Por Etevaldo Amorim
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Estação da EFPA em Piranhas. Foto: Site História de Alagoas |
Nos tempos em que, no Brasil, as ferrovias experimentaram
significativa expansão, foi construída em Alagoas a Estrada de Ferro Paulo
Afonso, graças à influência do Visconde de Sinimbu, então Presidente do
Conselho de Ministros (de 5 de janeiro de 1878 a 28 de março de 1880).
Objetivando fazer a interligação entre os cursos Baixo e
Médio do rio São Francisco, a via férrea consistia num percurso de 117 km,
partindo de Piranhas (então pertencente a Pão de Açúcar) e Jatobá, na Província
de Pernambuco. Tendo o seu trecho inicial (de Piranhas a Olhos d'Água, atual
Olho D'Água do Casado), inaugurado em 25 de fevereiro de 1881, foi finalmente
concluída até Jatobá em 2 de agosto de 1883.
A estrada trouxe, incontestavelmente, muitos benefícios para
a Região. Entretanto, até ser extinta em 1964, a Paulo Afonso sofreu muitos
revezes, incluindo dois pavorosos acidentes e a pecha de ser deficitária.
Outro ponto controverso foi a concepção do seu traçado.
Alguns analistas eram da opinião de que Pão de Açúcar (e não Piranhas) é que
deveria ter sido escolhida como ponto de partida da ferrovia, chegando ao ponto
de sugerir uma revisão desse trecho, realocando a nova Estação Central.
Comecemos com esse artigo do correspondente especial do
Diário de Pernambuco em Alagoas, publicado na edição de 23 de setembro de 1920[i]:
“Maceió, 19 de setembro de 1920.
Assim como há indivíduos que são constantemente vítimas de um determinismo
funesto, há também empresas que nasceram sob o influxo maligno de um fado
adverso. A Estrada de Ferro de Paulo Afonso é uma dessas empresas.
Desde que o engenheiro Krauss
foi, em 1868, incumbido de fazer os estudos dessa via férrea, cuja construção
se iniciou em 1878, na vigência de uma das mais terríveis secas que tem
flagelado o Nordeste, até hoje, aquela estrada ainda não deixou margem à menor
compensação para a soma aproximada de 7 mil contos que custou, sendo de quase
100 contos o déficit anual por ela deixado.
Apesar de otimamente construída,
a Estrada de Ferro Paulo Afonso tem tido desastres horrorosos dos quais são
mais notáveis os que ocorreram a 17 de julho de 1880 e a 20 de janeiro de 1891.
O seu traçado é dos piores, porquanto a sua estação central está situada em lugar cujas condições topográficas são muito desfavoráveis e a sua estação terminal não fica em lugar adequado à larga expansão. Não são melhores os pontos onde se acham as estações intermediárias.
O que o bom senso estava
mostrando era que a estrada de ferro deveria partir de Pão de Açúcar ou
Entre-Montes, localidades em que se torna difícil a navegação do São Francisco,
terminando em Tacaratu, região provida de terrenos fertilíssimos e de excelentes
brejos adaptados não só à bovinocultura como, principalmente, à policultura.
Obedecendo a essa diretriz, a
via férrea alcançaria Água Branca e Paulo Afonso (atual Mata Grande),
verdadeiros oásis no meio de uma zona desértica, onde se levanta somente uma
flora de cactáceas.
E bastariam essas duas cidades,
que ainda poderiam ser beneficiadas por um ramal da Paulo Afonso para lhe
garantir os mais opulentos lucros quintuplicados talvez pelas rendas oriundas
de Tacaratu.
Entretanto, na construção da via
acelerada predominou o capricho e a cupidez, fazendo-se dispendiosíssimos
trabalhos, muitos deles meramente suntuários, e... o resultado é que Paulo
Afonso está hoje reduzida a condições de pasmosa e terrível precariedade.
Chega a tal ponto a decadência
dessa estrada, que ela não tem uma locomotiva em sofrível estado e todas as
vezes que de piranhas parte um trem para Jatobá, é preciso que siga após ele um
empregado para ir pachorrentamente apanhando as peças que caem da imprestável
locomotiva.
É doloroso que se verifique fatos
desta ordem em um país onde há tanta deficiência de meios fáceis de
transporte!!”
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Mapa da ESPA. Foto: Site História de Alagoas |
Outra opinião nesse sentido partiu do senador alagoano Eusébio de Andrade, que apresentou ao Senado a seguinte Indicação[ii]:
“A Estrada de Ferro Paulo Afonso
precisa, para dar resultado compensador ao enorme capital que representa, que
tenha o devido desenvolvimento.
O fim que o governo imperial teve
em vista, por ocasião da terrível seca de 1877, foi, principalmente, aproveitar
milhares de braços dos indivíduos que tangidos e acossados do Nordeste em
dolorosa emigração procuravam, pelas margens do São Francisco, o litoral, e
nesse sentido, foi decretada a construção a estrada, tendo por objetivo ligar o
Alto ao Baixo rio S. Francisco.
O erro do traçado foi logo depois
de terminada a construção reconhecido por todos os técnicos. A comissão de
estudos, tendo unicamente em vista e preocupada somente em ligar os dois
trechos do majestoso S. Francisco pela mais curta distância, esqueceu-se de
todos os demais preceitos econômicos.
‘Procurando apenas encurtar a
distância, escreveu um dos diretores dessa ferrovia, o saudoso Dr. Mello Netto[iii],
a Comissão levou-a para uma zona desabitada, pedregosa e estéril, atravessando
enormes tabuleiros de caatingas e pedregosos leitos de riachos secos que só têm
água durante a estação invernosa, até chegar ao seu ponto objetivo; quando,
entretanto, era evidente que seria preferível estender-se este traçado em
melhores condições técnicas e econômicas.’
É urgente, portanto, sanado esse
mal, dar à indicada ferrovia outro destino que não o de uma simples estrada de
socorro, transformando-a, como tudo impõe, no seio do sertão onde foi plantada,
em um elemento real de desenvolvimento, estímulo e auxílio à exploração das
riquezas de uma grande zona no território nacional e dando à Nação as vantagens
indiretas que as empresas de transporte ferroviário proporcionam.
Sala das Sessões, 10 de dezembro
de 1920.”
E prossegue:
“A remodelação do traçado da
Estrada de Ferro Paulo Afonso é uma medida urgente e inadiável e deve consistir
em ligar Pão de Açúcar a Piranhas, e esta vila a Água Branca, Paulo Afonso e
Tacaratu.
Em Pão de Açúcar deve ficar a
estação inicial daquela ferrovia, porque, além desta cidade (que pode ter o
mais belo futuro, visto ser habitada por um povo laborioso e inteligente) é
difícil a navegação do S. Francisco e impedida por numerosos recifes, tais como
o de Magahen (provavelmente corruptela de Magalhães), pedras da huna e do
Mateus.
Partindo a estrada de Pão de
Açúcar, poderia ter uma estação no povoado da Ilha do Ferro, outra em
Entre-Montes e uma parada em Jacarezinho[iv],
onde existe magnífica salitreira, em outros tempos explorada pelos jesuítas.
Também seria de conveniência
estabelecer uma estação no lugarejo incipiente denominado Boa Vista. Ligada
Piranhas à zona das matas (Água Branca e Paulo Afonso), ampliaria
consideravelmente as possibilidades da Pedra e aproveitaria muito ao
desenvolvimento daqueles municípios, que são verdadeiros “oásis” no meio da
aridez circunjante. Terminando em Tacaratu, a Estrada de Ferro faria reviver
uma região esplêndida e dotada de recursos ótimos.”
Tivessem os técnicos e os políticos da época levado em conta
todas essas ponderações, Pão de Açúcar poderia ter sido brindada, naquelas
últimas décadas do Século XIX, com uma estrada de ferro.
Dá prá imagina o porto repleto de canoas de navios, o intenso
traslado de cargas, passageiros embarcando... O trem apita e parte. Transpõe o
Cavalete, passa na ponte sobre o riacho Pau-Ferro, ... Uma breve passagem pela
Estação da Ilha do Ferro, depois Entre-Montes e segue até o ponto final, em
Pernambuco.
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Obra de arte da antiga EFPA. Foto: Ida Wanderley Tenório |
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Obra de arte da antiga EFPA. Foto: Ida Wanderley Tenório |
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Obra de arte da antiga EFPA. Foto: Ida Wanderley Tenório |
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NOTA:
Caro leitor,
Deste Blog, que tem como tema “HISTÓRIA E LITERATURA”,
constam artigos repletos de informações históricas relevantes. Essas postagens
são o resultado de muita pesquisa, em geral com farta documentação e dotadas da
competente referência bibliográfica. Por esta razão, solicitamos que, caso
sejam do seu interesse para utilização em qualquer trabalho, que delas faça uso
tirando o maior proveito possível, mas fazendo também o necessário registro de
autoria e a citação das referências. Isso é correto e justo. Tratamento de
imagem: Vívia Amorim
[i] DIÁRIO
DE PERNAMBUCO, 23 de setembro de 1920.
[ii] DIÁRIO
DE PERNAMBUCO, 8 de fevereiro de 1921.
[iii] Antônio
de Souza Mello e Netto, Diretor da Estrada de Ferro Paulo Afonso. Irmão de
Ladislau Netto.
[iv]
Não se trata do Jacarezinho de Pão de Açúcar, mas de um povoado situado no atual
município de Olho d’Água do Casado.
Parece muito provável, estar esclarecido sobre a mina de salitre da serra de São Gregório descrita pelo sargento - mor Diogo de Campos Moreno no "Livro que dá Razão do Estado do Brasil " publicado em 1612 - onde está escrito o trecho que diz dá povoação do porto Jasuaba ,Jaciobá - Pão de Açúcar em 1611. Pois do porto de Jasuaba se tinha acesso a serra de São Gregório onde estava a dita mina de salitre que no Brasil colonial chegou a ser explorada pelos Jesuítas , hoje região compreendida no lugar Jacarezinho , interior de Olho d'água do Casado - Alagoas
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