sexta-feira, 28 de agosto de 2020

A CARAVANA DE ESTUDANTES QUE INVADIU PÃO DE AÇÚCAR

 

Por Etevaldo Amorim

Década de 1930. Naquele tempo, as populações sertanejas viviam sob a ameaça dos ataques de cangaceiros. Pão de Açúcar, que esteve na mira do bando do famigerado Lampião, temia uma invasão que, afinal, nunca houve. O que ocorreu, na verdade, é que foi invadida por um grupo de estudantes procedentes do Rio de Janeiro. Um “ataque” alegre e bem intencionado.

Num belo dia da segunda quinzena do mês de julho de 1935, quinze jovens universitários desembarcam na “terra de Jaciobá”, quebrando a monotonia da cidadezinha do interior do baixo São Francisco.

A viagem dos acadêmicos cariocas era patrocinada pela Associação Universitária da Faculdade de Direito da Universidade do Rio de Janeiro, e teve início a bordo do navio “Campos Salles, tencionando passar por Vitória, Salvador, Aracaju, Maceió, Recife e João Pessoa”.[i]

Durante as férias de julho daquele ano, formou-se a Delegação Acadêmica, assim constituída[ii]Antônio Marins Peixoto (22 anos, Presidente), Dario Fortes do Rego (25 anos, Secretário), José Guilherme de Araújo Jorge (21 anos, Orador), Benedicto Calheiros Bomfim (19 anos), Olavo Lima Rangel (21 anos), Clemenceau Luiz de Azevedo Marques (22 anos, Conferencista), Raymundo Arroyo (23 anos), Hélio Lins Walcacer (25 anos), Aryaman Viçoso Jardim, José Eduardo do Couto Filho (20 anos), Geraldo Martins Silveira (19 anos); Homero Diniz Gonçalves (23 anos); Antônio da Costa Marques Filho (24 anos), Rubens de Andrade Filho (20 anos); Renato Neves (21 anos) e João Condé (22 anos).

J. G. de Araújo Jorge. Foto: Revista Fon-Fon, 1934.

Zarpando no dia 30 de junho, logo alcançaram Vitória no dia seguinte, dali partindo no dia 1º de julho com destino a Salvador, onde chegaram no dia 3.  Surgiu ali a ideia de visitar a cachoeira de Paulo Afonso. Para tanto, em vez de prosseguir de navio até o Recife, optaram pelo trem até Aracaju. Foram, então, até o Interventor Juracy Magalhães e com ele conseguiram as passagens para a capital sergipana. Dali o trem os levaria até Propriá.

De fato, chegaram à “Princesinha do São Francisco” no dia 21.[iii] Tomaram, então, uma pequena lancha que os levaria até Piranhas. A disponibilidade dessa embarcação resultou de outra “facada”, desta vez no Interventor de Sergipe, Eronildes de Carvalho. De lá, tomariam o trem da Estrada de Ferro Paulo Afonso até a Estação da Pedra (atual Delmiro Gouveia), de onde seguiriam a cavalo até as cachoeiras.

Um dos componentes da caravana, o jovem estudante José Guilherme de Araújo Jorge[iv], conhecido nos meios acadêmicos e culturais por “J. G. DE ARAÚJO JORGE”, contava apenas 21 anos de idade. Nascera a 20 de maio de 1914, em Tarauacá, então Território do Acre, onde seu pai, o Dr. Salvador Augusto de Araújo Jorge, membro de tradicional família alagoana, era Juiz Municipal.

Além de festejado poeta, foi político atuante, tendo exercido mandatos de Deputado Federal pelo Estado da Guanabara, pelo MDB, nas Legislaturas: 1971-1975; 1975-1979; e, pelo PDT, Estado do Rio de Janeiro: 1979-1983; 1983-1987.

Em artigo publicado na revista Carioca, edição de 11 de dezembro de 1943, ele descreve aquela viagem e, especialmente, sua chegada a Pão de Açúcar.

A lancha utilizada pela caravana no porto de Propriá. Foto.
Revista Carioca, 1943.

“Em Pão de Açúcar, chegamos às duas da madrugada. Era época em que o rio estava vazio e as grandes praias do São Francisco ficam à mostra. Pois bem, às duas horas da madrugada, seu Serafim[v], o Prefeito, metido numa casaca, com colarinho engomado e pince-nez na ponta do nariz, aguardava a caravana.

Apesar da hora, havia muita gente e banda de música. Nem bem pulamos para a terra, e seu Serafim saudou os estudantes. E lá fomos nós, enterrando os pés na areia, no meio da música e da gente, abraçados pelo velhinho Serafim, todo amabilidade, para a pensão da dona Alice.

Seu Serafim recebera o nosso telegrama e preparara uma vasta ceia. A pensão, à falta de cama, estava lotada de redes. Nós olhamos a grande mesa posta... sentamo-nos... e comemos... comemos para não desgostar seu Serafim. A verdade é que não fizéramos outra coisa senão comer, desde que saímos de Propriá. Depois, nos espichamos nas redes. Isso sim, porque na lancha não havia camas, nem muito espaço para esticar as canelas.

A mesma lancha sob outra perspectiva. Propriá, SE. Foto: revista Pelo Mundo, 1922.


Passamos um dia inteiro em Pão de Açúcar e guardamos a lembrança inesquecível de seu Serafim que, à falta de um elogio maior, era mesmo “um serafim” de bondade.

Aí soubemos do caso doloroso de um caboclo, vítima do cangaço. Seu Serafim levou-nos a visita-lo dizendo que eram todos estudantes de medicina do Rio e que queríamos examiná-lo. Alguns médicos de Pão de Açúcar nos acompanhavam, e depois nos explicaram o caso.

Morava o caboclo com a mulher na aldeia Horizonte, a não sei quantos quilômetros dali. Um cabra de Lampião soubera que o pai do caboclo dera informações à polícia da passagem deles pela Região. A história de sempre. Entre a faca e a parede. Ou morrer nas mãos da polícia, ou nas do cangaceiro. Voltou com o bando, matou o pai, aproveitando-se todos da mulher, que estava grávida e a liquidaram também. Tudo isso na frente do caboclo que fora amarrado a um esteio da casa. Depois, com uma faca, o inutilizaram, e abandonaram-no a se esvair em sangue. O caboclo conseguira libertar-se das cordas e percorrera a pé a distância de muitos quilômetros até Pão de Açúcar, onde chegara quase morto.

Casos assim, ouvíramos contar muitos durante o percurso. Este, porém, vimos com os nossos próprios olhos, e nos horrorizamos diante da realidade. Estava ali, reduzido à inutilidade, um caboclo forte, em plena mocidade, enrijado pelo clima, cujos olhos parados e mortos prenunciavam o destino passivo dos bois de canga.

E foi com a visão da sua tragédia que deixamos Pão de Açúcar e continuamos viagem, rumo a Paulo Afonso”.[vi]

O navio Campos Salles.

Outro membro da delegação, Benedicto Calheiros Bomfim, era legítimo alagoano. Nasceu em Maceió no dia 24 de outubro de 1916. Filho de Pedro Brandão Bomfim e Maria Calheiros Bomfim, tendo como avós paternos: Antônio Correia da Silva Bomfim e Maria Brandão Bomfim; e avós maternos: José Joaquim Calheiros e Anna Pontes Delgado Calheiros. Desenvolveu brilhante carreira, destacando-se na defesa dos direitos humanos e, em especial, dos trabalhadores. Faleceu no Rio de Janeiro a 7 de maio de 2016, prestes a completar 100 anos. Era tio do Ex-Deputado Eduardo Bomfim.

A excursão continuou. No dia 26 de julho chegaram no Recife.[vii] No dia 10 de agosto de 1935, chegou ao Rio a caravana após 41 dias de excursão.[viii]

Os estudantes na relação de passageiros desembarcados do Campos Salles em Salvador.
Fonte: 
https://www.familysearch.org

A Delegação diante da Faculdade de Direito do Recife. Foto: Fon-Fon, 1935. Ao centro, de terno branco e lenço escuro no bolso, o Diretor da Faculdade, Prof. Edgar Altino. À esquerda dele, de terno escuro, o acadêmico Antônio Marins Peixoto.

Alguns membros da delegação em visita ao Diário de Pernambuco. Foto: DP, 27/07/1935.


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O Cap. Serafim Soares Pinto.

O Capitão Serafim Soares Pinto foi prefeito de Pão de Açúcar por três vezes: de 02/09/1892 a 31/07/1894; de 07/01/1911 a 07/01/1913 e de 08/01/1935 a 07/01/1936. Neste último período coube-lhe receber dignamente a Caravana dos Estudantes de Direito do Rio de Janeiro. Quando J. G. de Araújo Jorge publicou essas notas, seu Serafim já havia falecido. Não tomou ciência, portanto, da gratidão daqueles jovens estudantes pela sua amável recepção.

Sobre aquele fato contristador mencionado por Araújo Jorge, invocamos a informação dada por Aldemar de Mendonça no livro Monografia de Pão de Açúcar:

 

“BANDIDOS MATAM UM VELHO E CASTRAM O FILHO”

 

“No dia 23 de janeiro de 1935, os cangaceiros Zé Fortaleza, Medalha, Suspeita e Limoeiro, conduzem, preso, para a fazenda Solidade, o velho Vitório e, no percurso da fazenda Horizonte, matam o ancião e castram seu filho, conhecido por Beijo”.

Informa, ainda, o nosso maior historiador:

“No dia 19 de setembro do mesmo ano, os quatro bandidos foram mortos por Antonio de Amélia, na fazenda Aroeiras, do município de Mata Grande.”

De fato, a imprensa da época noticiou fartamente o triste fato[ix], com uma diferença: o local da execução dos cangaceiros foi a “Fazenda Aroeirinha”, localizada em território do atual município de Inhapi, à época pertencente a Mata Grande.

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NOTA:

 

Caro leitor,

Este Blog, que tem como tema “HISTÓRIA E LITERATURA”, exibe postagens com informações históricas resultantes de pesquisas, em geral com farta documentação e dotadas da competente referência bibliográfica. Por esta razão, solicitamos que, caso algumas delas seja do seu interesse para utilização em qualquer trabalho, que faça uso tirando o maior proveito possível, mas fazendo também o necessário registro de autoria e a citação das referências. Isso é correto e justo. Segue abaixo, como exemplo, a forma correta de referência:

Sugestão de registro de referência:

AMORIM, Etevaldo Alves. A CARAVANA DE ESTUDANTES QUE INVADIU PÃO DE AÇÚCAR. Maceió, agosto de 2020. Disponível em: . http://blogdoetevaldo.blogspot.com/2020/08/a-caravana-de-estudantes-que-invadiu.htmlAcesso em: dia, mês e ano.



[i] Jornal do Comércio, RJ 30 de junho de 1925.

[ii] Fonte: Jornal do Comercio, RJ, 11 de agosto de 1935;

[iii] A Noite, RJ, 22/07/1935.

[iv] Nasceu em Tarauacá - Acre, a 20 de maio de 1914. Filho de Salvador Augusto de Araújo Jorge e Zilda Tinoco de Araújo Jorge. Faleceu no Rio de Janeiro, 27 de janeiro de 1987.

[v] Serafim Soares Pinto. Era filho de Serafim Soares Pinto e Josefina Soares Pinto. Faleceu em Pão de Açúcar, em 28/07/1943, 3:45 h duma quarta-feira, aos 85 anos, sendo sepultado às 16:30 h.

[vi] ARAÚJO JORGE, J. G. de. CARAVANA À CACHOEIRA DE PAULO AFONSO. Revista CARIOCA, 11 de dezembro de 1943.

[vii] Gazeta de Notícias (RJ), 30 de julho de 1935.

[viii] Diário de Notícias, RJ, 11 de agosto de 1935 e Diário da Manhã, Vitória, ES, 2 de julho de1935.

[ix] Diário de Pernambuco, 18 de outubro de 1935; A Noite, RJ, 15 de novembro de 1935.




quinta-feira, 20 de agosto de 2020

O TIRO DE GUERRA DE PÃO DE AÇÚCAR

 Por Etevaldo Amorim

O Tiro de Guerra é uma Instituição que cuida da formação de atiradores e/ou cabos de segunda categoria (reservistas) para o Exército Brasileiro. Essas organizações são estruturadas de modo que o convocado possa conciliar a instrução militar com o trabalho ou estudo.

Esse modelo de Instituição Militar teve origem no Rio Grande, Estado do Rio Grande do Sul, em 1902, com o nome de “Linha de Tiro”. A partir de 1916, com a pregação de Olavo Bilac[i] em prol do Serviço Militar Obrigatório, passou a ter a denominação atual.

José da Silva Maia - Lamêgo
Em Pão de Açúcar, durante a Administração do Intendente José da Silva Maia (Lamêgo), de 07/01/1917 a 07/01/1923, foi Incorporado o Tiro de Guerra 656.


Em 1921, o Tiro já tinha como Instrutor o 3º Sargento
Aristófanes Cabral Costa. Em dezembro deste mesmo ano ele fundou, em parceria com o então farmacêutico Antônio de Freitas Machado, o jornal hebdomadário denominado A Pátria.[ii]

O Prof. Antônio de F. Machado

O historiador Félix Lima Junior[iii], que também tem raízes em Pão de Açúcar, em seu livro “Maceió de Outrora”, revela outra faceta do talentoso militar:


“Meia noite. Da Rua do Banheiro ou da margem da lagoa, em frente à estação dos antigos bondes da CATU, ouvia-se música, música animada de um "esquenta-mulher". Quem era, quem não era? Todos se dirigiam apressados, para a Rua Cônego Costa e encontravam Deus Momo, representado pelo Aristófanes Cabral Costa[iv], suboficial do Exército, cabeleira postiça, meia máscara de cetim preto, calções de veludo vermelho, sapatos rasos, de verniz, camisa de seda branca, manto azul cheio de bordados, um tricórnio coberto de lantejoulas. Chegara numa canoa ou num carro enfeitado, cercado de numerosos "súditos" conduzindo fogos de bengala, de várias cores, acesos, para anunciar ao povo maceioense o início de seu feliz reinado – outra "presepada" do velho Bonifácio[v], que marchava à frente do cortejo, alegre, com seu chapéu de palhinha balançando na ponta da bengala “...[vi]

Segundo Aldemar de Mendonça, em seu “Monografia de Pão de Açúcar”, naquele mesmo ano seria festivamente comemorado o dia da Proclamação da República. Os amadores do teatro apresentariam, no politeama Goulart de Andrade[vii], a peça “Convenção Social”, de autoria do próprio Aristófanes, dono de inegável talento.

Diz Aldemar de Mendonça:

E aquele dia corria com grande animação, quando deu na cabeça de Zé Maia desacatar algumas pessoas, com era seu costume”.

“Dias antes o instrutor, ignorando a situação do ambiente em que iria viver, sabendo que Zé Maia era ‘useiro e vezeiro’ em amedrontar a população desta cidade, propalara que não admitia que se prendesse um dos soldados do Tiro de Guerra. E como não falta quem queira ficar nas graças de quem fez medo, logo Zé Maia ficou inteirado da advertência feita pelo Instrutor do Tiro. E como Zé Maia revidava qualquer ameaça a sua pessoa, na tarde daquele dia, depois de “tomar umas e outras”, acompanhado por alguns soldados do destacamento, resolveu acabar com aquela animação”.

“Prendeu o atirador José de Castro Barbosa (Duda), o qual conseguiu escafeder-se, auxiliado pelos militares que o conduziam preso, e conseguindo atingir o rio São Francisco, embarcado na canoa “União” se transportou para a Vila Alecrim (Limoeiro), de onde viajou para o Rio de Janeiro, onde bacharelou-se e viveu até 1969”.

Sabedor da fuga do Duda, Zé Maia toma do rifle e atira em outro atirador, João Barbosa, não o atingindo, entretanto.O Instrutor do Tiro manda tocar “reunir” e, na sede da corporação, discute-se quais as medidas mais aplicáveis no caso. As opiniões se dividem e o Instrutor resolve ser prudente.

Alguns atiradores do Tiro de Guerra se ausentaram de Pão de Açúcar, para somente muitos anos depois reverem a terra natal. José Maia[viii] foi preso e conduzido para Maceió a fim de responder pelo desacato cometido, porém, dentro de poucos dias, dali regressava para continuar com suas estropelias”.

Ocorreu, entretanto que, por Despacho de 10/05/1922, do Ministro da Guerra[ix], aprovando resolução do Coronel Jayme Pessoa[x], Comandante da 5ª Região Militar, com sede no Recife, o Tiro de Guerra 656 teve suas atividades suspensas por falta de sócios.[xi]

O Sargento Aristófanes, que se safara do terrível perigo, retorna à Capital. Sua obrigação militar, no entanto, o leva a participar da Revolta Paulista de 1924, a segunda revolta tenentista. De Maceió, ele partiu no dia 17 de julho daquele ano, em companhia de seu irmão Tenente Audomaro Cabral Costa, para lutar ao lado das tropas do Governo. Compondo o 2º Batalhão de Caçadores, na linha de frente dos intensos combates que se verificavam na Capital paulista, foi atingido por estilhaços de granada, entrando para o rol das vítimas fatais, contando apenas 27 anos de idade.

O Sargento Brabo

Em 1927, já estava o Tiro em plena atividade, tendo como Dirigentes os senhores: Antônio de Freitas Machado, Presidente; Lucilo Mesquita, Vice-Presidente; Álvaro Machado, 1º Secretário; Antônio Vieira Filho, 2º Secretário; Otávio Soares Vieira, Tesoureiro; João Vieira Damasceno Ribeiro, Orador; e o 3º Sargento José Ferreira Brabo[xii], Instrutor.

O Sargento Brabo era natural de Pedreiras, Estado do Maranhão. Nasceu no dia 24 de maio de 1903, filho do casal José Pinheiro Ferreira e Constância Ferreira Brabo. Casou-se com a pão-de-açucarense Ancila Maciel. Faleceu em Maceió, aos 72 anos, no dia 2 de junho de 1975.

Eis um breve resumo da sua carreira: Em 1923, por ter concluído o curso na Escola de Sargentos de Infantaria, foi incluído na 3ª Região Militar, com sede em Belém-PA.[xiii] Em 1931, como 3º Sargento no 28º Batalhão de Caçadores (Aracaju-SE), é incluído no Quadro de Sargentos Instrutores[xiv]. Em 1932, é promovido de 3º para 2º Sargento[xv]. Em 1939, como 1º Sargento, foi nomeado Sub-Tenente, para servir nos Corpos da 5ª Região Militar[xvi]. Em 1940, é transferido do contingente da Fábrica de Realengo[xvii], onde era excedente, para o 1º Batalhão de Caçadores. Ainda neste ano, obtém licença de 35 dias para ir a Pão de Açúcar onde gozaria as férias daquele Exercício[xviii]. Em 1942, é promovido a Sargento-Ajudante[xix]. Em 1943, é transferido para a Reserva, em 1943[xx].

O Dr. Luiz Machado de Andrade
Nos anos de 1929/1930/1931, o Tiro esteve sob o comando da seguinte Diretoria: Luiz Machado de Andrade, Presidente; Antônio de Freitas Machado, Vice-Presidente; Cap Manoel Rego, 1º Secretário; Antônio V. da Costa, 2º Secretário; Manoel Vitorino Filho – Mestre Nozinho, Tesoureiro; 2º Sargento Eurípedes Lyra, Instrutor.

Durante a gestão desse Instrutor, sobre o qual, lamentavelmente, não pudemos obter maiores informações, irrompeu a Revolução de 1930. E a revista Excelsior, do Rio de Janeiro, edição de Dezembro de 1931, estampa uma fotografia sob o título “REMINISCÊNCIAS DA REVOLUÇÃO DE 1930”, e com a legenda: “Defesa do Pão de Assucar (E. de Alagoas). Trincheira do Sargento Eurípedes”.

Gervásio Francisco dos Santos, no seu livro Um Lugar no Passado, além de citar o Sargento Eurípedes, menciona outro Instrutor, o Sargento João Maximino, do 28º Batalhão de Caçadores, com Sede em Aracaju-SE.

Ele lembra os desfiles na Av. Bráulio Cavalcante, ao som da banda marcial, sob o comando do Mestre Nozinho, após as instruções de tiro no Alto do Parujé ou nas instruções de Ordem-Unida na Rua Aurora (atual Prof. Antônio de Freitas Machado, e que também se chamou Dr. Paes Barreto) ou na Rua Augusta, atual Pe. José Soares Pinto.

Essa Instituição de caráter cívico-social prestou relevantes serviços à sociedade, congregando muitas gerações de jovens pão-de-açucarenses[xxi]. Dois deles chegaram a defender a Pátria durante a Segunda Guerra Mundial: os combatentes Salvador Mendes Guimarães, na Força Expedicionária Brasileira – FEB (que combateu nos campos da Itália) e o próprio Gervasio Francisco dos Santos, na Força Aérea Brasileira – FAB.

Fato importante da história do Tiro foi a sua participação na defesa da cidade quando da tentativa de invasão do Grupo de Cangaceiros chefiado por Lampião. Ante as notícias de que o bando se aproximava, o então prefeito Manoel Pereira Filho procurou o Presidente Antônio de Freitas Machado e o Instrutor Sargento Brabo, a fim de que fosse organizada a defesa. E assim foi feito.

Sob as ordens do Sargento, Francisco Ferreira – Mestre Chico tocou o “toque de reunir” e, em pouco tempo, estava a Sede da corporação repleta de atiradores e voluntários. Dionísio Ignácio de Barros (responsável pelo armamento) distribuiu armas e munições e partiram para as entradas da cidade: Tapaginha, Campo Grande e Barra de D. Maria Jesuína.

Lampião, por certo sabedor de que a cidade se preparara para a sua chegada, lá não foi. E o confronto não aconteceu. Entretanto, uma fatalidade ocorreu: o soldado João de Manoel José, ao manusear inadequadamente o seu fuzil, acabou por ser atingido, vindo a falecer.

Não se tem informação de até quando funcionou o Tiro de Guerra 656. Fiquemos, então, com um pequeno “causo”, que dizem passar por verídico:

Um desses Instrutores, pretendendo ensinar aos soldados a hierarquia do Exército, discorria sobre as diversas patentes: soldado, cabo, sargento, tenente, etc. Severo, um bom e dedicado soldado, não conseguia compreender todas aquelas coisas, atribuições e tudo o mais.

O Sargento, esmerando-se ainda mais no seu intuito de tornar assimilável todo aquele assunto, dirige-se a Severo tomando a si próprio como exemplo:

- Severo, o que é que eu sou?

E Severo, com toda a convicção, prontamente responde:

- Sargento, o Senhor é CABO!!!!

Banda de Música que acompanhava os desfiles do Tiro 656. Foto 10/02/1927. 1ª fila, sentados, da esquerda para a direita: Francisco Ferreira – “Mestre Chico” (requinta); Alípio Carvalho Gomes; Brayner de Carvalho; Josias de Mestre Pedro; José Gonçalves Filho; Zequinha de Mestre Salo (clarinetes) Perdiliano Souza – “Perdiliano de Seu Né”; José Alexandre Filho (Nenê); e Oliveira (trompetes). Ao centro, Manoel Vitorino Filho – “Mestre Nozinho” (bombo). 2ª fila: José Souza – Zeca de “seu” Né (trombone); Anízio Borges (trompa); Luiz Ignácio e João Marcolino da Silva (trombones); Darcy Gomes (barítono); Virgulino Vieira e Yoyô Vieira (trompas). 3ª fila: Lourival Simas (hélicon); José Costa – Zé de Maria Bela; José Góes (pratos); José Profeta Sobrinho – “Carvão” (tambor); Júlio Alves de Carvalho (caixa); Francisco Antônio dos Santos – “Mestre Chiquinho” (bombardino); Afonso Lisboa (oficleide); e João Damasceno Lisboa – “Joãozinho Retratista” (hélicon). Acervo: Tonho do Mestre. Identificação: Williams Magno – Billy.

O historiador Aldemar de Mendonça, atirador do Tiro em 1927. Foto: acervo de Lygia Mendonça.
Os atiradores José Gonçalves Filho-Nozinho Andrade e João Damasceno Lisboa.
 Foto cedida por José Teófilo Neto.

O Sargento Eurípedes e uma guarnição do Tiro de Guerra 656. Foto: Revista Excelsior, 1931.



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NOTA:

Caro leitor,

Este Blog, que tem como tema “HISTÓRIA E LITERATURA”, exibe postagens com informações históricas resultantes de pesquisas, em geral com farta documentação e dotadas da competente referência bibliográfica. Por esta razão, solicitamos que, caso algumas delas seja do seu interesse para utilização em qualquer trabalho, que faça uso tirando o maior proveito possível, mas fazendo também o necessário registro de autoria e a citação das referências. Isso é correto e justo. Segue abaixo, como exemplo, a forma correta de referência:

Sugestão de registro de referência:

AMORIM, Etevaldo Alves. O TIRO DE GUERRA DE PÃO DE AÇÚCAR. Maceió, agosto de 2020. Disponível em: http://blogdoetevaldo.blogspot.com/2020/08/o-tiro-de-guerra-de-pao-de-acucar.html?m=1. Acesso em: dia, mês e ano.

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Meus agradecimentos a Billy Magno, José Ney (filho do Ten. Brabo), Lygia Maciel Mendonça e José Teófilo Neto, que me auxiliaram com informações e fotos.

[i] Olavo Brás Martins dos Guimarães Bilac, poeta, acreditava que o Serviço Militar possibilitaria aos jovens brasileiros livrar-se do analfabetismo e sonhava com um exército nacional, constituído pelas mais diversas classes sociais, que atuaria como instrumento de homogeneização e de integração cultural. A data do seu nascimento, 16 de dezembro, foi consagrada como DIA DO RESERVISTA.

[ii] Diário de Pernambuco, 3 de dezembro de 1921, p. 3.

[iii] Filho de Félix Alves Bezerra Lima e de Francisca Wanderley Lima. Era primo de Manoelito Bezerra Lima, o nosso “Nezinho Cego”.

[iv] Filho de Juvenal Augusto Pereira da Costa (funcionário do Telégrafo Nacional) e de Maria Julita Cabral Costa (professora pública). Deixou a viúva Isabel Vieira Barros, com que se casara a 16 de setembro de 1922, e um filhinho. Fonte: A Província, Recife, 8 de agosto de 1924. Foi promovido, post mortem, a 2º Tenente, por atos de bravura, por meio de Decreto de 22 de julho de 1924.

[v] Bonifácio Magalhães da Silveira nasceu no dia 14 de maio de 1867 em Recife, Pernambuco. Filho de Luiz José da Silveira e Henriqueta Francisca de Souza Magalhães da Silveira. Era tio da renomada psiquiatra Nise da Silveira. “Bonifácio, Major do Povo”, evocado na música “Carapeba”, composição de Luiz Bandeira e Julinho, interpretada por Luiz Gonzaga e por Eliana Pittman.

[vi] Disponível em: https://www.historiadealagoas.com.br/o-natal-de-felix-lima-junior-em-bebedouro.html. Maceió de Outrora, lançado em 1956 como parte da Coleção Cadernos da AABB, no Rio de Janeiro.

[vii] Fundado à época de Bráulio Cavalcante, e onde funcionou, por muitos anos, o Cine Palace.

[viii] No dia 1º de abril de 1927, José Maia foi assassinado em sua própria residência. Mendonça, Aldemar de. Monografia de Pão de Açúcar.

[ix] João Pandiá Calógeras (03/10/1919 – 15/11/1922), Governo Epitácio Pessoa.

[x] João Jayme Pessoa da Silveira. Jornal do Recife, 21 de maio de 1922.

[xi] O Paiz, Rio de Janeiro, 22 de maio de 1922.

[xii] Casado com Ancila Maciel Brabo (1909-1947), filha de Abílio de Carvalho Mendonça e de América Maciel Mendonça, com que teve os filhos Waldeck  e os gêmeos Maria Lúcia e José Ney. Ficando viúvo em 1947, contraiu segundas núpcias com a Srª Hilda dos Anjos, com quem teve Iara, mãe do advogado Marcelo Brabo. Ele ainda teve outra filha, Iracema, de um relacionamento com a pão-de-açucarense Maria dos Prazeres Gomes.

[xiii] Jornal do Comércio, RJ, 19 de julho de 1923.

[xiv] Diário de Notícias, RJ, 15 de agosto de 1931.

[xv] Correio da Manhã, RJ, 10 de março de 1932.

[xvi] O Imparcial, RJ, 15 de junho de 1939.

[xvii] A Batalha, RJ, 26 de junho de 1940.

[xviii] Diário de Notícias, RJ, 20 de novembro de 1940.

[xix] Diário de Notícias, RJ, 9 de outubro de 1942.

[xx] A Manhã, RJ, 3 de outubro de 1943.

[xxi] Integrantes do Tiro: Francisco Ferreira (Mestre Chico, corneteiro); Júlio Andrade (Júlio de Jaboti – tambor); Anízio Ramos de Aquino (Raminho – tambor); Florisvaldo Curruba (Fló – tambor); Salvador Curruba (tambor); João Pires de Carvalho; Odilon Pires de Carvalho; Mathias Pires de Carvalho; Carlos Serafim dos Anjos; José dos Anjos; Luiz dos Anjos; Odilon Rodrigues (Odilon de Terto); Mário Soares Vieira (do Limoeiro); João Almeida (Joãozinho de “seu” Manoel Cincinato); José Guimarães (Zequinha); Serafim Soares Pinto Filho; Safonia Leôncio; Miguel Machado de Andrade (Miguelzinho de Dr. Luiz Machado); José Gomes (Zezé de “seu” Chiquinho Gomes); João Machado Costa (Joca); Antônio Vieira Costa (Nozinho); Eloy Rodrigues Lima (que viria a ser o primeiro Prefeito de São José da Tapera); Antônio Francisco da Silva (Totonio de “seu” Marcolino); Fernando Martins (Fernando de “seu” Antônio Martins, do Limoeiro); Otaviano Oliveira; Tuí Rego; Júlio Rego; José Araújo (Zé Barrão); Waldemar Almeida (Dedé de “seu” Alfredo Capinha); Aldemar de Mendonça; Agenor de Mendonça; Antônio da Silva Porém (Preguinho); Pedro Mamede; Josias de “seu” Pedro Labareda; Filinto Gonzaga da Silva; Agenor Gonzaga da Silva; José Pauferro (Pauferro de Magia); Anízio de Chico Disse); Vicente (Vicentinho Sapateiro); José Costa (Zé de Maria Rita); Manoel Pampia (Mané Tenente); Jano Melo Ribeiro; Nilo Melo Ribeiro; Antônio Ladislau (Totônio); Agripino Ladislau; Luiz Bezerra; Bernardo de Góes Cavalcante (Bernardo de “seu” João Patinha); João Marques de Albuquerque; Lauro Marques de Albuquerque; José Tavares Filho (Zuza de “seu” Zezé, pai de Zé de Zuza); Antônio Tavares (Antônio de ‘Seu” Hermínio); José de Albano (Zé de Rosa); José Ignácio de Barros (Cazuzinha); José Alexandre Filho (Nenen de “seu” Zé Alexandre); Camilo Leite; Ernesto da Silva Pereira (Galêgo); Milton Tavares (Milton de “seu” Zezé); José Theófilo Filho e José Oscar (ambos de Jacaré dos Homens); José Vieira de Araújo (Zezé de “seu” Manoel Firmino); Josué Duarte; Helvécio Duarte; Antônio Gonçalves (Antônio Asa Branca); Levy Pastor da Veiga; Manoel Pastor da Veiga Filho (Nequito); João Damasceno Lisboa. Júlio Lisboa; João “Capote”; Boanerges Pinto; Epitácio Pinto; Erasmo Pinto (Filhos de “seu” Rolinha); Áureo Melo; Alípio Melo Filho; Manoel dos Santos Oliveira (Telegrafista); José Plácido (Carteiro); Virgolino Ferreira; Antônio Gomes da Silva (Antônio de “seu” Jovino Porém); Manoel Oliveira (Manoel de “seu” Manoel Oliveira); Antônio Marsiglia; Augusto Fiscal; Júlio Gonçalves (Júlio de Dadô); José Basílio; José Costa (José de “siá” Maria Bela); Eliseu Gaudêncio, Luiz Gaudêncio (Lulu); Lino Ferreira de Melo (Lino de “seu” Manoel Ourives); Pedro Pereira de Melo (Pedro de “seu” Justino); Afonso Lisboa; Antônio Vieira de Araújo (Yoyô); Virgílio Campos; José Gonçalves da Silva; Antônio da Silva Pereira (Toinho de “seu” Aprígio); Otacílio Gonzaga da Costa (Otacílio de “seu” Dique); Augusto Oliveira; Manoel Pereira Bomfim; Eliseu da Paixão; Genésio Izidoro; Theófilo Izidoro; Luiz Bomfim; Josias de “seu” Pedro Chico; Agesislau Damasceno Curador; Duperron Damasceno Curador; Toinho China; Evenos Luz; João Mangueira (João de Adélia); Jaime do Limoeiro (deve ser Jaime Castro); Antônio Trangola (Toinho); José Alves Feitosa (Juca); José Gonçalves Filho (Nozinho); Rosalvo Pastor; Minervino Pastor; Antônio Coriolano; Francisco Bezerra Lima (Maninho de “seu” Marôto); Nestor Noya (Nestor de “zeu” Zé Nóya); Dionísio Ignácio de Barros e José Serafim Filho (Serafim de “seu” Zé de Nenen).

A POESIA DE PÃO DE AÇÚCAR



PÃO DE AÇÚCAR


Marcus Vinícius*


Meu mundo bom

De mandacarus

E Xique-xiques;

Minha distante carícia

Onde o São Francisco

Provoca sempre

Uma mensagem de saudade.


Jaciobá,

De Manoel Rego, a exponência;

De Bráulio Cavalcante, o mártir;

De Nezinho (o Cego), a música.


Jaciobá,

Da poesia romântica

De Vinícius Ligianus;

Da parnasiana de Bem Gum.


Jaciobá,

Das regências dos maestros

Abílio e Nozinho.


Pão de Açúcar,

Vejo o exagero do violão

De Adail Simas;

Vejo acordes tão belos

De Paulo Alves e Zequinha.

O cavaquinho harmonioso

De João de Santa,

Que beleza!

O pandeiro inquieto

De Zé Negão

Naquele rítmo de extasiar;

Saudade infinita

De Agobar Feitosa

(não é bom lembrar...)


Pão de Açúcar

Dos emigrantes

Roberto Alvim,

Eraldo Lacet,

Zé Amaral...

Verdadeiros jaciobenses.

E mais:

As peixadas de Evenus Luz,

Aquele que tem a “estrela”

Sem conhecê-la.


Pão de Açúcar

Dos que saíram:

Zaluar Santana,

Américo Castro,

Darras Nóia,

Manoel Passinha.


Pão de Açúcar

Dos que ficaram:

Luizinho Machado

(a educação personificada)

E João Lisboa

(do Cristo Redentor)

A grandiosa jóia.


Pão de Açúcar,

Meu mundo distante

De Cáctus

E águas santas.

______________

Marcus Vinícius Maciel Mendonça(Ícaro)

(*) Pão de Açúcar(AL), 14.02.1937

(+) Maceió (AL), 07.05.1976

Publicado no livro: Pão de Açúcar, cem anos de poesia.


*****


PÃO DE AÇÚCAR


Dorme, cidade branca, silenciosa e triste.

Dum balcão de janela eu velo o seu dormir.

Nas tuas ermas ruas somente o pó existe,

O pó que o vendaval deixou no chão cair.


Dorme, cidade branca, do céu a lua assiste

O teu profundo sono num divino sorrir.

Só de silêncio e sonhos o teu viver consiste,

Sob um manto de estrelas trêmulas a luzir.


Assim, amortecida, tú guardas teus mistérios.

Teus jardins se parecem com vastos cemitérios

Por onde as brisas passam em brando sussurrar.


Aqui e ali tu tens um alto campanário,

Que dá maior relevo ao pálido cenário

Do teu calmo dormir em noite de luar.

____

Ben Gum, pseudônimo de José Mendes

Guimarães - Zequinha Guimarães.






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Pão de Açúcar, Cem Anos de Poesia