quinta-feira, 24 de novembro de 2022

A CACHOEIRA DE PAULO AFONSO

 

Por De Castro e Silva[i]

É ainda grande o prazer que sinto ao ficar em contato com a Natureza, não como um panteísta, ajoelhado perante ela, mas como um artista sedento de paisagem e harmonia, em todas as suas cores, dando aos olhos uma alegria imensa.

Com esse desejo foi que me decidi fazer uma excursão à Cachoeira de Paulo Afonso, esses 250.000 cavalos vapor que correm, a esmo, num desperdício de força, sem que, até agora, merecesse a boa vontade do seu aproveitamento integral.

Cachoeira de Paulo Afonso - Queda "Os Três Mosqueteiros"

Eram 16 horas, num trem da Great Western, quando larguei da estação central de Maceió, com os demais, que, a despeito de vários pensamentos, se uniformizavam na vontade de ver a cachoeira tão falada, que cada um imaginava a seu modo.

Sucederam-se as estações e a noite caiu lentamente, quando o sol desapareceu por detrás dos morros e dos canaviais que margeiam a estrada. Eram já 23 horas quando o trem, cansado da subida, alcançou Palmeira dos Índios, ponto culminante desse ramal da via férrea.

Pela manhã, ao nascer do sol, saímos a respirar o ar cheiroso das manhãs, defendendo-nos dos “catabís” ou “bacadas”, como se diz no Brasil central, existentes nos caminhos.

A vegetação desse lugar, já no Sertão, é característica. Os cactos, a “coroa de frade”, o “chique-chique” e marmeleiro enchem a paisagem por entre as pedras enormes, tantas vezes aproveitadas por Lampião e seu grupo, em várias emboscadas.

Vão surgindo as casinhas dos sertanejos e manadas de cabras moxotós, carneiros, os cercados de pedra, e as plantações de palmas que os moradores, por causa das secas fazem, previdentes.

Perto das 17 horas, dentro da cidade da Pedra, no alto sertão alagoano, contemplamos o movimento fabril por excelência. A par da pecuária e da agricultura regionais, ergue-se uma bem aparelhada fábrica de fio, a maior ambição de um caboclo cearense que conseguiu industrializar o algodão para a linha de coser – a tão falada “linha da Pedra”.

Estação Central de Maceió. Fonte: Site História de Alagoas.

Esse caboclo, que nunca é demais repetir, é Delmiro Gouveia, o mais autêntico bandeirante dos sertões nordestinos. Audacioso como todo cearense, e malgrado, como todos os que possuem larga visão e combatem a rotina, Delmiro deu a Pedra um desenvolvimento e um progresso tal que, enriquecendo as regiões circunvizinhas, viria a ser uma larga fonte de turismo nacional.

É preciso visitar esse deslumbramento para conhecer o valor e a capacidade criadora do seu realizador, aproveitando a Paulo Afonso, em glorificação e tenacidade. Só assim poderá observa a ousadia desse vencedor de obstáculos que parecem impossíveis de vencer.

Delmiro deixou bem gravadas, nas rochas de Paulo Afonso, há mais de 25 anos, um valioso exemplo a seguir. No entanto... a nossa visita à cachoeira coincidiu com o vigésimo sexto aniversário do crime que vitimou esse grande e esforçado, ferindo também, a fundo, uma grande parte da economia nacional, a aproveitar com a força hidráulica ali produzida.

***   ***

Num velho “Ford” de bigodes virados e capotas de lona, quedamo-nos diante dessa cachoeira que Dom Pedro visitou a 20 de setembro de 1859, 84 anos antes. Já se ouve, à distância, o barulho de suas águas, despencando-se de uma altura considerável, e, pelo caminho avista-se, aqui e ali, descoberto, o encanamento de umas 3 polegadas, que conduz água para a fábrica da Pedra. Caminhamos agora a pé e daqui, do “Alto do Imperador”, admirando a queda que nos fica em frente, o “véu da noiva”, no lado baiano, a casa das máquinas encravadas nas pedras colossais, a água espumosa e enredemoinhada que passa em procura do rio que corre – para sentir em mistura com êxtases, a alegria, a tristeza de saber que ali, onde nos encontramos agora, foram jogadas à água todas as máquinas que Delmiro adquiriu e com que chegou a fábrica de linha de coser, concorrente de outra, de fama mundial...

Recordamos sem querer os versos de Olegário Mariano – “água corrente, vê que o teu destino é igual ao destino da gente”...

Vamos passar agora com um “trolley” velhinho que nos conduzirá ainda mais perto da cachoeira, à casa das máquinas, à contemplação mais próxima desse assombroso panorama artístico! Os nossos olhos deslumbram-se, o nosso coração parece que vai saltar e não sabemos se, avançando ou parados, contemplaremos melhor esse quadro vivo que a natureza nos mostra.

À direita, do lado de Alagoas, os “Três Mosqueteiros” parecem esgrimir nas rochas e as suas acrobacias e pelejas chegam até nós, trazida nas espumas, que se elevam ao sentirem-se mais apertadas nos lados. Parece que uma noiva passou por aí a arrastar o seu véu comprido. É isto o que nos lembra outra queda, à esquerda, do lado da Bahia. A indecisão nos persegue e não sabemos para onde ir. Tudo nos encanta e, perplexos, diante da Natureza, que é força e beleza, e da obra realizada pelo homem, “que a conquistou para as grandes realizações da vida”, como disse o jornalista Costa Rego, quando governador de Alagoas, andamos a passos descuidados, invejando as andorinhas, que volteiam felizes sobre as espumas, e as ervas, que se agarram às pedras brutas, molhadas ininterruptamente pela água, que passa, numa vertigem louca... Por um mundo de escadas de ferro e por um helicoidal, de 150 degraus, vendo a cachoeira e abismo debaixo dos nossos pés, descemos para ver as máquinas possantes que a coragem do nordestino Delmiro Gouveia, traiçoeiramente morto, por ser grande, fez assentar na cachoeira, querendo aproveitar a sua força. Talhadas na rocha, como os antigos egípcios fizeram, estão instaladas as turbinas, impulsionadas por 3 dínamos trifásicos, de 7.000 volts.

Os canos que descem, fazem uma sucção de 6.000 litros por segundo. Tem-se até agora apenas, um aproveitamento de 1.500 HP.

Deixamos a casa das máquinas e quisemos experimentar nova sensação. Trepamos numa caçamba, suspensa por 2 cabos de aço ligando dois Estados que se olham através da cachoeira. Mais um impulso e, eis-nos no meio do abismo de água e espuma, que passa dando mil voltas e contorcendo-se no apertado das rochas marginais. Estamos a uns 200 metros de altura e a caçamba balança nos cabos, pondo os nossos nervos à prova. Em baixo, formam-se lindos arco-íris, pela refração solar, e logo me lembrei de haver admirado quadro idêntico em um dos últimos passeios de avião que fiz sobre as salinas de Mossoró e Areia Branca, no Rio Grande do Norte.

Mais um impulso, e chego às pedras da Bahia. Sobre elas, como o Cristo no sermão da montanha, tenho a meus pés a água que passa cantando. As andorinhas continuam voando sem parar e, em volta, por cima da cachoeira, numa frágil caçamba, pois tudo diante dela se torna frágil e minúsculo... Revendo e subindo as mesmas escadas, deixo-me fica, ainda uma vez, contemplando aquela maravilha.

Excursionistas. Demócrito de Castro e Silva à esquerda.

Tentar descrever a Paulo Afonso será tempo perdido, porque todas as palavras seriam pálidas, sem justeza. Por isso apenas consegui deixar no álbum de impressões um quase nada do muito que parecia falar dentro de mim: “A Paulo Afonso é o maior presente da Natureza ao Brasil. Pena é que a sua queda seja ainda o “choro da energia abandonada”! E foi por isso, também, que A. Austragésilo, aos escrever as suas impressões, disse: “Feliz do home que puder gozar, um dia, a grandeza na natureza brasileira representada pela bela, formidável e indômita Cachoeira de Paulo Afonso”. E Castro Alves, em 1876, cantou-a, em oitavas camonianas, com a grandeza da sua poesia e o segredo sublime de suas formosas rimas:

“A Cachoeira! Paulo Afonso! O abismo!

A brica colossal dos elementos

As garras do centauro em paroxismo

Raspando os flancos dos parcéis sangrentos

Relutantes na dor do cataclismo,

Os braços do gigante suarentos,

Aguentando o ranger (espando! Assombro!)

O rio inteiro que lhe cai no ombro!”

 

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Que bom seria que a todos os brasileiros fosse fácil contemplar esta maravilha que nos pertence!

Se os matadores de Delmiro Gouveia tivessem sabido admirar a Cachoeira de Paulo Afonso, não lhe teriam assestado os rifles, porque haviam de ver naquele homem que descansava numa rede, no alpendre, um novo Titã, alterando o próprio curso dos rios, dominando a natureza para levar água às bocas sequiosas e às plantações crestadas pelo sol.

Quem visitar Paulo Afonso há de compreender as palavras do Cônego Luiz Barbosa: - “Nunca vi Deus falar tão alto como na Cachoeira de Paulo Afonso”

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Transcrito da revista VIDA DOMÉSTICA, Rio de Janeiro, Janeiro de 1944.

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Caro leitor,

Este Blog, que tem como tema “HISTÓRIA E LITERATURA”, contém postagens com informações históricas resultantes de pesquisas, em geral com farta documentação e dotadas da competente referência bibliográfica. Por esta razão, solicitamos que, caso algumas delas seja do seu interesse para utilização em qualquer trabalho, que faça uso tirando o maior proveito possível, mas fazendo também o necessário registro de autoria e a citação das referências. Isso é correto e justo.

 



[i]


Demócrito DE CASTRO E SILVA: Nasceu em Cruz do Espírito Santo, Estado da Paraíba, em 18 de setembro de 1913. Filho de Francisco Antônio da Silva e de Thereza da Silva Castro. A 5 de setembro de 1936, casou-se, em João Pessoa-PB, com Heloisa Machado de Castro e Silva, com quem teve os filhos Telmo de Castro e Silva e Tânia Maria.

Estudou na capital do Estado, no Colégio Diocesano pio X e no Lyceu Paraibano, bacharelando-se em Direito pela Faculdade do Recife, em 1946. Ainda, no Lyceu, De Castro e Silva iniciou a sua carreira literária; fundou as Revistas O Álbum e Mocidade, revistas que eram redigidas e datilografadas por ele mesmo e impressas nas oficinas do Jornal A Imprensa. Exerceu a advocacia por algum tempo em João Pessoa, depois, transferiu-se para São Paulo, onde manteve o seu escritório de advocacia até se aposentar, mantendo, também, as suas atividades literárias. Escrevia, regularmente, nos jornais A Imprensa e A União, colaborava com freqüência em jornais e revistas de outros Estados. Escreveu nas Revistas Vida Doméstica. Beira-Mar, Gazeta De Notícias, A Nação, Fru-fru e Revista da Semana, do Rio de Janeiro; Revista O Globo, de Porto Alegre Correio do Povo de Curitiba; Literatura e Arte, de Sérgio Millet, de São Paulo; A Gazeta, de São Paulo; O Triângulo, I de Uberaba. Militou, ainda, na imprensa de Maceió, Goiás, Maranhão, Bahia e Pernambuco e em La Vie Politique et literaire, de Bucarest, Rumênia. Ele era poeta, romancista, contista e ensaísta. Ingressou na Academia Paraibana de Letras em 10 de setembro de 1949, sendo recepcionado pelo acadêmico Durwal Albuquerque. Trabalhos de sua autoria: Ritmos estranhos; Esse colosso, o Brasil; Augusto dos Anjos- poeta da morte e da melancolia; Quatro séculos de poesia; Classe média (duas edições); Maciel Pinheiro-peregrino audaz(discurso de posse na APL); Augusto dos Anjos- o poeta e o homem; O arado e o gafanhoto; Poemas da terra e do homem; Do bicho papão ao lobisomem. Em elaboração: Os contos de Miquelina; Da importância política social e econômica da classe média. Faleceu em São Paulo a (?) Fonte: https://novo.aplpb.com.br/academia/academicos/cadeiras-21-a-30/195-n-22-fundador-democrito-de-castro-e-silva- Site da Academia Paraibana de Letras.

terça-feira, 8 de novembro de 2022

EM JARAMATAIA DE GARARU

Por Nertan Macedo[i]


O Coronel Antônio Caixeiro[ii] e sua mulher, Dona Balbina[iii], moravam na Fazenda Borda da Mata[iv], na margem sergipana do São Francisco, município de Canhoba. O rio passava defronte da casa grande, um casarão acachapado e longo, com uma porta de entrada entre oito janelas.

Antônio Caixeiro


O velho Antônio Caixeiro era alagoano, do outro lado do São Francisco. O sobrenome era apelido, que o tempo firmara entre as gentes daquelas ribeiras. Na sua mocidade, começara a vida trabalhando na loja do Major Bilé[v], que tinha casa de comércio na sua cidade natal, São Brás. Ganhava cinquenta cruzeiros por mês. Vendera fiado a um amigo, mercadorias no valor do ordenado. De modo que, ao deixar o major Bilé, nada recebeu do patrão, no ajuste de contas. Sua mulher, Dona Balbina, era sergipana, nascida na Capela. Se ao marido chamavam Antônio Caixeiro, a ela conheciam por Dona Branca, e não pelo nome de batismo.

Uma noite, quando o Coronel e Dona Branca dormiam, na Borda da Mata, ouviram umas pancadas na terceira janela da casa, do lado esquerdo da fachada. Acordaram sem sobressalto, porque eram sertanejos velhos e estavam habituados às solicitações de pousada, a qualquer hora.

Era uma noite escura. Fora, na esplanada, não se ouvia rumores. Os umbuzeiros, as canafístulas, os juazeiros nem de leve se agitavam, estáticos. Só o rio murmurava e corria, como uma esteira brilhante a trespassar o negrume do tempo.

Dona Branca


Dona Branca pôs o chale nos ombros, acendeu a lamparina da cabeceira da cama e dirigiu-se à sala. Botou a luz em cima de uma mesa e foi até a janela donde vinham as batidas. Tirou a tranca, espiou a noite morta, lá fora.

- Quem é – perguntou, voz sumida.

O visitante desconhecido encostara-se à parede, num movimento instintivo de defesa, aparecendo de subido aos olhos da fazendeira.

- Sou eu, Dona Branca, Virgulino Lampião, que venho fugindo, perseguido da tropa alagoana, pedir a Vossa Mercê e ao Coronel seu esposo um lugar de esconderijo, até a passagem da volante...

- Entre, meu filho, respondeu Dona Branca. E, virando-se para o marido, que assomava à sala, explicou:

- Antônio, é o Capitão Virgulino, que chega perseguido pelos soldados de Alagoas e pede pousada. Já mandei ele entrar...

O Coronel assentiu com a cabeça e ele mesmo foi abrir a porta da casa.

Das travas do lado de fora, o bando precipitou-se na sala, atrás do seu Capitão. Eram poucos homens, menos de vinte, cheirando a suor e perfume barato.

-  Boa noite, Coronel! Saudou Lampião.

- Boa noite, Virgulino! – respondeu o velho Caixeiro, sem surpresa.

O velho acostumara-se àquelas chegadas e partidas repentinas de Virgulino Ferreira, quando corrido do lado alagoano, pelos soldados do Major Lucena e de outros comandantes de volantes. Da primeira vez que ali viera, Lampião pedira ao Coronel apenas isto, propondo-lhe “um trato”:

- Eu só queria do senhor, Coronel, que me desse licença para acampar nas suas terras, de um lado e de outro do rio, quando a polícia estivesse nos meus calcanhares...

Pois vá se arranchando, Capitão, quando quiser e entender. É só atravessar o rio de um lado para o outro. Tem muita loca de pedra por esses matos e, se estiver com fome, pode matar uma criação para comer. Venha com cuidado, prá não deixar rastro à polícia. Pode dormir onde quiser, contanto que não falte com o devido respeito aos meus moradores e propriedades.

- Fique descuidado, coronel, que ninguém incomodará o senhor nem sua gente.

Cumpriu a palavra.

Dona Branca, na sala, perguntava ao capitão:

- Quanto tempo o senhor espera demorar aqui, seu Virgulino?

- O tempo de os “macacos” se largarem por aí...

- Pois vá para o quarto do meio do corredor, que ninguém lhe bota a mão em cima. Fiquem todos quietos, que eu mando levar a comida e fechar a porta.

Lampião e os cangaceiros recolheram-se ao quarto. Um cômodo abafado, com duas ou três redes armadas, uma janela que dava para o escampado lateral, à direita da casa.

O Capitão inspecionou, num relance, o local de homizio. Seus homens, sem tirar os arreios do cangaço, foram se aboletando pelos cantos, rifles entre as pernas cruzadas. Passavam os lenços e as costas das mãos nas faces suadas, nas testas luzidias, nos pescoços sujos. Dona Branca segurava a lamparina, seguida do Coronel. Apontou uma rede para Lampião:

- Deite aqui, seu Virgulino, para espantar o cansaço. Já vem um cafezinho torrado em casa e umas bolachas de sal. Mais tardo mando um almoço alentado.

- Não precisa de incomodar, Dona Branca, o que vier está bom.

O Capitão sentou-se na rede segurando o fuzil. Tirou o comprido punhal que trazia preso ao cinto da calça, colocando-o sobre o chão de tijolo, ao alcance da mão. Permaneceu-lhe o “Parabellum”, na cintura, as cartucheiras emoldurando-lhe o troco, o fuzil nas mãos.

Assim permaneceram horas dentro daquele quarto. Não se ouvia o zumbido de uma varejeira em toda a casa.

Lá fora, a manhã nascia sobre o rio e a caatinga. Vez por outra, um passarinho descia cantante, sobe o telhado da casa. Adivinhava-se o ruflar das suas asas em demanda do mato, voando na direção de alguma cerca, pousando em qualquer arbusto do garranchal. Os galos começaram a cantar, as galinhas cocoricavam, batendo as penas, pintos piavam na cada de minhocas. Alguns homens conseguiram adormecer. Na cozinha dos fundos, chios de panelas no fogão, anunciando o assado de carne.

O Coronel Caixeiro, na esplanada, assistia ao nascimento do dia. Vacas mugiam em frente, dispersas, tiniam chocalhos, o sol começava a fulgurar com violência, como se a vida em Borda da Mata prosseguisse normalmente, como em todos os dias do ano.

Na semiobscuridade do quarto, o corpo agora recostado à rede, pernas cruzadas, fuzil atravessado sobre o ventre, repousava das caminhadas o Capitão Virgulino Ferreira. Em volta dele, os cangaceiros, silenciosos, vigilantes, prontos a saltar do chão a qualquer movimento suspeito.

A um canto, o oratório de Dona Branca, os santos da devoção da fazenda, imagens toscas, humildes, rosadas, bochechudas, com seus hábitos escuros, suas coroazinhas douradas, as mãozinhas estendidas para o Capitão, numa súplica silenciosa, comovente. Sobre a toalhinha branca, rendada, imerso no óleo da candeia, um paviozinho queimava, lento, lento, a chamazinha inclinada, como uma minúscula asa de fogo. No centro do pequeno altar, o crucifixo de Jesus, o corpo aberto em chagas, a face sofredora, a coroa de espinhos, encimada pela inscrição – INRI.

Assim foi.

O sol da manhã já invadira a terra totalmente, requeimando-a, lá pelas dez horas do dia, quando o Capitão levantou-se, abriu cautelosamente a porta, e chamou:

- Dona Branca, vou embora!

- É cedo, seu Virgulino. Descanse mais um pouco, aconselhou a dona da casa.

- Não senhora, Dona Branca, preciso ir. Tenho negócios a tratar e este povo (apontou para os cangaceiros) precisa largar esta moleza, antes que o costume pegue...

E foram saindo pelos fundos da casa, chapéus nas mãos, rifles também , alimentados de sono e comida. À passagem do bando, o ar  era novamente invadido pelo cheiro de loções baratas, de mistura com suor.

Na porta dos fundos, Lampião falou ao Coronel:

- Adeus, Coronel! Se precisar de mim, sabe onde me achar. Até qualquer dia, Dona Branca!

Um após outro, os homens foram entrando na caatinga, desaparecendo em segundos, como por encanto. O Coronel e a mulher ainda permaneceram alguns momentos olhando na direção que o bando havia tomado.

Quando todos sumiram, dona Branca voltou ao quarto. Os cangaceiros haviam deixado tudo como encontraram. A velha aproximou-se do oratório para inspecionar as imagens. Ficou surpresa. Entre os dedos dos santos, das mãozinhas estendidas e súplices, dependuravam-se notas de vinte mil réis, deixadas ali pelo Capitão Virgulino e seus homens, como prova de devoção e respeito aos que habitam no Reino dos Céus.

Dona Branca estranhou que São Benedito fosse o menos contemplado. Na mão do negro bem-aventurado, um cangaceiro pusera uma velha e estragada cédula de cinco mil réis. A fazendeira sorriu. Quando o Capitão Virgulino reaparecesse, ela perguntaria por que São Benedito merecera tão pouco.

Meses depois, o Capitão passou novamente em Borda da Mata. Dona Branca indagou a Lampião a razão daquela parcimônia com São Benedito.  O Capitão justificou-se perguntando:

- Quem foi que já viu santo preto, dona Branca?

Dr. Eronides Ferreira de Carvalho


Tanta certeza tinha o doutor capitão Eronides de Carvalho[vi] que, mais cedo ou mais tarde, haveria de encontrar Virgulino Lampião que tratou de se preparar para não ser tomado de surpresa.

Oficial médico do Exército, mais tarde governador eleito de Sergipe, convalescia o doutor na fazenda Jaramataia, em terras de Gararu, quando o Capitão apresentou-lhe, no raiar do dia, a exemplo do que costumava fazer em casa do coronel Antônio Caixeiro. Era o doutor Eronides, filho do velho casal de fazendeiros de Borda da Mata.

Corria agosto, madrugada fresca, nos campos de Jaramataia. As últimas sombras da noite abandonavam o espaço, quando o médico foi despertado por um portador.

- Doutor Eronides, o capitão Virgulino Lampião mandava avisar que vem fazer uma visita ao senhor.

- Pois diga a ele que venha. Estou às ordens.

Quinze minutos depois o Capitão apareceu em pessoa. Chegou montado, um cavalo magro, de bons arreios, o bando a pé atrás dele. O doutor aguardava-o no alpendre.

Lampião demonstrou a distância e veio caminhando, sozinho, enquanto o grupo se detinha, cerca de uma vintena de cangaceiros.

Estendeu a mão para o médico, dizendo:

- Bom dia, doutor. Eu sou o Capitão Virgulino Ferreira da Silva Lampião. Venho fazer uma visita de boa paz ao senhor.

O doutor sorriu ao cumprimento, indagando:

- Então como devo chamá-lo: capitão ou coronel? Porque eu também sou capitão e deve haver aqui uma hierarquia - como oficial do Exército nosso ser comandado pelo senhor...

Lampião compreendeu a malícia e replicou:

- Pois desde já o senhor está promovido a coronel.

- Assim está bem, Capitão. Mande o pessoal tomar chegada para um cafezinho e soltar o cavalo no pasto.

A um gesto do chefe os homens foram se aproximando da casa grande de Jaramataia. Um deles era Ezequiel, irmão de Virgulino. Outro, seu cunhado Virgínio, homem de boas maneiras, cortês, o nariz afilado, moreno, bonito

Corisco, o de cabelos alourados, traços duros, modos insolentes.

No alpendre sentaram-se pelo chão, respeitosos, à espera da comida. Um permaneceu no pátio, rifle embalado, de sentinela.

O hospedeiro falou:

- Capitão, mande recolher aquele homem, que ninguém virá aqui nos incomodar.

Virgulino atendeu, o homem sumiu do pátio, vindo juntar-se aos companheiros que conversavam baixo para não incomodar o doutor e o capitão.

Na cabeceira da mesa, posta para o café matinal, disse o doutor Eronides:

- Eu tinha tanta certeza de que, um dia, o senhor ia me aparecer, que até me lembrei de comprar um presente para a ocasião.

Virgulino mostrou-se surpreso. Parece mesmo não acreditar.

O doutor chamou a empregada da casa, que tremia como vara verde. Ordenando-lhe:

- Vá buscar os presentes do capitão Virgulino.

Dentro em pouco a moça retornava, trazendo um embrulho. O doutor desatou-o. Continha uma garrafa térmica e um queijo holandês.

E continuou:

- Lembrei-me de comprar essa garrafa em que o senhor pode conduzir café quente, para beber a qualquer hora do dia e da noite. E este queijo estrangeiro, muito caro e bom, que trouxe de Aracaju...

O visitante sorriu, enfim, satisfeito, constatando a verdade do que lhe dissera o médico. Agradeceu, solícito.

A essa altura um dos cangaceiros gemia, a um canto do alpendre.[vii]

- Que tem esse homem? perguntou o anfitrião.

- Dor de dente - informou Lampião, lacônico. - Há dias que não pode dormir.

Voltou-se o médico, novamente, para a empregada da casa:

- Vá buscar uma aspirina e um copo d’água e dê a esse homem.

A moça voltou ao interior da casa e, reaparecendo no alpendre, com um comprimido e um copo d’água, passou-os ao cangaceiro doente.

O médico pode então sentir a disciplina e a autoridade de Virgulino. Um lado do rosto inchado, o cabra ficou segurando o remédio e a água, sem coragem para ingeri-los. Seus olhos, desconfiados, inquiridores, procuravam ansiosos, os do Capitão. Quando com os dele se cruzaram, um leve aceno de cabeça fez sentir ao cangaceiro que podia tomar a "receita", o que logo foi feito.

Depois da comida o Capitão, a pedido do dono da casa, consentiu em deixar-se fotografar, só e acompanhado. Prometeu o doutor enviar-lhe as fotografias de presente, quando ficassem prontas.

- Coronel, fique certo que eu mando cobrar estas poses ao senhor - disse-lhe Lampião.

E solicitou em "particular" ao médico. Este já esperava pelo pedido e se preparava convenientemente. Indicou o seu quarto de dormir, fechando-se, ambos, nesse cômodo. Por medida de precaução, o doutor pusera a sua parabellum embaixo do colchão, nos pés da cama, para qualquer eventualidade. Sentaram-se lado a lado, no leito, com a mão direita apoiada no colchão, em cima do revólver.

- Foi aí que eu notei a transformação- contou, mais tarde, o doutor. - As refeições do visitante cordial mudaram por completo. De um momento para o outro, aquela natureza estranha se transformou. Era, agora, outro homem, arrogante, grosseiro, autoritário, mais dono do que hóspede.

Falando quase num sussurro, como era de hábito. Lampião indagou:

- O senhor tem arma de fogo?

- Tenho e da boa, respondeu Eronides silabando a resposta.

- É igual a esta? - insistiu, puxando a Parabellum.

A arma, todavia, não saiu do coldre. O Capitão fez uma segunda tentativa, mas inutilmente.

- Está enferrujada, ponderou o médico.

- Mas temos força - revidou Virgulino e, num gesto brusco e violento, arrancou a Parabellum do estojo de couro que a detinha.

Calmamente, o doutor pôs a mão sobre a do Capitão, que sustinha a arma, comprimindo o botão que liberou o pente de balas que saltou ao colo de Virgulino. Eronides apanhou-o, guardando-o no próprio bolso, enquanto a mão, de novo, procurava com naturalidade disfarçada os pés da cama, onde ocultava a sua pistola.

Desarmara o cangaceiro, este então lhe pediu:

- Doutor, se as nossas armas são iguais, o senhor deve ter munição em casa. Estou desmuniciado e preciso de bala. O senhor vai me dar um pouco da sua;

- De fato, replicou Eronides, tenho uma caixa de munição em casa e posso cedê-la ao senhor.

Levantou-se. Foi a um armário próximo e retirou de lá uma caixa. Abriu-a sobre a cama e retirou um punhado de balas, que passou a Virgulino. Tirou um segundo punhado e quando apanhou o terceiro, quase esvaziando o conteúdo, Lampião obstou-o:

Basta, doutor. O senhor está morando nestas brenhas e precisa tanto quanto eu. Vamos dividir igualmente a munição - e ele próprio repartiu a caixa, após o que retornou ao alpendre, para bater em retirada.

Na hora da despedida, o doutor fez-lhe presente de um par de perneiras do Exército.

- Na qualidade de Capitão, o senhor não pode andar sem perneiras, comentou Eronides.

- Não esqueça as fotografias, lembrou Virgulino. - Qualquer dia desse em mando buscá-las.

Tempos depois, estava o doutor Eronides na fazenda Cajueiro, descansando numa espreguiçadeira, quando um desconhecido dele se aproximou, transmitindo-lhe o seguinte recado:

- O Capitão Virgulino mandou buscar as poses da Jaramataia.

- Diga ao Capitão que eu não mando agora; Entrego depois, no lugar onde ele indicar.

- Pois pode mandar coronel para o Porto da Folha, entregar na venda que fica na entrada da rua. Basta chegar ao balcão e dizer – China!

Mais tarde, o doutor chamou um dos seus vaqueiros, fazendo-o portador das fotografias. Ensinou-lhe a senha indicada.

O vaqueiro foi a Porto da Folha, chegou à bodega, onde se achavam alguns fregueses, gritando:

- China!

O dono da mercearia fez-lhe um sinal, levando-o, incontinenti, a um quarto no interior da casa. Ali recebeu das mãos do portador as fotografias tiradas em Jaramataia.

Um dia, o bando de Lampião matou um vaqueiro do doutor Eroniçdes, em Nossa Senhora da Glória. Num encontro com o Capitão, lamentou o acontecido de modo amargo:

- Seus homens mataram o meu vaqueiro, Capitão. Deram-me um prejuízo de quinze contos de réis, quantia que o homem levava, da venda de um gado nas Alagoas.

Lampião ouviu. A seguir justificou-se:

- Aquele vaqueiro não prestava, coronel, nem pra mim nem pro senhor. Falava demais! Dava conta de todos os meus passos pela sua propriedade. Vivia batendo com os dentes na feira. Quanto ao dinheiro, pode ter certeza de que não me apoderei dele. Deve estar com o defunto...

E mandou alguns dos seus homens abrir a cova do vaqueiro em cujo bolso interno, do paletó, foram encontrados, intactos, os quinze contos da venda do gado.

Pediu, mais de uma vez, montarias arreadas ao doutor Eronides e as devolveu depois, sem faltar uma corda, uma cela, um estribo.

Doutra feita, o médico aconselhou Virgulino a largar a vida erradia do cangaço.

- Não posso, coronel, é tarde demais. Em todo lugar querem me destruir.

Muitas vezes o Capitão voltou a pedir munição ao doutor. Não vinha recebê-la pessoalmente. Determinava o lugar onde devia ser enterrada. À noite ia buscá-la, com a sua gente.

Aproximava-se do fim.

Vez por outra, nas suas andanças por Sergipe, acoitava-se nas locas de pedra à margem do São Francisco. Passava aí dias e dias, alquebrado, vinte anos de viver perseguido pelas tocas do sertão. Tinha quarenta anos de vida, mais da metade passada no cangaço.

Num dos seus derradeiros encontros com o doutor Eronides, que se achava doente, Lampião lhe disse:

- Vou mandar Maria Bonita tratar do senhor. Ela tem mãos de fada.

Morria, pouco depois, ao lado da amante, na Gruta dos Angicos.

Lampião e seu bando na Fazenda Jaramataia, Canhoba-SE. Da esquerda pra a direita: De pé: Mariano; Ezequiel, vulgo“Ponto Fino”; Calais; Fortaleza; Mourão;  e Volta Seca. Sentados: Lampião; Virgínio, vulgo “Moderno”; Zé Baiano; e Arvoredo. 27.11.1929.

Lampião_Fazenda Jaramataia-Gararu-SE, 27.11.1929. Foto Eronides de Carvalho



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Transcrito do Jornal do Comércio, Rio de Janeiro, 3 de dezembro de 1961.

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Caro leitor,

Este Blog, que tem como tema “HISTÓRIA E LITERATURA”, contém postagens com informações históricas resultantes de pesquisas, em geral com farta documentação e dotadas da competente referência bibliográfica. Por esta razão, solicitamos que, caso algumas delas seja do seu interesse para utilização em qualquer trabalho, que faça uso tirando o maior proveito possível, mas fazendo também o necessário registro de autoria e a citação das referências. Isso é correto e justo.



[i] NERTAN MACEDO DE ALCÂNTARA

Nertan Macedo, 1957.

Jornalista, poeta, escritor. Nasceu no Crato-CE, a 20 de maio de 1929. Filho de Júlio Teixeira de Alcântara e Corina Macedo de Alcântara e irmão de Denizard Macêdo, escritor e jornalista, redator do Diário de Pernambuco, Jornal do Commercio e O Jornal. Ocupou a cadeira número 17 do Instituto Cultural do Cariri. No dia 26 de julho de 1949, casou-se, no Rio de Janeiro, com a Srª Maria Gessen Amaral. Filhos: José Luiz, Virgínia e Paula. Faleceu no Rio de Janeiro, a 30 de agosto de 1989, aos 60 anos de idade. Compôs, em parceria com o Mons. Mourão, a música Louvação a João XXIII, interpretada por Luiz Gonzaga. Foi colunista de O Estado de São Paulo. Foi seminarista. Começaria sua vida jornalista ainda muito jovem, pelas mãos de Assis Chateaubriand, nos Diários Associados, quando foi, inclusive, redator da revista O Cruzeiro. Voltado para o jornalismo político, trabalhou, por vários anos, desde a sua fundação, na Tribuna da imprensa. Integrou a equipe de redatores do Jornal do Comércio após esse órgão ter sido adquirido por Assis Chateaubriand. Foi Secretário de Imprensa do Governo do Ceará, na gestão Virgílio Távora, Assessor de Imprensa de Mário Simonsen, da Fazenda, Redator da Confederação Nacional da Indústria. Mais recentemente fazia uma coluna no O Estado de São Paulo e escrevia artigos para  a Tribuna da Imprensa e Revista Nacional. Foi vereador pela UDN em 1950. Notabilizou-se e na poesia pela abordagem dos temas do cangaço e religiosidade, no Nordeste. Era pai do jornalista José Luiz Alcântara, Chefe de Reportagem do jornal O DIA. Fonte: Boletim da ABC http://memoria.bn.br/DocReader/517275/105

 [ii] ANTÔNIO FERREIRA DE CARVALHO. Filho de Jesuíno Ferreira de Oliveira Costa e de Annanias Perpétua dos Anjos, nasceu em São Brás-AL, no dia 24 de março de 1873. Faleceu a 5 de maio de 1948 em Canhob-SE. Foi prefeito do Município de Canhoba, cuja emancipação política, desmembrado de Aquidabã, ocorreu em 1937. Fonte: Familly Search.org.

 [iii] BALBINA ROSA DE MENDONÇA (Balbina Mendonça de Carvalho após o casamento no dia 21 de junho de 1894, em Capela, Sergipe), filha de José Luís de Mendonça e de Anna Rosa de Jesus, nasceu em  Capela-SE, no dia 25 de dezembro de 1871 e faleceu em Canhoba-SE, a 17 de outubro de 1946. Fonte: Familly Search.org.

 [iv] A fazenda Borda da Mata, por volta de 1871/1880, pertenceu ao Major Francisco Joaquim da Silva Lemos, e depois de seus filhos: Antônio de Barros Lemos, Izaac de Barros Lemos e Francisco Joaquim da Silva Lemos Junior, este casado com Ana Maria de Barros Leite.

[v] Major Bilé. Chefe político do Partido Liberal em São Brás-AL. 

[vi] ERONIDES FERREIRA DE CARVALHO. Médico, político. Interventor Federal no Estado de Sergipe. Filho de Antônio Ferreira de Carvalho e Balbina Mendonça de Carvalho. Nasceu em Canhoba-SE a 25 de abril de 1895 e faleceu no Rio de Janeiro a 19 de março de 1969, deixando a viúva Yvette de Melo Goes Carvalho e cinco filhos maiores.

 [vii] Robério Santos, do Canal Cangaço na Literatura, afirma ser o cangaceiro Volta Seca. Com efeito, o menino-cangaceiro posa para a foto com um lenço à mão.


A POESIA DE PÃO DE AÇÚCAR



PÃO DE AÇÚCAR


Marcus Vinícius*


Meu mundo bom

De mandacarus

E Xique-xiques;

Minha distante carícia

Onde o São Francisco

Provoca sempre

Uma mensagem de saudade.


Jaciobá,

De Manoel Rego, a exponência;

De Bráulio Cavalcante, o mártir;

De Nezinho (o Cego), a música.


Jaciobá,

Da poesia romântica

De Vinícius Ligianus;

Da parnasiana de Bem Gum.


Jaciobá,

Das regências dos maestros

Abílio e Nozinho.


Pão de Açúcar,

Vejo o exagero do violão

De Adail Simas;

Vejo acordes tão belos

De Paulo Alves e Zequinha.

O cavaquinho harmonioso

De João de Santa,

Que beleza!

O pandeiro inquieto

De Zé Negão

Naquele rítmo de extasiar;

Saudade infinita

De Agobar Feitosa

(não é bom lembrar...)


Pão de Açúcar

Dos emigrantes

Roberto Alvim,

Eraldo Lacet,

Zé Amaral...

Verdadeiros jaciobenses.

E mais:

As peixadas de Evenus Luz,

Aquele que tem a “estrela”

Sem conhecê-la.


Pão de Açúcar

Dos que saíram:

Zaluar Santana,

Américo Castro,

Darras Nóia,

Manoel Passinha.


Pão de Açúcar

Dos que ficaram:

Luizinho Machado

(a educação personificada)

E João Lisboa

(do Cristo Redentor)

A grandiosa jóia.


Pão de Açúcar,

Meu mundo distante

De Cáctus

E águas santas.

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Marcus Vinícius Maciel Mendonça(Ícaro)

(*) Pão de Açúcar(AL), 14.02.1937

(+) Maceió (AL), 07.05.1976

Publicado no livro: Pão de Açúcar, cem anos de poesia.


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PÃO DE AÇÚCAR


Dorme, cidade branca, silenciosa e triste.

Dum balcão de janela eu velo o seu dormir.

Nas tuas ermas ruas somente o pó existe,

O pó que o vendaval deixou no chão cair.


Dorme, cidade branca, do céu a lua assiste

O teu profundo sono num divino sorrir.

Só de silêncio e sonhos o teu viver consiste,

Sob um manto de estrelas trêmulas a luzir.


Assim, amortecida, tú guardas teus mistérios.

Teus jardins se parecem com vastos cemitérios

Por onde as brisas passam em brando sussurrar.


Aqui e ali tu tens um alto campanário,

Que dá maior relevo ao pálido cenário

Do teu calmo dormir em noite de luar.

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Ben Gum, pseudônimo de José Mendes

Guimarães - Zequinha Guimarães.






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Pão de Açúcar, Cem Anos de Poesia