Por Etevaldo Amorim
Um
dos mais belos monumentos da capital alagoana é, sem dúvida, o que foi erigido
na Praça dos Martírios para homenagear o Marechal Floriano Peixoto.
A
iniciativa de fazer essa homenagem foi do jornalista Joaquim Goulart de
Andrade, que publicou no jornal Gutenberg, em 28 de janeiro de 1905, um Convite
para a fundação de uma Associação que se encarregasse de promover a construção
de um monumento à memória do Consolidador da República. Assim, no dia 2 de
Fevereiro de 1905, foi fundado o Centro Cívico Floriano Peixoto, cujo
presidente honorário era o Senador Euclydes Malta, sob o governo do seu irmão
Joaquim Vieira Malta.
Com
efeito, depois de uma campanha de donativos encetada pelo Centro Cívico, chegou
o dia marcado para o assentamento da Pedra Fundamental. Saindo do sobrado da
Sociedade Perseverança, na Praça D. Pedro de Alcântara (Praça da Catedral), os
membros da Diretoria do Centro Cívico[i],
acompanhados das principais autoridades do Estado, reuniram-se no centro
geográfico da Praça, às 5 horas da tarde daquele dia 24 de fevereiro de 1905.
Falaram o Intendente, Sr. Sampaio Marques e o orador oficial, Alfredo de Maya.
A
Pedra Fundamental, em mármore, continha, em baixo relevo, a inscrição: “Aere
perennes – PEDRA FUNDAMENTAL DA ESTÁTUA DO MARECHAL FLORIANO PEIXOTO.
24-II-1905 - Maceió”. Sob a Pedra, e acondicionados em urna de ferro, foram
colocados a Ata[ii]
de assentamento e exemplares dos jornais do dia, com circulação em Maceió, e
mais dois exemplares dos jornais A Tribuna e Gutenberg, em que foram publicados
os Estatutos do Centro Cívico Floriano Peixoto. Junto a estes, foram também
depositadas moedas de diversos padrões republicanos: $2.000 (Dois Mil Réis),
prata, do Império, fundida em 1889; $1.000 (Hum Mil Réis), prata da República,
fundida também em 1889; 500 rs prata, fundida em 1890; 200 rs e 100 rs, níquel,
primeira emissão da República; 400, 200 e 100 rs, níquel emissão atual; 40 rs e
10 rs, cobre, emissão da República; e 200 rs, prata, fundida em 1869[iii].
Somente
em 1907, quando o Senador Euclydes Malta voltou ao Governo do Estado, mandou
moldar e fundir a estátua do Marechal. O trabalho foi encomendado ao Sr. Angeli
Angiolo[iv],
proprietário da Fundição Artística Paulistana. Conhecida como “Sinos
Angeli”, iniciou sua tradição de fazer sinos em 1770, na Itália. Em 1898,
Angelo Angeli veio para o Brasil e se estabeleceu em São Paulo, à Rua
Conselheiro Ramalho, nº 100.
Fundia sinos e também estátuas.
Ainda hoje funciona, sob a liderança de Flávio Durso Angeli e Marcos Durso
Angeli, a empresa segue pela quarta geração, a mesma tradição na arte de fazer
sinos.
Segundo
as Instruções da Secretaria de Estado dos Negócios do Interior, assinadas por
Manoel Laurindo Martins Junior, publicadas na edição do dia 25 de agosto de
1907 do jornal Gutenberg, o Sr. Angeli ficaria obrigado a “construir e colocar no lugar determinado, na Praça dos Martírios, um
Monumento em granito e bronze. O trabalho deveria ser original, representando o
Marechal Floriano Peixoto em bronze, com 2,15 m, em uma posição calma e
enérgica, apoiado com a mão esquerda na espada e tendo na direita o chapéu de
Marechal, devendo todo o monumento constar de um baseamento em granito duro
polido, com 3,70 m de altura, sobre 4,20 m de largo na base”, além de
outros detalhes.
O
Governo pagaria ao construtor 18:000$000 (Dezoito Contos de Réis), sendo Nove
Contos por ocasião do desembarque do monumento completo no porto de Jaraguá e
Nove Contos de Réis logo que estiver assentado e pronto para ser inaugurado; ou
ainda toda a importância ao final do trabalho. Aliás, a autorização para a
despesa com a confecção da estátua já constava na Lei Orçamentária de 1895 (Lei
nº 123, de 12 de agosto de 1895), por Emenda Aditiva do Deputado Goulart de
Andrade. Entretanto, o pagamento foi feito[v]
de três vezes, em prestações de 6:000$000.
O
projeto artístico ficou a cargo do escultor italiano Lorenzo Petrucci, que fez
a modelagem. Seu atellier era estabelecido na Avenida Brigadeiro Luiz Antônio,
na capital paulista. Petrucci já era um reconhecido escultor, tendo sido autor
do monumento a Anita Garibaldi, em Belo Horizonte.
Em
dias de maio de 1907, sob a Administração do Intendente Dr. Guedes Nogueira, foram
iniciadas as obras de remodelação da Praça dos Martírios. O jornal Gutenberg,
em edição do dia 8 de maio de 1907, noticia:
“Na segunda-feira, 6 do corrente, esse
distinto engenheiro, acompanhado do laureado artista alagoano Rosalvo Ribeiro
que, com brilhante êxito e merecidos elogios do notável crítico de arte do
Jornal do Comércio – Dr. Carlos Américo dos Santos – levou a efeito a reforma
do jardim de Jaraguá, esteve naquela Praça.
Depois de vários alvitres, Rosalvo
Ribeiro opinou que se deve demolir a calçada da Igreja dos Martírios, a fim de
prolongar-se a Rua do Sol até a Caixa d´Água, dotando-se a igreja com uma
calçada artística menor, que mais contribuirá para que ela realce, e fique por
completo no alinhamento da citada Rua do Sol, hoje 15 de novembro.”
E
continua o conceituado jornal maceioense:
“Desaparecendo a calçada desse templo – que,
ao que se projeta – é um trambolho, uma monstruosidade, será facílimo fazer uma
decoração sistemática e na altura de um tal melhoramento pois que com a
demolição daqueles degraus e consequente reforma harmônica da escadaria, não se
interromperá o que se chama em arquitetura ‘linha de composição’. Substituirão,
na igreja, os que se pretende demolir, uns pequenos, artísticos e elegantes
degraus em batentes lajeados, obra de estilo moderno, mais em harmonia com o
conjunto de alvenaria projetada e que entrarão na composição combinada para a
realização das construções ora em estudo.”
Então
tinha uma Caixa d’Água na Praça dos Martírios?!
E
a Rua do Sol (que por aqueles tempos se chamava 15 de Novembro e, depois, se
chamou João Pessoa) não se estendia até a descida para tomar a Rua General
Hermes?!
Mas
essa não é a única curiosidade: também não havia a ligação da Praça com a
Avenida Moreira e Silva (Ladeira dos Martírios), mas apenas aquele beco
estreito que sai pelo lado esquerdo da Igreja. Somente na década de 1920[vi],
durante o governo de Fernandes Lima, foi feito o alargamento e calçamento
daquela que então se chamava “Ladeira de Santa Cruz”.[vii]
Mas,
voltemos ao monumento. No dia 5 de junho de 1907, já estava montada a sua base,
e desse dia em diante um tapume ocultava o trabalho de assentamento da estátua
às vistas do público, até o dia da inauguração.
Já
em 1908, quando a Intendência empreendeu melhorias na Praça, não achou
conveniente erigir o monumento no centro da Praça, onde houvera sido assentada
a Pedra Fundamental. Assim, em 25 de maio de 1908, o Engenheiro Eduardo
Whitehurst e o Sr. Angeli determinaram a retirada da pedra e o transporte para
o local definitivo. Mas, somente a 26 de maio de 1908, foi localizada a pedra.
No
dia 17 de maio de 1908, encontrou-se a antiga pedra fundamental, assentada em
24 de fevereiro de 1905. Testemunharam os Srs. Dr. Guedes Nogueira, Intendente
Municipal; Rosalvo Ribeiro, Goulart de Andrade; Olympio Moreira, Eduardo
Whitehurst, além de outras pessoas. Ocorreu que encontraram o cofre de ferro
totalmente oxidado. Aqueles exemplares de jornais foram danificados pela
umidade, bem como algumas das onze moedas. Não se encontrou a Ata, nem a caneta
com que fora lavrada. Os fragmentos da Pedra foram enviados ao Instituto
Histórico e Arqueológico de Alagoas.
Já
no dia 25 de maio de 1908, foram iniciados os serviços de fundação para
assentamento da base do monumento, sob a supervisão do Sr. Angeli[viii],
e no dia 4 de junho já estavam bem adiantados os serviços de remodelação da
Praça, achando-se já concluídas a reforma da base da escadaria da Igreja do
Senhor Bom Jesus dos Martírios[ix]
e removidos os trilhos dos bondes para local mais conveniente a sua estética.
A
INAUGURAÇÃO
Finalmente,
no dia 11 de junho de 1908, foi solenemente inaugurado o monumento.
O
jornal GUTENBERG, em sua edição do dia 13 de junho daquele ano, noticiou com
riqueza de detalhes o memorável evento:
“Mais
ou menos às 4 horas da tarde chegaram à Praça dos Martírios, sucessivamente, as
forças federais e estaduais, sob o comando do Capitão Cabral e Major Accioly,
que mandaram pôr os respectivos Regimentos em fileiras. Já então era enorme e
compacta a massa de populares, avaliada em duas mil pessoas precisamente.
Notamos a presença de toda a luzida oficialidade da Marinha; o Sr. Comandante
da Guarnição Federal e sua briosa oficialidade; Comissões da Guarda Nacional;
da Junta Sindical; da Associação Comercial; da Câmara dos Deputados; do Senado
Alagoano; funcionários federais, estaduais e municipais; membros da
Magistratura e dos magistérios primário e secundário; o Conselho Municipal
representado pelo Sr. Dr. Demócrito Gracindo; oficiais honorários e reformados
do Exército; bem como Voluntários da Pátria.
Compareceram
também o Exmº Coronel José Miguel de Vasconcelos e o Ilustre Dr. Guedes
Nogueira, digníssimo Intendente da Capital. Às 4 e ½ chegou o eminente
Governador Dr. Euclydes V. Malta, acompanhado da Comissão do Centro Cívico, que
fora a Palácio convidar S. Exª para assistir a cerimônias soleníssimas de
inauguração. Ao chegar Sua Excelência ao pavilhão especialmente levantado para
esse fim, as formas militares estacionadas na praça fizeram as continências de
estilo de vidas ao elevado cargo do Dr. Euclydes Malta. Em pós, estas tiveram a
palavra do nosso talentoso confrade Dr. Rodrigues de Mello, orador convidado
pelo Centro Cívico, que pronunciou uma bela peça de complexo valor
litero-filosófico, que foi mais um triunfo para o simpático jornalista
conterrâneo. ”
Um
irmão do homenageado, Sr. Alexandre Peixoto, também esteve presente. Nesse dia,
o comércio fechou às 3 horas da tarde, atendendo a recomendação do Centro
Cívico Floriano Peixoto. E, à noite, alegre retreta executada pelas bandas do
33 e da Polícia Militar. A decoração da Praça, a cargo do Sr. Alfredo Pinto,
proprietário da Casa Art-Nouveau, foi digna de elogios.
E
lá está ainda hoje estátua do “Marechal de Ferro”, na praça de mesmo nome,
conhecida popularmente por PRAÇA DOS MARTÍRIOS.
Figura 1. Fac simile do Convite publicado no jornal Gutenberg, assinado por Joaquim Goulart de Andrade.
Figura 2. Praça dos Martírios ainda
com a saída da Av. Moreira e Silva (Ladeira dos Martírios) fechada. Lá no alto,
onde deveria estar a subida da ladeira, há uma casa (até bonita), que depois
foi demolida. O Palácio da Intendência à direita; os bondes saindo da Rua
do Comércio. A fotografia registra a inauguração da tração elétrica dos bondes da
Companhia Trilhos Urbanos. Foto: Revista O
Malho, Ano XIV, nº 656, Rio de Janeiro, 10 de abril de 1915, p. 42.
Figura 3. Praça dos Martírios durante a inauguração dos bondes elétricos. À esquerda, pessoas na calçada junto ao muro do Palácio. Ao fundo, também à esquerda, casarão onde hoje se situa a Caixa Econômica Federal. Foto: O Malho, Ano XIV, nº 656, Rio de Janeiro, 10 de abril de 1915.
Figura 4. A Praça em reforma e a estátua do Marechal Floriano Peixoto já instalada. Nota-se que está voltada para a frente do Palácio. Acervo:Golbery Lessa.
Figura 5. O pintor Rosalvo Ribeiro. Foto: Revista da Semana, RJ, 27 de setembro de 1903.
Figura 6. A Praça totalmente remodelada.
Figura 7. A estátua ainda na Fundição Artística Paulistana, em São Paulo. À esquerda, o escultor Lourenço Petrucci. Foto. revista O Malho, 14 de dezembro de 1907, p, 24.
Figura 8. Novamente o escultor Lourenço Petrucci posando junto à Estátua, já instalada na Praça. Foto: Revista O Malho, 2 de janeiro de 1909.
Figura 9. Ângelo Angeli, proprietário da Fundição Artística Paulistana, onde foi fundida a Estátua. Foto: Jornal Il Pasquino, 1938.
Figura 10. Estátua já instalada. Foto: O Malho, 1910.
Figura 11. A Praça dos Martírios, vendo-se em primeiro plano uma estrutura semelhante a uma caixa d'água.
Figura 12. A Praça dos Martírios, vendo-se em primeiro plano o espaço aberto pela demolição da casa, propiciando a ligação com a Av. Moreira e Silva (antiga Ladeira da Santa Cruz). Nota-se que os bondes já saiam da Rua do Sol. Foto: Alen Morrison_New York_www.novomilenio.inf.br.
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NOTA:
Caro
leitor,
Este
Blog, que tem como tema “HISTÓRIA E LITERATURA”, contém postagens com informações
históricas resultantes de pesquisas, em geral com farta documentação e dotadas
da competente referência bibliográfica. Por esta razão, solicitamos que, caso
algumas delas seja do seu interesse para utilização em qualquer trabalho, que
delas faça uso tirando o maior proveito possível, mas fazendo também a
necessária citação de autoria e as referências citadas. Isso é correto e justo.
Segue
abaixo, como exemplo, a forma correta de referência:
[i] Henrique
Sadok de Sá, Presidente; Hugo Jobim, Secretário; J. Goulart de Andrade; Luiz
Silvério; Gabriel Jatubá; Alfredo Wucherer; Maria Dolores de Abreu Jatubá;
[ii]
Assinada por: Dr. Joaquim Paulo Vieira Malta, governador; Dr. Manoel Sampaio
Marques, Intendente de Maceió; Euclydes Vieira Malta, Senador Federal; Manoel
de Araújo Góes, Juiz Seccional; Cândido de Almeida Botelho, Presidente do
Conselho Municipal de Maceió; José Bernardo de Arroxelas Galvão, Deputado
Federal; Eusébio de Andrade, Deputado Federal; Alfredo de Maya, Deputado
Estadual; Jacintho de Medeiros, Senador Estadual; Octávio da R. Lemos Lessa,
Secretário do Interior; Antônio Guedes Nogueira, Secretário da Fazenda; Demócrito
Gracindo, lente do Lyceu; José Gomes Ribeiro, pelo jornal A Tribuna; Arroxelas
Galvão, pelo jornal Evolucionista; Carlos Pontes, pelo Jornal de Debates;
Goulart de Andrade, pelo Gutenberg; Josino V. de Cerqueira, pela Classe
Comercial; Jacintho Medeiros Filho, pela mocidade acadêmica; Domingos Simões,
pela classe artística; Manoel Anisio Jobim, pela magistratura estadual; Amaro
Baptista, engenheiro dos telégrafos e Cônego Octávio Costa, este último natural
de Pão de Açúcar.
[iii] GUTENBERG,
Maceió, 26 de fevereiro de 1905.
[iv] Angeli Angiolo faleceu em São Paulo no dia 2 de janeiro de 1938,
deixando a viúva Srª Blandina Ancelotti Angeli; os filhos: Rita, Fernando,
Elvira e Olinda; e ainda os netos: Alfio, Roberto, Milton, Angelo, Gilberto,
Luiz, Alcides e Fernando
.
[v]
Mensagem dirigida ao Congresso Alagoano pelo Bacharel Euclides Vieira Malta,
Governador do Estado, por ocasião da abertura da 2ª Sessão da 10ª Legislatura,
em 30 de abril de 1908, p. 16.
[vi]
Mensagem do Governador José Fernandes de Barros Lima, apresentada do
Legislativo em 21 de abril de 1924. Fonte: Relatórios dos Governadores dos
Estados Brasileiros, p. 57.
[vii]
Jornal do Recife, 31 de julho de 1920.
[viii]
Gutenberg, 26 de maio de 1908.
[ix]
GUTENBERG, 4 de junho de 1908.
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