sábado, setembro 6

NOTÍCIAS DO PASSADO – ESCARAMUÇA NA RUA DO MEIO

 

Por Etevaldo Amorim

 

Imagino-me na promissora Vila do Pão de Açúcar, naquele distante ano de 1877, a ler a edição do Jornal do Penedo, de 22 de junho. Ali estava uma das cartas do correspondente Aristarcho, cujo nome verdadeiro muito gostaria de saber.


Escrevendo no dia 6 daquele mês e ano, o competente missivista relata um episódio que, embora grave, revela-se um tanto burlesco. O fato se deu na Rua do Meio, atual Bráulio Cavalcante. Diz ele com riqueza de detalhes:


Rua do Meio, Pão de Açúcar, 1869. Foto: Abílio Coutinho.


“No dia de domingo, vinte do mês de maio próximo passado, na ocasião em que acabava-se de ouvir a Missa Conventual, presenciamos nesta Vila uma cena bem repugnante e imoral para os nossos dias.


Quando todos saíamos do Templo do Senhor, vimos com espanto o seguinte e terrível quadro:


José Gonçalves de Tal, na posse de uma formidável faca em punho, corria escandalosamente pela Rua do Comércio[i], vindo já do Tororó, nas pegadas de Luiz Bengo, que não menos corria como um viado, gritando socorro para não ser vítima de tão audaz turbulento, o qual conseguiu ainda dar-lhe uma facada no braço, quando ia se aproximando em confrontação à porta do Sr. Soares Pinto, onde chegando diversas pessoas, fizeram cessar semelhante barbaridade.


Compareceu também, imediatamente, o Subdelegado José Cyriaco[ii], que em flagrante capturou-o; e daí, com a maior ingenuidade, entregou-se à prisão, como se não fora aquele que, a poucos momentos, ia em procura de praticar um assassinato!


Não estamos informados, ao certo, da razão que deu lugar a esses valentões terem andado em tal brinquedo, porém o que sabemos com certeza é que o tal José Gonçalves é um rapazola fragalheiro[iii], de maus procedentes, irmão do bem conhecido Antônio Gringuindim, que como este queria agora mandar um portador à sua custa para o outro mundo.


Luiz Bengo também é muito conhecido nesta Vila, pelas suas façanhas. É homem que somente vive de jogos ilícitos, iludindo a quantos matutos lhe apareçam para, por meio de seu mágico baralho, fazer o dinheiro do pobre papalvo passar-se telegraficamente para sua algibeira, tendo como consequência matemática o matuto perder os cobres e às vezes apanhar e ir preso.


Portanto, muito desejaríamos que, pelos meios legais, se fizessem corrigir a tais cancros venenosos, que, além de serem escolas de perdição, defraudam e aniquilam por meio do estelionato a alguns pais de família de nosso centro, que por encantos, têm a infelicidade de se deixarem iludir por estes e outros que infelizmente aqui existem, em companhias, resultando às vezes desordens e conflitos como já temos presenciado.”


***   ***


Desde antes, e de lá para cá, com certeza muitos outros fatos como este se desenrolaram. Voltaremos a qualquer momento, como repórteres desses tempos passados, a perscrutar os jornais de diferentes épocas, dando a conhecer aos leitores esses pequenos episódios da nossa terra.

 

***   ***


NOTA:

Caro leitor,

Deste Blog, que tem como tema “HISTÓRIA E LITERATURA”, constam artigos repletos de informações históricas relevantes. Essas postagens são o resultado de muita pesquisa, em geral com farta documentação e dotadas da competente referência bibliográfica. Por esta razão, solicitamos que, caso sejam do seu interesse para utilização em qualquer trabalho, que delas faça uso tirando o maior proveito possível, mas fazendo também o necessário registro de autoria e a citação das referências. Isso é correto e justo.



[i] Atual Avenida Bráulio Cavalcante.

[ii] JOSÉ CYRIACO DE ASSIS FILHO, nomeado por Ato de 15 de fevereiro de 1876, do Presidente da Província de Alagoas, em substituição a JOSÉ LINO DAS VIRGENS, que pedira exoneração. Fonte: Jornal do Penedo, 8 de março de 1876.

[iii] O mesmo que ‘frangalheiro”, que se veste com frangalhos, farrapos.

2 comentários:

  1. Até que era interessante de vez enquanto um alvoroço e correria para quebrar a sisudez de uma pequena vila do século XIX

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  2. Achei o linguajar empregado bem parecido com o de alguns repórteres policiais atuais. Interessante texto

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A POESIA DE PÃO DE AÇÚCAR



PÃO DE AÇÚCAR


Marcus Vinícius*


Meu mundo bom

De mandacarus

E Xique-xiques;

Minha distante carícia

Onde o São Francisco

Provoca sempre

Uma mensagem de saudade.


Jaciobá,

De Manoel Rego, a exponência;

De Bráulio Cavalcante, o mártir;

De Nezinho (o Cego), a música.


Jaciobá,

Da poesia romântica

De Vinícius Ligianus;

Da parnasiana de Bem Gum.


Jaciobá,

Das regências dos maestros

Abílio e Nozinho.


Pão de Açúcar,

Vejo o exagero do violão

De Adail Simas;

Vejo acordes tão belos

De Paulo Alves e Zequinha.

O cavaquinho harmonioso

De João de Santa,

Que beleza!

O pandeiro inquieto

De Zé Negão

Naquele rítmo de extasiar;

Saudade infinita

De Agobar Feitosa

(não é bom lembrar...)


Pão de Açúcar

Dos emigrantes

Roberto Alvim,

Eraldo Lacet,

Zé Amaral...

Verdadeiros jaciobenses.

E mais:

As peixadas de Evenus Luz,

Aquele que tem a “estrela”

Sem conhecê-la.


Pão de Açúcar

Dos que saíram:

Zaluar Santana,

Américo Castro,

Darras Nóia,

Manoel Passinha.


Pão de Açúcar

Dos que ficaram:

Luizinho Machado

(a educação personificada)

E João Lisboa

(do Cristo Redentor)

A grandiosa jóia.


Pão de Açúcar,

Meu mundo distante

De Cáctus

E águas santas.

______________

Marcus Vinícius Maciel Mendonça(Ícaro)

(*) Pão de Açúcar(AL), 14.02.1937

(+) Maceió (AL), 07.05.1976

Publicado no livro: Pão de Açúcar, cem anos de poesia.


*****


PÃO DE AÇÚCAR


Dorme, cidade branca, silenciosa e triste.

Dum balcão de janela eu velo o seu dormir.

Nas tuas ermas ruas somente o pó existe,

O pó que o vendaval deixou no chão cair.


Dorme, cidade branca, do céu a lua assiste

O teu profundo sono num divino sorrir.

Só de silêncio e sonhos o teu viver consiste,

Sob um manto de estrelas trêmulas a luzir.


Assim, amortecida, tú guardas teus mistérios.

Teus jardins se parecem com vastos cemitérios

Por onde as brisas passam em brando sussurrar.


Aqui e ali tu tens um alto campanário,

Que dá maior relevo ao pálido cenário

Do teu calmo dormir em noite de luar.

____

Ben Gum, pseudônimo de José Mendes

Guimarães - Zequinha Guimarães.






PUBLICAÇÕES

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Pão de Açúcar, Cem Anos de Poesia