fita prateada, retalhando o horizonte, em meio desaparecendo estão os sítios onde vai formar as cachoeiras. Estas distavam de nós uns três quilômetros apenas, devíamos já ouvir-lhe o bramido atroados das catadupas, e avistar também o nevoeiro denso que se lhe ergue dos abismos. Tudo isto se nos passou desapercebido, por um estado particular da atmosfera.

Estrada de Ferro Paulo Afonso_km 3,vendo-se Canindé Foto Ignáco Mendo, 1880.


Chegamos, enfim, apeamo-nos à porta de uma pobre cabana, em cujo alpendre devíamos pernoitar. O guia, morador deste lugar, havia partido horas antes, e só pela noite estaria de volta a seu posto. Resolvemos, pois, examinar os sítios com os nossos próprios recursos, aproveitando o resto da tarde.

As cachoeiras, que são muitas, traíam-se apenas por um rumor surdo. Marchamos contra este ruído, que nos parecia longínquo, paramos para ver o bronze comemorativo da viagem do Imperador, e seguimos além por entre pedras enegrecidas, blocos graníticos arredondados, polidos, reluzentes, ora pretos em seco; mas depois assoberbados pelas águas impetuosas do inverno.

Meia hora depois chegamos ao alto de uma penedia, verticalmente talhada, quase ao nível do tabuleiro. Dir-se-ia que a terra em suas primeiras épocas se retraiu convulsionada, deixando um sulco profundo e estreitíssimo, para onde se despenham as águas do rio.

Do alto desta medonha penedia, 500 metros adiante de nós, precipitava-se no abismo uma bela e volumosa coluna d’água, obliquamente iluminada pelos últimos raios de sol do ocaso.

Apesar das belezas do sítio, senti, entretanto, que se me arrefecia o entusiasmo. A cachoeira que eu havia imaginado, o meu ideal de Paulo Afonso estava muito além do que eu acabava de ver. Para meu consolo, porém, fui logo informado que a queda d’água que acabávamos de visitar era uma das menores, e das menos importantes. A maior, vê-la-íamos amanhã.

Cachoeira de Paulo Afonso_foto Ignácio Mendo, 1880.


Caia a noite quando voltamos à cabana. No dia seguinte, pela manhã, o guia rompia a marcha por entre as pedras e os precipícios do leito posto em seco. Uma hora depois galgávamos um rochedo, de cujo ápice se desfrutava toda a grande cachoeira. Vimos então, numa profunda depressão do granito, rolarem as águas em borbotões de espuma alvíssima, em esplêndido contraste com as lajes negras do fundo. Vimos desde o alto da penedia, onde o rio começa a despenhar-se, até a bacia interior onde refervem as águas em turbilhão, por toda a encosta, por todas as anfractuosidades do rochedo, de 250 palmos de alto, despenharem-se os novelos de espuma, quebrarem-se de encontro às portas de pedra, espadanarem pelas encostas e, rugindo, abismarem-se em vórtice imenso. Por sobre as fauces do abismo, o Ires desdobrava então o seu diadema múltiplo de cores cambiantes.

Quedamos silenciosos diante de tanta majestade! O guia, porém, ergueu a voz, e do peito largo saiu uma dessas interjeições prolongadas, sonoras, misto de admiração, de espanto e de alegria; mas que o bramir das águas sufocou em meio, tornando-a apenas perceptível.

 Alguns dos nossos companheiros eram norte-americanos; outros já haviam visitado a célebre cascata do Niágara, e concordaram todos que a Paulo Afonso, conquanto de tipo inteiramente diverso, é, entretanto, mais volumosa, mais cheia de variedades.

O capitão Burton[v] chama-a “O rei dos Rápidos” (the king of Rapids), apelidando a do Niágara “a rainha das cascatas” (the King of the Falls).

Cachoeira de Paulo Afonso. Foto Marc Ferrez, 1875.


Com efeito, lá, no Niágara, as águas se despenham verticalmente em imenso lençol; aqui, em Paulo Afonso, temos um plano fortemente inclinado por onde se precipitam as águas em gigantesco rápido. Lá, é mais alta a queda, mais pronunciada, mais elegante; aqui, já mais volume d’água, há mais asperezas, mais majestade, mais variedade de sítios.

Tirei o lápis, o meu álbum, companheiro inseparável de viagem, e fazia a largos traços um esboço desse esplêndido conjunto de águas e de penedias, quando senti que já havia ficado só naquele labirinto de pedras. Olhei em torno de mim, não vi viva alma; meus companheiros haviam descido o despenhadeiro, ganhavam a caverna numa das extremidades da cachoeira, percorriam-na em grande parte, e voltarem por sobre precipícios, ora faltando-lhe o equilíbrio, ora margeando nas pontas ásperas do rochedo, feridos os joelhos, o facto rodo e as mãos calejadas.

Voltei, pois, aos meus esboços, concluídos que foram, segui a esmo através daquelas asperezas, e fui deparar com o caminho do dia anterior, quando já assustado me considerava perdido.

Inundado de suor, sequioso porque inacessível era a água do rio nesses sítios, deixei-me cair fatigado sob a copa frondosa do angico, cuja sombra amiga contrastava imenso com a ardência do sol já em seu Zenith.

Duas horas depois prosseguimos em nossa jornada, levando a alma satisfeita e a memória enriquecida de um dos passos mais interessantes da nossa vida. Partimos para Jatobá, onde deviam começar os trabalhos do governo.

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Adaptado do livro Terra do Sol Espelho da Lua, AMORIM, Etevaldo Alves. Ecos Gráfica e Editora – Maceió – 2004.

A CACHOEIRA DE PAULO AFONSO – IMPRESSÕES DE VIAGEM, transcrito do

ILUSTRAÇÃO DO BRASIL – Ano II – Nº 14 – 1880. Disponível na Hemeroteca Digital Brasileira:  http://memoria.bn.br/DocReader/758124/819

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Caro leitor,

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[i] Comissão Hidráulica. Composta pelos engenheiros William Milnor Roberts, Antônio Plácido Peixoto do Amarante, Rodolf Wieser, Domingos Sérgio de Sabóia e Silva, Alfredo Lisboa, Miguel Antônio Lopes Pecegueiro, Tomás de Aquino e Castro, Orville Adelbert Derby e Theodoro Fernandes Sampaio.

 

[ii] João Lins Vieira Cansanção de Sinimbu (1810-1906). Foi o 22º Presidente da Bahia, de agosto de 1856 a maio de 1858. Foi Senador por Alagoas.

 

[iii] Theodoro Fernandes Sampaio nasceu no dia 7 de janeiro de 1855, na sacristia da capela do Engenho Canabrava, em Bom Jardim, município de Santo Amaro, Estado da Bahia. Sua mãe era Domingas da Paixão do Carmo, escrava do Visconde de Aramaré. Suspeita-se que seu pai seria o sacerdote da igrejinha da Casa Grande do Engenho. No seu registro de óbito consta como pai: Joaquim Fernandes Sampaio. Entretanto, na sua biografia no CPDOC/FGV, consta que é filho, não reconhecido, de Francisco Antônio da Costa Pinto.

Foi casado com Capitulina Maia Fernandes, com quem teve o filho Carlos Theodoro Sampaio e, em segundas núpcias, a 14 de agosto de 1935, com Amália Augusta Barreto, filha do Coronel João José Barreto e Adelaide Augusta Barreto. Participou ativamente do movimento abolicionista, tendo sido sócio-fundador da Sociedade Brasileira contra a Escravidão, entidade fundada por Joaquim Nabuco, em parceria com José do Patrocínio e André Rebouças. Foi Deputado Federal pela Bahia, tendo tomado posse em 02/05/1927. Faleceu no Rio de Janeiro em 15 de outubro de 1937, aos 82 anos de idade. Dá nome a dois municípios brasileiros: um no Estado da Bahia e outro no Estado de São Paulo.

 

[iv][iv] Reynaldo von Kruger. Engenheiro em Chefe da construção da Estrada de Ferro Paulo Afonso, designado em 1878. Faleceu em Uberaba-MG, aos 84 anos, no dia 25 de julho de 1919. Alemão naturalizado brasileiro, posto que aqui permaneceu por mais de 50 anos de sua vida. Casado com Maria Alves Montes, com quem teve cinco filhos, entre eles Fernando von Kruger.

[v] Richard Francis Burton KCMG FRGS (Torquay, 19 de março de 1821 — Trieste, 20 de outubro de 1890) foi um escritor, tradutor, linguista, geógrafo, poeta, antropólogo, orientalista, erudito, espadachim, explorador, agente secreto e diplomata britânico.

sábado, 11 de setembro de 2021

PEDRO DE ORLEANS E BRAGANÇA NA CACHOEIRA DE PAULO AFONSO

 

Por Etevaldo Amorim


É muito conhecida a viagem que o Imperador Dom Pedro II empreendeu às províncias do Norte, em 1859, particularmente pela sua visita à Cachoeira de Paulo Afonso. Na ocasião, acompanhado de numerosa comitiva, da qual faziam parte personagens destacados da história do Brasil, como Tamandaré e Barroso, o monarca registrou em seu diário as suas impressões sobre as localidades por que passou.

Pedro de Orleans e Bragança

Mas pouco se sabe acerca da visita de um outro Pedro à célebre cachoeira. Trata-se de Dom Pedro de Alcântara Orleans e Bragança, filho da Princesa Isabel e do Conde D’Eu e, portanto, seu neto.

No dia 15 de outubro de 1925, ele chegou ao Rio de Janeiro, a bordo do transatlântico Elbée, justo no dia em que completava 50 anos, para assistir às comemorações do centenário de nascimento do seu avô, o Imperador D. Pedro II.

Ao final do mês de abril de 1927, os jornais da Capital Federal já noticiam a viagem ao Norte do país.

Nos primeiros dias do mês de maio, desembarca em Maceió, acompanhado da esposa, Princesa Elizabeth, e de sua filha Isabel, de apenas 17 anos, sendo recebido pelo governador Costa Rego (24/06/1924-07/06/1928). Em companhia deste, visitaram o busto de D. Pedro II, na praça de mesmo nome; a Catedral, além de outros pontos importantes da cidade. O Governador o convidou a se demorar em Alagoas. Combinaram que, no retorno da viagem aos Estados do Norte, iriam juntos até à Cachoeira de Paulo Afonso.[i] Ele próprio, o Governador, já estivera em visita às cachoeiras em junho de 1925. Aliás, o governador Costa Rego declarou, em Relatório enviado à Assembleia Legislativa, ter o Estado dispendido a importância de 159$500 (Cento e Cinquenta e Nove Mil e Quinhentos Réis).


D. Pedro de Orleans e a princesa Elisabeth, ao desembarque no Rio de Janeiro, com seus filhos Isabel de Orléans e Bragança (a moça de tranças), Pedro de Alcântara Gastão de Orléans e Bragança, Maria Francisca de Orléans e Bragança, João Maria de Orléans e Bragança e Teresa Teodora de Orléans e Bragança. Foto: Frou-Frou, outubro de 1925.

No dia 4 de maio, chega ao Recife, a bordo do vapor Itapuí. Hospedou-se no palacete do Conde Pereira Carneiro, na Rua das Ninfas.[ii] Nos três dias em que permaneceu na capital pernambucana, visitou a Faculdade de Direito, o Colégio Salesiano, a Santa Casa de Misericórdia e o Instituto Histórico de Pernambuco. E segue viagem.


Dia 11, Fortaleza. Recebidos pelo governador Desembargador José Moreira da Rocha (12/07/1924-19/05/1928), dirigiram-se à Praça do Ferreira. Visitaram a Catedral, o Palácio do Governo, o Colégio Militar, o Colégio da Imaculada Conceição, o Quartel do 23º Batalhão de Caçadores e a Escola de Aprendizes Marinheiros.[iii]


Dia 12, em São Luís, demorando-se algumas horas, visitando os principais pontos da cidade em companhia do governador José Maria Magalhães de Almeida (01/03/1926-01/03/1930).[iv]


Dia 16, chega a Belém. Na Capital paraense, os jornais da época relatam o encontro do príncipe com uma senhora negra, octogenária, que se apresentou a ele dizendo ter sido escrava do Conde D’Eu, e que o tinha embalado em seus braços quando criança. Depois de gentil acolhida, diz o Jornal do Recife, de 19 de maio de 1927, D. Pedro “lhe entregou um generoso mimo como lembrança daquele encontro após tantos anos de separação. ”


Dia 23, chega a Manaus a bordo do vapor Distrito Federal. Recepcionados pelas autoridades locais, o Major Floriano Machado e o Capitão Oliveira Goes, além do Governador do Acre, Hugo Carneiro, concentraram-se na Praça Oswaldo Cruz, sob aclamação popular. É o que conta o Jornal do Comércio, de 24 de maio de 1927.


Em viagem de retorno, a 13 de junho, nova passagem por São Luís de retorno do Norte, a bordo do vapor Itambé. Visita a redação do jornal Pacotilha. Dia 18. Chega a Teresina de trem. Dia 23, desembarca em Sobral, vindo de Teresina de trem. Dia 1º de julho – Natal.[v]


Dia 3 de julho, de volta do Recife, visita a Câmara e Senado e o Barão de Suassuna, na Usina Limoeirinho. A essa altura, os planos para a visita às cachoeiras estariam mudando. A promessa feita ao Governador Costa Rego não se cumpriria, pois se apresentava uma outra rota mais vantajosa: partir de trem para Garanhuns e, de lá, penetrar o território alagoano até chegar à Pedra de Delmiro.


Nota do O Jornal, do Rio de Janeiro, de 5 de julho, informa que o Governador de Pernambuco, Estácio Coimbra, ofereceu o seu automóvel oficial para o traslado do príncipe e sua família em suas visitas na Capital. Notícias outras, no entanto, falam da sua chegada àquela importante cidade do interior pernambucano na gare da Great Western.

Vista parcial de Garanhuns tomada do Alto da Boa Vista. Contava 2.350 casas e cerca de 10 mil habitantes. Foto: Revista de Pernambuco, 1925.


No dia 7, segue para Garanhuns, de onde partirá para a Vila da Pedra e Cachoeira de Paulo Afonso. Na Estação da Great Western de Garanhuns, foram recebidos por um grande número de pessoas. Entre elas o Coronel Euclides Dourado, Prefeito do Município; os doutores Jonathas Costa, Claudio Cavalcanti e Alfredo Vieira, Juiz de Direito, Juiz Municipal de Promotor Público, respectivamente; Dom João Moura, Bispo Diocesano; além de representantes da imprensa e associações locais. Senhoras e senhoritas lhes ofereceram lindas corbeilles de flores naturais, diz o Jornal do Recife em sua edição do dia 16 de julho de 1927.


Às expensas da edilidade, foram reservados aposentos no Hotel Motta, o melhor da cidade, localizado a poucos passos da Estação, “com instalações de água encanada e eletricidade”, diz o anúncio nos jornais da época. O estabelecimento fundado em 1880, ganhara novo prédio, inaugurado no dia 11 de abril de 1909. Seu proprietário era o Sr. José Motta.


O Cel. Almeida Filho (José de Almeida Filho, Ex-Prefeito do município e proprietário da Empresa Melhoramentos de Garanhuns) representante ali da Fábrica da Pedra, ofereceu os automóveis de que precisavam para a viagem à Vila da Pedra e Cachoeira. Aliás, lembra a reportagem, foi o pai do ilustre visitante, o Conde D’Eu, quem inaugurou o Ramal Glicério-Garanhuns, em 1889. A Estação Glicério passou a se chamar, a partir de 1940, Paquevira.


NA VILA DA PEDRA       


Às nove horas da noite do dia 8 de julho, os automóveis em que viajava a comitiva chegam à vila da Pedra. Além de sua esposa e filha, acompanhavam o Príncipe o seu secretário Tenente Mário Baldi[vi] e o Dr. Pedro Luiz Correia de Araújo,[vii] seu amigo particular.


Dirigindo-se à casa do Gerente da Fábrica de Linhas, Dr. Horácio Bráz da Cunha[viii]. Acompanhado pelo Sr. Manoel Simões Barbosa[ix], Presidente da Companhia Agro Fabril Mercantil,[x] apresentaram os visitantes aos presentes: Vice-Governador: Luiz Torres[xi], que representava o Governador Costa Rego, e o seu irmão Dr. Miguel Torres[xii]. Juiz de Direito de Água Branca; e o Sr. Aníbal Bebiano, técnico da Fábrica.[xiii]


A reportagem do jornal Correio da Pedra faz questão de mencionar o aspecto pessoal dos visitantes, informando que “trajava o Príncipe D. Pedro calça de brim amarelo e paletó de brim de cor diferente. Sua Alteza princesa Elisabeth, vestido de fazenda listrada e a princesa Isabel, blusa de maillot (Jersey) e saia azul. Os longos cabelos da jovem princesa de Orleans caiam-lhes pelos ombros divididos em duas bonitas tranças, a cujas extremidades se achavam presos lindos laços de fita”.


Falando sobre a viagem, D. Pedro disse ter tido boa impressão de tudo que vira; e não demonstrou incômodo com as condições das estradas, posto que já passara por outras piores. Jantaram às 22:00h.


No dia seguinte, 9 de julho, às 8:45h, os membros da comitiva, em seis automóveis, seguiram para a Cachoeira Paulo Afonso. O primeiro deles ocupado pelas princesas Elisabeth e Isabel, e o Dr. Horácio Bráz da Cunha. No segundo, iam o Príncipe D. Pedro e o Sr. Manoel Simões Barbosa. Os outros quatro eram ocupados por pessoas gradas da Vila.


Às 9:35h, já estavam nas cachoeiras. Depois de avistarem as grandes quedas, descerem pela escada “em parafuso” à Usina, tendo chegado ali em primeiro lugar a princesa Isabel.


Voltando, fizeram uma parada para descanso na casa da Diretoria, onde o Engenheiro Eletricista italiano Valentino Somigliana, ofereceu-lhes vermouth, que foi tomado por todos, exceto por Suas Altezas Imperiais, que preferiram café.

Após o descanso, seguiram a visitar a placa de bronze colocada pelo Engenheiro Carlos de Mornay, em 1869, por ordem do Presidente da Província das Alagoas José Bento da Cunha Figueiredo Junior, local que marca a visita do Imperador D. Pedro II, em 1859. O fotógrafo Álvaro Lemos[xiv] fez várias fotos desses momentos.

Volta, então, o repórter a tratar dos trajes dos visitantes imperiais. A princesa de Orleans trajava verde escuro e a princesa Isabel vestido listrado com cinto amarelo. O príncipe calça amarela e paletó de casimira cinzenta.

Às 12:00 estavam de regresso quando, no Cordeiro, encontraram-se com o Major José Lucena,[xv] Comandante das Forças Centro-Oeste do Estado, destacado em Água Branca. Por ordem do governador Costa Rego, veio colocar-se à disposição de D. Pedro de Orleans enquanto permanecesse em nosso Estado.

Registre-se que tal providência se revelava de grande valia, uma vez que grupos de cangaceiros já atuavam naquela Região. O próprio Major Lucena, há bem pouco tempo, fora vítima de uma emboscada no lugar denominado Salgado, próximo à Vila da Pedra, em que saiu sem vida o Capitão Eutíquio Raphael de Medeiros. Estava com eles o Juiz de Direito Miguel Torres, aqui referido. Ainda em dezembro daquele ano, seriam pronunciados os réus José Barbadinho, Anízio de Tal e Pedro Moreno pelo crime de homicídio contra o Capitão Euthíquio e tentativa de homicídio contra o major José Lucena de Albuquerque Maranhão. Foi despronunciado o suposto cúmplice Joé Torquato da Silva.[xvi]

Às 12:50h, entravam de novo na Vila da Pedra. Após o almoço e descanso, o príncipe, sua esposa e filha, acompanhados dos Srs. Dr. Horácio, Manoel Simões, Dr. Correia de Araújo e Major José Lucena, fizeram demorada visita às instalações da Fábrica e à Redação do Correio da Pedra, aonde chegaram às 15:30h, detendo-se na seção de Litho Typo.

Trajava nessa ocasião a princesa Elisabeth lindo vestido de seda cinzenta e trazia lindo colar de pérola. No corpete ostentava-se bonita rosa vermelha. A princesa Isabel trajava vestido simples e chic. Duas formosas tranças desciam-lhe nos ombros. De uma simplicidade encantadora, indagava vivazmente a utilidade de cada uma das máquinas da seção e dos serviços por ela realizados.

O Sr. Casimiro Novaes, Administrador Interno da via férrea Paulo Afonso (o titular era o Coronel Luiz Vieira, que se achava na Capital) apresentou-se ao príncipe como representante da Great Western e pôs a sua disposição um trem para o percurso Pedra-Piranhas.

A reportagem conclui dizendo que todas as pessoas que visitaram os descendentes da família imperial saíram agradavelmente impressionados com os seus modos simples e fidalgos.

No livro de visitantes da Cachoeira de Paulo Afonso, D. Pedro Orleans deixou as seguintes impressões:

Deslumbrados pela grandeza da cachoeira Paulo Afonso, assim como pela habilidade e esforços dos engenheiros que aproveitaram esta força, vemos nesse ponto da terra brasileira um grande futuro de progresso para nossa Pátria”.

(Pedro Orleans Bragança, Elisabeth princesa de Orleans Bragança, Isabel de Orleans Bragança).

Em notícia do Diário da Noite, de São Paulo, de 14 de julho de 1927, temos:

“MACEIÓ, 14. O príncipe D. Pedro de Orleans e Bragança, acompanhado de sua família, durante a excursão que realizou pelo interior deste Estado, esteve na cidade operária da Pedra e visitou a cachoeira de Paulo Afonso. Dom Pedro e sua família seguiram pelo interior com destino ao Sergipe, de onde passarão depois à Bahia. ”

Com efeito, da Estação da Pedra, tomaram o trem para Piranhas. Na pitoresca cidade alagoana, ponto inicial da Estrada de Ferro Paulo Afonso, o fotógrafo registrou o aspecto do São Francisco: as altas serras, o rio pedregoso e, particularmente, a canoa em que se deslocariam até Propriá.

Na sequência, as fotografias feitas por Baldi, sobre as quais fazemos alguns comentários.

A princesa Isabel de Orleans posa ao lado de um mandacaru-gigante. "Seus longos cabelos caiam-lhes pelos ombros, divididos em duas bonitas tranças, a cujas extremidades se achavam presos lindos laços de fita." Foto: Mário Baldi,1927.

Pedro Luiz Correia de Araújo


Vila operária da Pedra.


Estação da Pedra


Automóveis atravessando um riacho. Foto: Mário Baldi

Em um “trole” sobre uma linha férrea da Fábrica da Pedra. Foto: Mário Baldi.





Diversos pontos da cachoeira. Foto: Mário Baldi




Piranhas. Crianças brincam com réplica de canoa. Foto: Mário Baldi, 1927.


Piranhas. Canoa de tolda em que viajaram até Propriá-SE. Foto Mário Baldi.

O fotógrafo Mário Baldi, sob o toldo, fez essa tomada em que aparecem a Princesa Elisabeth, a sua filha Isabel, o Príncipe D. Pedro de Orleans e um tripulante da canoa. Ao fundo, vê-se o pano traseiro da canoa. Foto: Mário Baldi.


Sob o toldo, mas desta feita no sentido da proa da canoa, Mário Baldi flagra a Princesa Elisabeth sentada sobre uma esteira de piripiri. Ao fundo, vê-se a porta de entrada da tolda.



A princesa Isabel de Orleans sentada sob o toldo. Em primeiro plano, a prancha de embarque/desembarque. Ao fundo, D. Pedro e a Princesa Elisabeth sentados sobre o banco postado defronte à tolda.


Nesta tomada do alto, vemos a tolda em primeiro plano; a princesa Elisabeth entre esta e o toldo; a prancha de embarque/desembarque; Dom Pedro de Orleans e o piloto ao lado do pano traseiro.


Tomada da popa da canoa, esta foto mostra o toldo de lona que se usava para proteger passageiros e mercadorias. Ao fundo, a tolda e o pano de proa enluvado (fechado). O ponto luminoso no interior da tolda é a escotilha de proa que, além de oferecer arejamento, também projeta, à noite, um feixe de luz produzida pelo lampião. É o que os canoeiros chamavam “farol”.


Nesta foto, Mário Baldi mostra a canoa por inteiro: a popa, vendo-se o leme, em cuja parte superior (chamada “cabeça do leme”) se insere a “cana-de-leme”, por meio da qual o piloto manobra a embarcação. Um remo repousa sobre o “carro-de-popa”, esse compartimento que encobre o porão, espécie de convés. Um toldo feito de lona encobre quase todo o vão intermediário da embarcação. À frente, a tolda coberta com palhas de coqueiro, sobre a qual o piloto faz reparos no pano de proa. 


A canoa em porto na região de Piranhas. Foto: Mário Baldi


A progressista cidade de Propriá-Sergipe. Foto: Mário Baldi.


O casal Pedro e Elisabeth sentado sobre o banco anterior da tolda. À esquerda, uma das escotilhas da tolda, para permitir a passagem de luz a ar. Foto: Mário Baldi. 


Presume-se que tenham viajado na noite do dia anterior (domingo), chegando a Propriá na manhã do dia 11.

No dia 13 de julho já estava em Salvador. Visitou as cidades de Cachoeira, São Félix e Feira de Santana. No dia 23, seguiram para o Rio de Janeiro a bordo do vapor Itaquatiara.

No dia 8 de agosto, o príncipe visita o Presidente da República Washington Luís (15/11/1926-24/10/1930) e, no dia 30, Parte para a Europa a bordo do vapor Raul Soares.

Pão de Açúcar, 2009. O Governador de Alagoas,Teotônio Vilela Filho; Dom João Henrique de Orleans-trineto de D. Pedro II e Bragança e o Prefeito Jasson Silva Gonçalves, diante do Sobrado que hospedou D. Pedro II em 1859.


*****      *****

O fotógrafo, que também servia de secretário particular, é um personagem digno de registro.

Mário Baldi. Foto: Revista Manchete, 1954.


Mario Joseph Anton Johann Baldi, mais conhecido como Mario Baldi ou apenas Baldi, nasceu em 18 de janeiro de 1896, na cidade austríaca de Salzburg, Europa. Filho do comerciante Alois Baldi e Louisa Baldi, vinha de uma família de artistas e comerciantes, emigrada da Itália para a Áustria em meados do século XIX.

Após a Primeira Guerra (1914-1918), deixou seu país em direção ao Brasil com seu irmão mais novo, Herbert, e desembarcou no Rio de Janeiro do vapor Poconé, uma antiga embarcação alemã incorporada à frota do Lloyd Brasileiro em 24 de março de 1921.

No mesmo navio vieram dois outros jornalistas alemães: Herhar Herz e Érich Weiser, com os quais Baldi havia trabalhado em diversos jornais de Berlim. Para suavizar a monotonia da viagem, Baldi fazia diariamente, à máquina, um pequeno jornal em que publicava todas as ocorrências de bordo, informando também, a cada dia, a distância em que o vapor se encontrava do Rio. Todos os dias, à tarde, o jornalzinho era afixado em um determinado ponto, sendo lido por todos. Aliás, era muito apreciado devido a uma seção de indiscrições.

Lá pela segunda metade da década de 1920, Baldi trabalhou na casa imperial em Petrópolis, onde conheceu o príncipe D. Pedro de Orleans e Bragança. De empregado, Baldi passou a seu secretário e fotógrafo particular, e o acompanhou em viagens por todo o Brasil, como esta às províncias do Norte. As imagens produzidas nesse contexto foram aos poucos chegando à imprensa ilustrada brasileira. O fotógrafo retornou à Europa com D. Pedro em 1928.

Retornou ao Brasil e, nos anos 1950, Baldi já não tinha vínculos oficiais com a imprensa (havia deixado o jornal A Noite e se transferido para os Diários Associados em 1949). Continuou a publicar seus materiais em revistas como Manchete e outras europeias com as quais ainda mantinha contato. Casou-se pela segunda vez em 1955 com a holandesa Ruth Yvonne Fimmen (Emmy Baldi, sua primeira esposa,morrera vítima de câncer em 1953).

Em 1957, numa trágica viagem à região dos índios Tapirapé em Mato Grosso, Ruth foi morta por uma picada de cobra cascavel e, na tarde do mesmo dia, Mario Baldi sofreu um ataque cardíaco, vindo a falecer. Ambos foram enterrados na aldeia. Em 1961, uma fotografia da sepultura do casal foi feita pelo amigo Rubens Stückenbruck. É esse o último registro fotográfico da trajetória do fotógrafo austro-brasileiro Mario Baldi. Ele nos deixou as fotografias que ilustram este texto.[xvii]

PEDRO DE ALCÂNTARA DE ORLEANS E BRAGANÇA. Nasceu em Petrópolis, RJ, a 15 de outubro de 1875. Faleceu a 29 de janeiro de 1940 em Petrópolis.

ELISABETH MARIA ADELHEID DOBRZENICZ. Nascida em Chotěboř, perto de Praga, a 7 de dezembro de 1875, território então pertencente ao Império Austro-Húngaro (1867-1918) e hoje pertencente à República Tcheca, Elisabeth Dobrzensky era a única filha de Jan Vaclav II (1841-1919), conde João Dobrezensky de Dobrzenicz, e de sua esposa, Elizabeth de Kottulin e Krzischkowitz (1850-1929), Condessa de Kotulinsky von Kotulin[xviii]. Faleceu a 10 de junho de 1951, na Quinta do Anjinho, em Sintra, Portugal. Foi sepultada no dia 25 de julho do mesmo ano em Petrópolis.[xix]

ISABEL DE ORLEANS E BRAGANÇA. Nasceu no Castelo d'Eu, Sena Marítimo, 13 de agosto de 1911 e faleceu a 5 de julho de 2003). Casou-se aos 19 anos no dia 8 de abril de 1931, em Palermo, com seu primo Henrique de Orléans, Conde de Paris.Tornou-se escritora. Tornou-se escritora, com o livro DE TODO CORAÇÃO, publicado simultaneamente na França e no Brasil.

Em 2009, por ocasião das comemorações do sesquicentenário da visita do Imperador Pedro II à Cachoeira de Paulo Afonso, seu trineto, o Príncipe Dom João Henrique de Orleans e Bragança, filho de João Maria de Orléans e Bragança e da egípcia Fátima Scherifa Chirine, participou da caravana Caminhos do Imperador, revisitando todas as cidades ribeirinhas.

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Caro leitor,

 

Este Blog, que tem como tema “HISTÓRIA E LITERATURA”, contém postagens com informações históricas resultantes de pesquisas, em geral com farta documentação e dotadas da competente referência bibliográfica. Por esta razão, solicitamos que, caso algumas delas seja do seu interesse para utilização em qualquer trabalho, que faça uso tirando o maior proveito possível, mas fazendo também o necessário registro de autoria e a citação das referências. Isso é correto e justo.

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Nossos agradecimentos ao Professor Edvaldo Nascimento, prestigiado historiador da bela Delmiro Gouveia, pela cessão da reportagem do Correio da Pedra.

 



[i] JORNAL DO RECIFE. 6 de maio de 1927.

[ii] A PROVÍNDIA, 4 de maio de 1927.

[iii] O IMPARCIAL, Fortaleza, 12 de maio de 1927.

[iv] FOLHA DO POVO, São Luis, 12 de maio de 1927.

[v] O JORNAL, RJ, 3 de julho de 1927.

[vi] LOPES, Marcos F. de Brum. 2010. Mario Baldi: experiências fotográficas e a trajetória do “repórter perfeito” – (1896-1957). Dissertação de mestrado. Niterói: UFF.

[vii] Pedro Luiz Correia de Araújo (Paris, França, 11/05/1881 – Rio de Janeiro, RJ,10/11/1955). Pintor, desenhista e professor. De família tradicional pernambucana, é educado em Recife, onde se forma em Direito. Abandona a carreira jurídica e vai a Paris no início do século XX para estudar arte. Afasta-se dos métodos acadêmicos e torna-se autodidata. Fonte: Enciclopédia Itaú Cultural.

Filho de Pedro Francisco Correia de Araújo e Gasparina dos S. Correia de Araújo. Formado em Direito pela Faculdade do Recife. Era casado com a Srª Lilli Correia de Araújo, com que teve os filhos Pedro Gaspar Correia de Araújo (ceramista) e Luiz Correia de Araújo (proprietário de loja de plantas no Rio de Janeiro). Fonte: Correio da Manhã, RJ, 17/11/1955.

[viii] Horácio Bráz da Cunha. Gerente da Fábrica de Linhas. Filho do industrial Antônio Bráz da Cunha e de Hortência da Veiga Braz da Cunha. Nasceu no Recife a 7 de setembro de 1893. Casado com Ruth Macedo Thompson. Almirante reformado, faleceu no Rio de Janeiro a 22 de junho de 1966.

[ix] MANOEL SIMÕES BARBOSA. Nasceu em 1892. Conhecido por “Nozinho”. Natural do Recife. Filho de Adolpho Simões Barbosa e Ângela Parente Vianna Simões Barbosa. Casado com Corina Câmara Simões Barbosa. Faleceu no Rio de Janeiro a 16 de junho de 1939, quando era Diretor-Tesoureiro Companhia Brasileira de Construções e Comércio – BRACO S/A.

[x] CORREIA DA PEDRA, 10 de julho de 1927.

[xi] Luiz Vieira de Siqueira Torres, filho do Barão de Água Branca. (Água Branca - AL  15/05/1864 - Água Branca - AL 10/06/1928). Engenheiro Agrônomo formado pela Imperial Escola Agrícola da Bahia em 1890. Deputado estadual nas legislaturas 1897-98; 99-1900; 1915-16 e 19-20. Eleito senador para a legislatura 1921-22, logo depois renunciou para assumir o cargo de vice-governador do Estado, para o período do governo Costa Rego. Fonte: ABC das Alagoas. BARROS, Francisco Reynaldo Amorim de. Foi casado com Cecília Dourado Torres, de cujo casamento não deixou filhos. Fonte: A PROVÍNCIA, Recife, 14 de junho de 1928.

[xii] Miguel Arcanjo de Siqueira Torres. Nasceu a 14 de junho de 1857. Iniciou o curso de Direito na Faculdade de São Paulo (1883-1884), e concluído na Faculdade do Recife (1885-1886-1887). Em 12 de outubro de 1889, foi nomeado Juiz Municipal em Penedo e, por muitos anos, foi Juiz de Direito de Água Branca, aposentando-se em 29 de julho de 1931. Era casado com uma filha de Teófilo Fernandes dos Santos.

[xiii] ANNÍBAL BEBIANO. Recentemente chegado a Alagoas. Antes, foi técnico da Companhia Fiação e Tecidos Corcovado e Companhia Aliança e gerente da Fábrica de Tecidos Carioca. Nasceu no Rio de Janeiro em 1880. Filho de Domingos Bebiano e Cândida Freitas Bebiano. Casado com a inglesa Madeleine Chapman. Faleceu a 16 de setembro de 1955.

[xiv] Álvaro Lemos era comerciante em Garanhuns. Tinha uma filha chamada Florinda Lemos, que casou com José da Silva Rosa, co-proprietário do Hotel Motta. Em 1923, em parceria com Abdísio Vespasiano, publicou o Álbum de Garanhuns.

[xv] José Lucena de Albuquerque Maranhão. Depois, Coronel Lucena Maranhão, conhecido perseguidor do bando de Lampião. Nasceu em Quebrangulo - AL 15/5/1893. Deputado estadual, militar. Foi o primeiro prefeito constituinte eleito em Maceió, em 1953, tendo sido antes prefeito de Santana do Ipanema. Deputado estadual, pelo PST, na legislatura 1951-55. Patrono da cadeira nº 19 da ASLAC. Faleceu no Recife a 19 de maio de 1955, aos 62 anos de idade, sendo sepultado em Maceió.

[xvi] DIÁRIO DE PERNAMBUCO, 4 de dezembro de 1927.

[xvii] LOPES, Marcos Felipe de Brum. Mário Baldi – Fotografias e narrativas da alteridade da primeira metade do século XX. Universidade Federal Fluminense, 2014.

[xviii] ANUÁRIO DO MUSEU IMPERIAL, 1953.

[xix] DIÁRIO DE NOTÍCIAS, RJ, 12 de junho de 1951.

 



A POESIA DE PÃO DE AÇÚCAR



PÃO DE AÇÚCAR


Marcus Vinícius*


Meu mundo bom

De mandacarus

E Xique-xiques;

Minha distante carícia

Onde o São Francisco

Provoca sempre

Uma mensagem de saudade.


Jaciobá,

De Manoel Rego, a exponência;

De Bráulio Cavalcante, o mártir;

De Nezinho (o Cego), a música.


Jaciobá,

Da poesia romântica

De Vinícius Ligianus;

Da parnasiana de Bem Gum.


Jaciobá,

Das regências dos maestros

Abílio e Nozinho.


Pão de Açúcar,

Vejo o exagero do violão

De Adail Simas;

Vejo acordes tão belos

De Paulo Alves e Zequinha.

O cavaquinho harmonioso

De João de Santa,

Que beleza!

O pandeiro inquieto

De Zé Negão

Naquele rítmo de extasiar;

Saudade infinita

De Agobar Feitosa

(não é bom lembrar...)


Pão de Açúcar

Dos emigrantes

Roberto Alvim,

Eraldo Lacet,

Zé Amaral...

Verdadeiros jaciobenses.

E mais:

As peixadas de Evenus Luz,

Aquele que tem a “estrela”

Sem conhecê-la.


Pão de Açúcar

Dos que saíram:

Zaluar Santana,

Américo Castro,

Darras Nóia,

Manoel Passinha.


Pão de Açúcar

Dos que ficaram:

Luizinho Machado

(a educação personificada)

E João Lisboa

(do Cristo Redentor)

A grandiosa jóia.


Pão de Açúcar,

Meu mundo distante

De Cáctus

E águas santas.

______________

Marcus Vinícius Maciel Mendonça(Ícaro)

(*) Pão de Açúcar(AL), 14.02.1937

(+) Maceió (AL), 07.05.1976

Publicado no livro: Pão de Açúcar, cem anos de poesia.


*****


PÃO DE AÇÚCAR


Dorme, cidade branca, silenciosa e triste.

Dum balcão de janela eu velo o seu dormir.

Nas tuas ermas ruas somente o pó existe,

O pó que o vendaval deixou no chão cair.


Dorme, cidade branca, do céu a lua assiste

O teu profundo sono num divino sorrir.

Só de silêncio e sonhos o teu viver consiste,

Sob um manto de estrelas trêmulas a luzir.


Assim, amortecida, tú guardas teus mistérios.

Teus jardins se parecem com vastos cemitérios

Por onde as brisas passam em brando sussurrar.


Aqui e ali tu tens um alto campanário,

Que dá maior relevo ao pálido cenário

Do teu calmo dormir em noite de luar.

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Ben Gum, pseudônimo de José Mendes

Guimarães - Zequinha Guimarães.






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Pão de Açúcar, Cem Anos de Poesia